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sábado, 27 de setembro de 2014

Chãs (de Foz Côa) a terra onde ainda se come sardinha crua e as bolotas continuam a ser muito apreciadas – Tradição que se mantem enquanto a aldeia se desertifica e lhe foge o benefício do Vinho do Porto – Aldeias há que já nem um pé de vinha têm, devido ao mercenarismo das licenças:- transferência dos direitos de replantação

Por Jorge Trabulo Marques - Jornalista




Já lá vão dois anos e continua tudo na mesma  -09/05/2012 "O Ministério da Agricultura determinou o fim da transferência de direitos de replantação para a Região Demarcada do Douro, uma medida de protecção à qualidade dos vinhos do Porto e Douro, reclamada pelos viticultores" - In  Ministério da Agricultura proíbe transferência de vinha



Na região do  Douro – tal como o leitor poderá constatar mais à frente - ainda há tradições alimentares que têm  sobrevivido  à banalização e à imposição de novos hábitos consumistas, contudo, o que parece já não ter remédio é a falta de proteção  à principal bandeira vitivinícola da Região Demarcada do Douro, ou seja, à  produção do vinho generoso, uma das escassas riquezas naturais durienses,  que poderia evitar a desertificação das aldeias – Mas os tempos do liberalismo selvagem só olham aos interesses dos poderosos, das grandes quintas, ignorando os pequenos e médios agricultores. E as consequências estão à vista: aldeias  (e são a maioria) em que há mais casas de que habitantes - Muitas das quais onde já não mora ninguém 

Vila Nova de Foz Côa era, até, há pouco tempo, o único concelho, totalmente abrangido pela Região Demarcada do Douro – A bem dizer, ainda é, só que, aldeias há que, devido à permissiva autorização da venda de licenças,  ficaram sem um pé de vinha Esbulhadas da sua principal riqueza, através de açambarcadores oportunistas, quem é que lá se quer fixar? .. Quem é que ali quer dedicar-se à agricultura? - Ninguém.  

E o mais insensato ou caricato é que, por vezes, são pessoas dessas aldeias, que, em negócios ou jogadas cúmplices com quem não tem as menores raízes locais, agem como autênticos garimpeiros, comprometendo o futuro dessas comunidades – O governo prometeu legislar  – mas ainda não passou de promessa.

 
Já lá vão dois anos, queO secretário de Estado do Desenvolvimento Rural, Daniel Campelo, numa das primeiras visitas que fez ao Douro, se manifestou recetivo pelo menos a equacionar a proibição da entrada dessas novas licenças e o problema da aguardente que tem vindo a invadir o Douro. “O vinho do Porto exige que seja produzido com aguardente de uvas produzidas no Douro», salientou na altura – Mas não passou de discurso de ocasião.

“PAÍS VINHEIRO” À MERCÊ DOS NOVOS SENHORES AÇAMBARCADORES QUE AGORA RECLAMAM O CONTROLO ABSOLUTO PARA DAREM A ESTOCADA  FINAL AOS PEQUENOS E MÉDIOS VITIVINICULTORES

A  Primeira Região Demarcada e Reconhecida do Mundo, criada no reinado de D. José I, pelo seu Primeiro-Ministro e futuro Marquês de Pombal, Sebastião José de Carvalho e Melo, está completamente à mercê de açambarcadores e oportunistas, comprometidos com intereses que não são propriamente os das populações: «foram transferidos de fora do chamado “País Vinhateiro”  para este território cerca de dois mil hectares de vinha, apenas destinados à produção de vinhos de mesa»  

– Obviamente que é de admitir que grande parte dessas plantações se destinaram  a satisfazer a expansão das grandes quintas, muitas das quais simultaneamente produtoras exportadoras de vinho de consumo e vinho do Porto – Que, por falta de um rigoroso controlo, acabam por exportar o que querem e lhes apetece, causando grandes transtornos nos milhares de pequenos e médios agricultores, reduzindo-lhe o “benefício”, por um lado, e, por outro, não podendo comportar os custos de produção, atendendo aos baixos preços e aos atrasos nos pagamentos», dificultando-lhes ainda mais a sobrevivência  - Naturalmente, que, havendo excesso de oferta e redução da procura, tudo se complica ainda mais –E quem mais sofre são os mais pequenos.

Em maré de privatizações, também o Douro está na mira das grandes empresas, algumas das quais testas de ferro do mercearismo internacional – Imagine-se o que seria o Estado descartar-se das suas responsabilidade e permitir que os pequenos cordeiros ficassem à mercê do covil dos lobos? – Pois é o que reclamam as grandes empresas (produtoras e exportadores), com o argumento "de falta de vontade política" para resolver problemas do sector, que exporta 356 milhões de euros  - As grandes quintas que enxamearam as encostas do Douro com vinhas, que aumentaram as produções para níveis que o mercado não absorve, entendem que, sendo estas empresas a fazer a gestão, resolviam melhor os problemas do sector – Sim, o escoamento dos seus stokes, a seu belo prazer, dando machadada final a milhares de pequenos e médios agricultores

-Pois então, abocanhando tudo, resolvia-se a crise: com a justificação de que “as exportações de vinho do Porto estão em queda há mais de uma década e a Associação das Empresas de Vinho do Porto (AEVP) tem um projecto de promoção, de dez milhões de euros, para travar a crise do sector. Mas para concretizar o plano, que não tem custos para o Estado, a associação reivindicou ontem, em conferência de Imprensa, a privatização do Instituto dos Vinhos do Douro e Porto (IVDP)- Excerto de . Sector reclama privatização do IVDP para travar queda das ...



ÚLTIMOS DIAS DAS VENDIMAS





Há uns anos atrás, as vendimas, por estas bandas, começavam em Outubro, tal como quase na generalidade do país - Havia o tempo das ceifas e debulhas e a colheita das uvas tinha de esperar. Entretanto, com o abandono das searas e outras culturas agrícolas, bem como  as alterações climatéricas e a introdução de novas técnicas de produção e fabrico do vinho, anteciparam-se as vendimas para meados de Agosto e Setembro - Claro, como não se pode vindimar tudo no mesmo dia, por falta de pessoal e de escoamento para as adegas, e, noutros casos por falta de maturação,  vão-se calendarizando, a primeira começou no principio da primeira quinzena de agosto, na Ervamoira e a última, pelo menos aqui em Chãs, está previsto terminar no dia 4 de Outubro. 

Entretanto, hoje fui vindimar no “Cabeço Douro” e na “Serra”, na vinha da Ana e do Gualdim, meus sobrinhos. Ambos professores na Amadora, embora com muito esforço, aproveitaram o fim-de-semana para virem fazer a sua vindima. Fui ajudá-los. Vim à minha aldeia para celebrar o Equinócio do Outono e passar por cá uns  dias, pelo que hoje foi a vez de eu também dobrar a espinha em cada videira, valado a valado.  A aldeia desertifica-se, a mão-de-obra ativa é escassa, pelo que, as pessoas ajudam-se mutuamente: “Hoje, vindimo para a ti, amanhã tu vindimas para mim".



De facto, é um regalo, a cada passo,  poder deparar-se com uvas que são uma tentação aos olhos e à boca, mas o trabalho também é muito duro; chega-se, ao fim do dia, todo partido. Mesmo assim, a alegria e a boa disposição nunca faltam em cada rosto - Por meu lado, já refeito, aqui estou para falar de um hábito alimentar, que estava convencido que já pertencesse ao passado – Mas, não: ainda há quem coma a sardinha crua com uma fatia de pão, depois de passar por uma carrasqueira e comer umas bolotas, como aperitivo.

 Quando era garoto, era costume fazer-se das bolotas cozidas, a castanha caseira. Lá pelo Alentejo, é que se dizia que era a comida dos porcos, mas, cá por uma remota  aldeia da beira transmontana (Alto Douro), era a nossa castanha, pois, soutos, só na terra fria. Meda e Trancoso  – Certamente usada como farinha pelos povos que se fixaram no maciço dos  Tambores, depois de moerem as bolotas  nas mós de  pedra, que por ali ainda se encontram.

Na verdade, ver comer sardinha cruinha, era surpresa que não esperava,  quando chegou a hora do almoço. Antes da Inês - a mãe do Gualdim - , estender a toalha no chão, já a sua irmã, que reside em Lisboa e que veio dar a sua ajudazinha ao sobrinho, lhe pedira para as não assar todas sobre o lume das vides. “Eu não gosto de sardinha assada, deixa-me uma crua”- diz.


E, no momento em que o resto do farnel era estendido, lá a vimos a deliciar-se com  a sardinha crua, não propriamente "vivinha da costa" porque esse é um privilégio que não goza quem vive longe do mar, mas ainda brilhante, sanguínea  e apetecível,  pronta a consumir

JÁ LÁ VAI O TEMPO EM QUE A SARDINHA ERA DIVIDIDA EM TRÊS PARTES MAS HÁ HÁBITOS QUE, TODAVIA, NÃO SE PERDERAM

Já lá vai o tempo de uma sardinha ser repartida em três pequenos bocados. Aproveitava-se tudo, desde o rabo à cabeça – Eram tempos difíceis. Hoje a vida não é fácil mas, apesar de tudo, deu-se um grande salto, comparada com os tempos da fome – Durante a 2ª guerra mundial e mesmo vários anos depois – O nosso país manteve-se neutral mas Salazar para agradar a gregos e troianos enviava para a Inglaterra e para a Alemanha “as sobras de Portugal”, com a esmagadora dos portugueses a passarem as piores privações.

Na minha adolescência, em muitos lares,  a ementa à ceia era igual à do almoço: caldo e batatas, que nem sempre eram acompanhadas.. A sardinha era vendida pelas sardinheiras, que a transportavam, coberta de sal,  num caixote de madeira à cabeça - Daí já vir meia curtida,  pronta a consumir. Ou seja, lavava-se e toca de se  comer com uma fatia de pão.   Era uma velho hábito mas que tende a desaparecer. No entanto, pelos vistos, ainda há quem não resista em não esquecer os sabores de outros tempos.

BENEFÍCIOS DA SARDINHA – E OS RISCOS DE SE COMER CRUA

Rica em ácidos graxos ômega-3 (EPA e DHA), reconhecidos por seu poder antioxidante, anti-inflamatório e antiaterosclerótico. “Esses ácidos aumentam a atividade cerebral, modulam a hiperatividade e a depressão e ainda melhoram o desempenho cognitivo”,Sardinha é a mais popular fonte de ômega-3 - MdeMulher -Contudo há quem alerte os riscos de se comer peixe cru, devido a larvas que podem produzir graves problemas intestinais. “Pesquisadores no Japão examinaram dois casos de Anisaquiase intestinal apresentando-se como uma obstrução do intestino delgado. Em cada caso, ambos os pacientes, com idades entre 64 e 70, foram levados às pressas ao pronto-socorro com dor abdominal súbita e vômitos depois de comer sardinha crua como sashimi dois dias antes”. Comer peixe cru levanta preocupações de saúde potenciais

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