Encontrava-me no interior da discoteca Rocambole,
que ficava situada junto a uma rua que vai desembocar na Rua Politécnica, ali mesmo a escassos metros da Faculdade de
Ciências – E apesar do ruído musical e do falatório que ia no seu interior,
onde estava a ser exibido um espetáculo de travesti ,que então era novidade e
estava em voga, sim, pese o facto do
espaço se situar numa cave, pois não é, que, nisto, em vez de se verem as pessoas a descerem calmamente as escadas, pelo
contrário, ouvem-se gritos espavoridos; subitamente gerou-se um reboliço de
pânico e de caos, com vozes que gritavam: “Fujam! Fujam! Que o prédio está
arder!
- Claro, que a bicheza Gay, que geralmente
ali gostava de rebolar as ancas nos seus trejeitos efeminados, é a primeira a
perder a tramontana: Perde-se num desvairo de confusão; fica completamente
desnorteada, expressando gritos e gritinhos histéricos, pelo que, num ápice, artistas
e público, misturavam-se num mesmo confuso tropel de corpos que se empurravam e se acotovelavam para subir os degraus e abandonar
a discoteca, pois, o escarcéu das sirenes,
que atroavam lá fora, pareciam conter mais o grito do pavor e da morte de que as esperanças de vida.
Sentado ao meu lado, estava o poeta Mário
Cesariny, que, sendo uma das pessoas mais calmas do mundo, não perde tempo em levantar-se,
ao mesmo tempo que me agarra num dos braços e me puxa: “Menino!.. Vamos sair
daqui senão esmagam-nos!” - Ele
enganou-se: pois, em vez de puxar o seu “borracho”,
puxou-me a mim, que estava sentado lado dele; se bem que já então nos conhecêssemos:
- Mas eu, habituado que estivera, três
anos antes, a enfrentar o sinistro festival das
tempestades equatoriais numa frágil piroga ao longo de 38 dias, não me
levantei; mantive a serenidade, não estava disposto a ser atropelado, que era o
que aconteceu aos desgraçados que tropeçaram ao caírem no chão – E devo ter
sido das últimas pessoas a abandonar a discoteca, apesar dos cheiros a queimado também ali
misturarem ao escureceu que ia lá fora..
Escusado será dizer que a imagem que se me
deparava, quando transpus a porta da discoteca, era de um impressionante caos de fumos e
labaredas, que saiam das janelas e faziam ruir o telhado, com o grito das sirenes dos bombeiros a ecoarem de
todos os lados: não apenas das viaturas
que chegavam, como de outras que ali
acorriam. Tenho bem presente na retina dos meus olhos e nas recuadas páginas da minha memória as imagens das labaredas e a fumaça que percorria
a frontaria daquele belo edifício, ao mesmo tempo que os jatos de água lhes
eram projetados – Os acessos foram imediatamente
veados ao trânsito e aos peões. No
entanto, no sítio onde estrategicamente me postaram, não fui impedido de poder
olhar atónito e chocado, pavoroso espetáculo que subitamente havia quebrado o
quase silêncio daquela área, bem diferente da tranquilidade que emanava quando,
umas duas horas antes, por ali passara.
Para
situar um pouco mais o local da discoteca, bastar-me-ia aqui lembrar a famosa discoteca
Trumps, que seria inaugurada, algum tempo depois, quase porta com porta, procurando
cativar o mesmo género de público e com
o mesmo tipo de espetáculo, porém,
apostando numa decoração mais moderna e num público mais exigente e finote, enquanto no
Rocambole, a gerência era mais tolerante
com a heterogeneidade da clientela: desde artistas e intelectuais, onde começaria
a carreira, o malogrado Carlos Castro, passando pela piroseira bichosa à banditagem
mais perigosa e aos rufias mais descarados. Pois era ali que eu podia ir
registar as novidades radiofónicas para a Ràdio Comercial-RDP, onde colaborava
com trabalhos de reportagem – Agora imagine-se também a razão pela qual os
gritos não eram só devido ao pavor do incendio, que se receava estivesse a consumir o prédio, mas das
carteiras que desapareciam dos bolsos, talvez ainda mais rápidas que as chamas
a devorarem o vetusto edifício académico
Curiosamente, seria na discoteca Trumpus,
que o saudoso Variações, daria uma dos seus primeiros inesquecíveis espetáculos, designadamente para
apresentação daquele que seria um dos seus mais famosos discos – Ainda guardo
no vasto arquivo das minhas cassetes, quer o registo do ambiente, quer a breve
entrevista que então lhe fiz, assim como às reações à sua inigualável performance
36 coisas que precisa de
saber sobre o Trumps. a discoteca gay mais famosa de Lisboa e do país -Recordamos
as melhores histórias e algumas curiosidades https://www.timeout.pt/lisboa/pt/gay/36-coisas-que-precisa-de-saber-sobre-o-trumps
Mas, sem querer deter-me na madrugada
daquela inesperada e horrível visão incendiária, que as palavras não conseguem descrever,
vou aproveitar para aqui editar um vídeo
e algumas imagens, que pesquisei na Net, assim como este breve texto:
Na madrugada do dia 18 de março de 1978 registou-se um
incêndio de grandes proporções na Faculdade de Ciências, na altura situada na
Rua da Escola Politécnica. Foi considerado um dos maiores incêndios ocorridos
na cidade de Lisboa, pela extensão, pela importância dos bens consumidos pelo
fogo e pela perigosidade dos materiais armazenados. O incêndio, que faz parte
da memória coletiva da instituição, teve um forte impacto no dia-a-dia de
docentes, não-docentes e alunos. Em 2018, a Direção de Ciências assinala o 40.º
aniversário do incêndio.
https://ciencias.ulisboa.pt/pt/evento/14-03-2018/inc%C3%AAndio-em-ci%C3%AAncias-40-anos-depois
A IMPRENSA DE HOJE, TAMBÉM NÃO QUIS DEIXAR
EM BRANCO TÃO TRÁGICA MEMÓRIA DA CAPITAL – O EXPRESSO TRAZ TESTEMUNHOS, COMEÇANDO PELO
DO GENERAL RAMALHO EANES.
EXPRESSO: Incêndio
Ciências - 40 anos - O fogo destruiu a
Faculdade de Ciências de Lisboa. E o pior é que todos sabiam que o desastre
iria acontecer
O ex-Presidente Ramalho Eanes conta ao
Expresso que há 40 anos, a 18 de março de 1978, foi acordado a meio da noite
com um alerta de um violento incêndio na Faculdade de Ciências de Lisboa. Foi
imediatamente para o local e foi ele quem deu a ordem para destruir a parte
cimeira do portão de entrada que impedia a passagem da viatura dos bombeiros.
“Não aprendemos com os erros”
Há 40 anos, “os bombeiros
sapadores só faziam vistoria a edifícios, a pedido dos responsáveis desses
mesmos edifícios”, conta ao Expresso o ex- Presidente da República António
Ramalho Eanes. O general – eleito PR em 1976 – vivia com a família no Palácio de
Belém, para onde se mudara por questões de segurança. Já estava a dormir quando
a polícia o alertou para a existência de um “grande incêndio. Decidi ir de
imediato para o local, para ver se haveria algo a fazer além do trabalho dos
bombeiros; em situações complicadas é bom haver alguém que tome decisões em
momentos de indecisão”. Foi o que aconteceu. Quando Eanes chegou ao local e foi
informado de que a viatura dos bombeiros não entrava no recinto por causa da
parte cimeira do portão, limitou-se a dizer: “Derrubem aquilo.” Excerto de http://expresso.sapo.pt/sociedade/2018-03-18-O-fogo-destruiu-a-Faculdade-de-Ciencias-de-Lisboa.-E-o-pior-e-que-todos-sabiam-que-o-desastre-iria-acontecer
BIOGRAFIA DE MÁRIO
CESARINY - Pintor e poeta português, natural de Lisboa. A sua formação
artística inclui o curso da Escola de Artes Decorativas António Arroio e
estudos na área de música, com Fernando Lopes Graça. Mais tarde, viria a
frequentar a Academia de La Grande Chaumière, em Paris, cidade onde conheceu
André Breton, em 1947. Rapidamente atraído pelas propostas do movimento
surrealista francês, tornou-se um dos mais importantes defensores do movimento
em Portugal. Ainda nesse ano, integrou o Grupo Surrealista de Lisboa. Cesariny,
figura sempre inquieta e questionadora, afastava-se assim, de maneira
definitiva, do movimento neo-realista. Passou a adoptar uma atitude estética de
constante experimentação, logo visível nas suas primeiras colagens e pinturas
informalistas realizadas com tintas de água, e distribuídas no suporte de forma
aleatória. Seria este princípio anárquico que conduziria a obra de Cesariny ao
longo da sua vida (incluindo a sua produção poética, que o autor considerava
construir a partir deste desregramento inicial das suas experiências na pintura).
A continuidade da sua prática plástica levá-lo-ia, portanto, a seguir uma
corrente gestualista, por vezes pontuada de um corrosivo humor. Dinamizador da
prática surrealista em Lisboa, Cesariny iria criar «antigrupos», com a mesma
orientação mas questionando e procurando um grau extremo de espontaneidade,
tentativa também visível na sua obra poética. Participou, em 1949 e 1950, nas I
e II Exposições dos Surrealistas, pólos de atenção de novos pintores, mas
ignoradas pela imprensa. Crescentemente dedicado à escrita, Cesariny viria a
publicar as obras poéticas Corpo Visível (1950), Discurso Sobre a Reabilitação
do Real Quotidiano (1952), Louvor e Simplificação de Álvaro de Campos (1953),
Manual de Prestidigitação (1956), Pena Capital (1957), Nobilíssima Visão
(1959), Poesia, 1944-1955 (1961), Planisfério e Outros Poemas (1961), Um Auto
para Jerusalém (1964), As Mãos na Água a Cabeça no Mar (1972), Burlescas,
Teóricas e Sentimentais (1972), Titânia e a Cidade Queimada (1977), O Virgem
Negra. Fernando Pessoa Explicado às Criancinhas Naturais & Estrangeiras
(1989), e a obra de ficção Titânia (1994). A edição da sua obra não segue
linearmente a cronologia da sua produção. Corpo Visível é o volume em que as
características surrealistas são já dominantes — em textos anteriores, a
denúncia social aproximava-se, por vezes, do neo-realismo, embora já em
Nobilíssima Visão esta escola fosse objecto de um olhar crítico. O humor, o
recurso ao non-sense e ao absurdo, são marcas da escrita de Cesariny, de uma
ironia por vezes violenta, que incide sobre figuras e mitos consagrados da
cultura portuguesa e ocidental. Da sua obra escrita sobre a temática do
surrealismo, que analisou e teorizou em vários textos, fazem parte A
Intervenção Surrealista (1958), a organização e autoria parcial da Antologia
Surrealista do Cadáver Esquisito (1961), a antologia Surreal-Abjection(ismo)
(1963), Do Surrealismo e da Pintura (1967), Primavera Autónoma das Estradas
(1980) e Vieira da Silva – Arpad Szènes, ou O Castelo Surrealista (1984).
Mário Cesariny nasceu em
Lisboa em 1923. Com os poetas António Pedro, José-Augusto França, Fernando
Azevedo e Alexandre O´Neill, entre outros, foi um dos fundadores do Grupo
Surrealista de Lisboa, após retornar de
Paris em 1947, onde estudara naAcadémie de la Grande Chaumière e estabelecera
contato com André Breton. O trabalho do grupo assume um caráter político de
resistência ao regime que dominava o país, além de estabelecer-se como
alternativa ao neo-realismo que dominava as letras de Portugal naquele momento.
Mais tarde, fundou o grupo dissidente, que se queria "anti-grupo", Os
Surrealistas, com O´Neill mais uma vez e com poetas como Pedro Oom https://www.escritas.org/pt/bio/mario-cesariny
Biografia de António Variações
António Joaquim Rodrigues Ribeiro, filho de camponeses minhotos, desde
muito cedo revelou propensão para a música. Nascido em 3 de Dezembro de 1944,
abandonou a sua aldeia natal (Lugar do Pilar, freguesia de Fiscal) em 1957 e
foi para Lisboa, onde se dedicou a várias actividades profissionais desde
empregado de escritório até barbeiro.
Em 1975 viaja até Londres, onde fica durante um ano e parte, depois para Amsterdão onde aprende a profissão de cabeleireiro. Esta aprendizagem servir-lhe-á para se instalar, novamente, na capital portuguesa; onde se estabelece com o primeiro cabeleireiro unissexo de Portugal. Esta actividade não resulta muito bem e, para ganhar a vida, abre uma barbearia na Baixa lisboeta.
Em 1978 grava uma maqueta com alguns temas, que apresenta à Valentim de Carvalho, com a qual assinará contrato.
Na sua própria descrição a música que produz situa-se entre Braga e Nova Iorque. É no programa "O Passeio dos Alegres" de Júlio Isidro que António se apresenta ao grande público (1). Os temas que cantou nessa emissão chamavam-se "Toma O Comprimido" e "Não Me Consumas" e ainda permanecem inéditos, uma vez que nunca foram registados em disco.
O primeiro trabalho que gravou foi o single "Povo Que Lavas No Rio", imortalizado por Amália Rodrigues (2).
Amália era, aliás, uma das suas referências, que teve direito a uma canção de Variações ("Voz Amália de Nós"). O seu primeiro longa duração "Anjo da Guarda" (3) é também dedicado à popular fadista.
Neste disco participam Vítor Rua (com o pseudónimo Vick Vaporub) e Tóli César Machado, músicos dos GNR. Quem não recorda " É P'ra Amanhã" ou "O Corpo É Que Paga"? (4)
Durante o Verão de 1983 Variações é muito solicitado para espectáculos ao vivo, sobretudo em aldeias por este país fora.
Em Fevereiro do ano seguinte, António Variações entra em estúdio com os músicos dos Heróis do Mar para gravar o seu segundo longa duração que se intitulará "Dar e Receber".(5) O tema mais conhecido deste disco é, sem sombra de dúvidas, "Canção De Engate" que, posteriormente, se tornará um imenso sucesso numa versão dos Delfins.
Em Maio desse mesmo ano dá entrada no Hospital e, no dia 13 de Junho de 1984, morre em consequência de uma broncopneumonia bilateral grave. Será sepultado, dois dias depois, no cemitério de Amares (Braga), perto da sua aldeia natal, com a presença de poucos músicos acompanhando o funeral.
Com a sua morte desaparece um dos maiores renovadores da canção portuguesa das últimas décadas. https://www.letras.com.br/biografia/antonio-variacoes
Em 1975 viaja até Londres, onde fica durante um ano e parte, depois para Amsterdão onde aprende a profissão de cabeleireiro. Esta aprendizagem servir-lhe-á para se instalar, novamente, na capital portuguesa; onde se estabelece com o primeiro cabeleireiro unissexo de Portugal. Esta actividade não resulta muito bem e, para ganhar a vida, abre uma barbearia na Baixa lisboeta.
Em 1978 grava uma maqueta com alguns temas, que apresenta à Valentim de Carvalho, com a qual assinará contrato.
Na sua própria descrição a música que produz situa-se entre Braga e Nova Iorque. É no programa "O Passeio dos Alegres" de Júlio Isidro que António se apresenta ao grande público (1). Os temas que cantou nessa emissão chamavam-se "Toma O Comprimido" e "Não Me Consumas" e ainda permanecem inéditos, uma vez que nunca foram registados em disco.
O primeiro trabalho que gravou foi o single "Povo Que Lavas No Rio", imortalizado por Amália Rodrigues (2).
Amália era, aliás, uma das suas referências, que teve direito a uma canção de Variações ("Voz Amália de Nós"). O seu primeiro longa duração "Anjo da Guarda" (3) é também dedicado à popular fadista.
Neste disco participam Vítor Rua (com o pseudónimo Vick Vaporub) e Tóli César Machado, músicos dos GNR. Quem não recorda " É P'ra Amanhã" ou "O Corpo É Que Paga"? (4)
Durante o Verão de 1983 Variações é muito solicitado para espectáculos ao vivo, sobretudo em aldeias por este país fora.
Em Fevereiro do ano seguinte, António Variações entra em estúdio com os músicos dos Heróis do Mar para gravar o seu segundo longa duração que se intitulará "Dar e Receber".(5) O tema mais conhecido deste disco é, sem sombra de dúvidas, "Canção De Engate" que, posteriormente, se tornará um imenso sucesso numa versão dos Delfins.
Em Maio desse mesmo ano dá entrada no Hospital e, no dia 13 de Junho de 1984, morre em consequência de uma broncopneumonia bilateral grave. Será sepultado, dois dias depois, no cemitério de Amares (Braga), perto da sua aldeia natal, com a presença de poucos músicos acompanhando o funeral.
Com a sua morte desaparece um dos maiores renovadores da canção portuguesa das últimas décadas. https://www.letras.com.br/biografia/antonio-variacoes
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