Por Jorge Trabulo Marques - Jornalista C
Francisco da Costa Gomes - Chaves, 30 de Junho de 1914 — Lisboa, 31 de Julho de 2001
Marechal Francisco
Costa Gomes - Uma das grandes
personalidades, militares e cívicas,
Membro da Junta de Salvação Nacional desde a madrugada de 26 de Abril,
e, como chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas em 30 de Abril de
1974. O primeiro Presidente da República Portuguesa a discursar perante a
Assembleia Geral das Nações Unidas - Em Janeiro de 1975 está presente na
assinatura do Acordo de Alvor, entre o governo e os movimentos de libertação
angolanos, relativo à independência de Angola. Depois de dar posse ao IV
Governo Provisório, também chefiado por Vasco Gonçalves (25 de Março de 1975),
preside à assinatura, em 11 de Abril de 1975, do primeiro pacto MFA-Partidos.
Declarações inéditas de Francisco Costa Gomes, uma vez que, da longa entrevista, que honrosamente me concedeu, na qualidade de repórter
da extinta Rádio Comercial RDP, apenas escassos minutos foram transmitidos. O tema principal da minha deslocação a sua casa,
versava sobre questões relacionadas com o
armamento atómico e convencional das
duas grandes potências e o papel do Marechal na Conferência Mundial da Paz,
que, por agora, apenas reproduzo em texto .
E, de facto, foi a
propósito destes assuntos, num tempo em que pareciam desanuviar-se
algumas tensões, entre os dois blocos, que começaria por fazer as primeiras
perguntas. Contudo, outros temas acabariam por ser abordados, nomeadamente, o
que pensava do período quente pós 25 de Abril e da prisão de Otelo Saraiva de
Carvalho - Conteúdo editado em vídeo. – Porém, é
minha intenção, vir a editar, no Youtube, também outra
interessante entrevista, sobre este tema
“Francisco da Costa Gomes toma posse como
Presidente da República na sequência da renúncia de António de Spínola, a 30 de
Setembro de 1974. Em pleno processo revolucionário terá de enfrentar situações
de grande complexidade.
Nascido em Chaves, no seio de uma
família numerosa, a sua infância é marcada pela morte do pai nas vésperas do
seu 8.º aniversário. As dificuldades económicas da família levam a que,
terminada a instrução primária, ingresse no Colégio Militar em Lisboa. A
solução não lhe agrada, sobretudo devido ao afastamento da família.
Adicionar legenda |
(…)Apesar da ambiguidade de que
muitos o acusam, todos lhe reconhecem o mérito de ter conseguido evitar a
guerra civil.
Ao ocupar
a cadeira presidencial, uma das suas primeiras preocupações parece ser a de
garantir a estabilidade, apesar da conjuntura revolucionária que se vive.
Demonstra-o, primeiro, ao reconduzir Vasco Gonçalves para o cargo de chefe do
governo (III Governo Provisório, em 1-10-1974). Depois, durante a viagem que
efectua aos EUA onde procura não só estabelecer contactos com vista à
cooperação entre os dois países, sobretudo económica, como também tranquilizar
a comunidade internacional quanto ao rumo da transição portuguesa” – Excerto de
. Biografia completa - Museu da Presidência da República
COSTA GOMES - O MILITAR
PACIFISTA
O paladino da paz –.Um dos militares mais pacifistas, que,
após deixar a Presidência da Republica, não aceita ser chamado a desempenhar qualquer cargo
político, optando pelo Conselho Mundial
da Paz, como terreno de intervenção, seguindo, atentamente e com preocupação, o
recrudescimento das armas convencionais e atómicas das duas grandes potências,
que, ao invés de olharem mais para os problemas da saúde e das condições de
vida das populações, gastam milhões em armas atómicas e convencionais. –
A HONRA DE
TER ENTREVISTADO UM HOMEM VALOROSO, GENEROSO E PACIFICO
Na véspera dos 41 anos pós 25 de Abril, tenho pois
a honra e o prazer de editar o excerto
de uma longa e interessante entrevista,
que me concedeu em sua casa, não obstante estar num período de convalescença,
por razões de saúde - "Sabe, que
ainda ontem tive 40º graus de febre" -Confessava .
Morava na Av. João XXI, próximo do cruzamento da Av. de Roma, em Lisboa. Nessa tarde, que me recebeu, estava sozinho e, curiosamente, os móveis da sala, estavam todos cobertos com lençóis brancos, visto ir para obras, mais parecendo a enfermaria de um hospital. Mesmo assim, teve a gentileza de me receber, já que a entrevista havia sido marcada uns dias atrás e ele não quis faltar ao compromisso.
Morava na Av. João XXI, próximo do cruzamento da Av. de Roma, em Lisboa. Nessa tarde, que me recebeu, estava sozinho e, curiosamente, os móveis da sala, estavam todos cobertos com lençóis brancos, visto ir para obras, mais parecendo a enfermaria de um hospital. Mesmo assim, teve a gentileza de me receber, já que a entrevista havia sido marcada uns dias atrás e ele não quis faltar ao compromisso.
RETIROU-SE DA POLITICA MILITAR PARA SE DEDICAR À
PAZ MUNDIAL
JTM - O Sr. Marechal Costa Gomes é um homem
retirado da cena política? É um homem que acompanha atentamente os problemas! Como
vê a política: como interveniente ou como observador?
F.C.G. A política nacional vejo-a simplesmente
como observador e um observador muito atento, porque, como tenho dedicado a
maior do meu tempo, às questões internacionais, sobretudo àquelas que dependem
da paz e do desarmamento, e, como isso me leva, muitas vezes, a conferências
para fora do país e me obriga a um preparação, quando estou em Portugal, que me
faz alhear um pouco da política do dia a dia do nosso país, é claro que eu
estou mais a par daquilo que se julga que constitui hoje a política internacional
e a situação internacional de propriamente da politica nacional.
JTM - Porquê essa preocupação?
F.C.G - Bom, a preocupação deriva de várias
coisas: em primeiro lugar do facto de julgar que nós estamos realmente de baixo da uma ameaça terrível que pode, de
um momento para o outro destruir por completo a vida sobre este belo planeta, que
é a Terra. É isso. Pode-se dizer que as
pessoas mais lúcidas e aquelas que se têm dedicado mais a este assunto, desde
54, desde o rebentamento da primeira bomba atómica, começaram a prever esta
situação. Mas, não há dúvida nenhuma,
que, durante as duas primeiras décadas, praticamente o assunto da era atómica,
foi completamente ignorado, as armas atómicas foram completamente ignoradas!
Ninguém sabia nada do que se passava, espacialmente
nos países onde a luta começava a ter um cariz de competição muito forte, e,
nos anos 70, o mundo começou a ser
surpreendido com a ideia de que, já havia nessa altura, armas suficientes para
destruir várias vezes a humanidade.
“MAIS DE METADE DOS CIENTISTAS DO MUNDO OCUPADOS EM APERFEIÇOAR MEIOS DE COMBATE” – Em vez de se empenharem com “os problema da fome, do analfabetismo, do meio-ambiente e da saúde
JTM – Acha que ainda há uma grande tensão entre os
dois blocos?
F.C.G. Eu julgo que ainda há uma grande tensão
mais forte do que aquela que devia existir, porque há uma desconfiança mútua,
não só do ponto de vista político, com
sob o aspeto militar, que inibe e que faz
com que não se possam adiantar e definir determinados assuntos com a lógica,
e, sobretudo, com a necessidade que os
mesmos impõem. Veja, por exemplo, este
facto que agora se deu, ultimamente, insólito: pois, estamos todos à espera que, de um momento
para o outro, se possa assinar o acordo
que elimine os mísseis intermediários e os mísseis táticos da europa. Pois bem, qual é a atitude que a
Nato toma perante esta decisão? É que… sim, senhora …vamos acabar com os
mísseis mas temos que reforçar as forças convencionais.
Ora, eu acho que esta atitude é uma atitude
absolutamente negativa! O que nós precisamos não é de reforçar as forças
convencionais é de reduzir também as
forças convencionais! Porque, um dos
maiores problemas que existem no Mundo – e sem a redução dos orçamentos militares,
se não será possível resolvê-lo – é o problema da fome, é o problema do analfabetismo, é o problema
do meio-ambiente, o da saúde, enfim, são uma série de problemas que realmente fazem com que, a maioria da população
mundial, dia a dia, veja os seus problemas acrescidos, agudizados e não sinta
que há uma luz, que não há uma pequena ação solidária dos países – que os têm, que, no fundo, os
têm assegurado – para melhorar esta esta situação.
Ora, esta situação só pode ser melhorada, diminuindo
drasticamente as despesas militares, não só o que diz respeito aos orçamentos. Como
também no que diz respeito à investigação científica. Porque, hoje, mais de metade
dos cientistas no mundo, estão dedicadas a aperfeiçoar armas e aperfeiçoar meios de combate, quando, realmente, a todas
as pessoas bem intencionadas, lhes
parece que se deviam dedicar as era para o bem-estar da Humanidade, e, portanto, pró melhoramento das condições de vida de todos os
Povos.
F.C.G. - Acredito!
Não porque as pessoas o queiram! Podemos dizer que 90% da população mundial é
contra um conflito à escalda mundial - Mas,
com o acumular de armas que existem no mundo e, com os pequenos conflitos locais,
que ainda não conseguimos debelar e, outros que se podem desenvolver de um momento
para o outro, como é, por exemplo, a situação do Golfo Pérsico, pois, uma
destas situações, pode, sem querer, levar a um conflito mundial! E isso é extremamente
perigoso, porque, as armas que depois se possuem, são de tal maneira potentes e
de tal maneira poderosas, que, se elas forem empregues, durante muito tempo, será o tempo
suficiente para aniquilar a vida sobre a
Terra.
O PERÍODO QUENTE PÓS 25 DE ABRIL
JTM - Outra questão que eu gostaria que o Sr. Marechal
recordasse – alguns a nos já volvidos sobre aquele período da revolução: um
período, naturalmente, muito confusão, como é que a esta distância, o Sr.
Marechal. Os recordaria?
F.C.G. – Bom, eu acho que foi realmente um período
muito confuso! Muito perturbado! A revolução fez-se, mas, claro, dadas as
circunstâncias em que ela teve de se efetuar. Não há houve uma preparação,
sobretudo para se poder transitar do
regime que havia para um outro, onde as
liberdades e os direitos humanos, estavam salvaguardas e estavam em plena pujança,
e isso deu como resultado, que, houve, de facto, durante os primeiros tempos –
no primeiro Governo (em todos os governos mais ou menos provisórios – deficiências
muito grandes, que, só o trabalho e só a boa vontade e dedicação de muitos, conseguiram, não digo suprir, mas
pelo menos atenuar.
“OTELO TEVE AS SUAS DEFICIÊNCIAS MAS, DE UMA MANEIRA GERAL, FOI UM ELEMENTO
POSITIVO E A REVOLUÇÃO DE ABRIL DEVE-LHE
MUITO.
Otelo Saraiva de Carvalho, detido a 20 de Junho de 1984 pela
Polícia Judiciária, no âmbito deste processo. Da FP, com uma pena de 18 anos .De
recordar, que o principal operacional do Movimento das Forças Armadas. nunca
assumiu a criação das FP-25 nem a militância no grupo. Do tempo total de pena
cumpriu apenas cinco anos. Em entrevista, concedida há Lusa, em 2010, Otelo confessou
que, no dia em que recebeu a notícia da criação deste partido
revolucionário armado, a encarou com "apreensão e perturbação com a
ideia". Otelo: FP-25 foram "choque grande e um prejuízo tota
JTM – Sr. Marechal. Uma das figuras muito conhecidas
e, de grande interveniência, na revolução, é Otelo Saraiva de Carvalho,
atualmente preso: como é que vê a prisão de Otelo Saraiva de Carvalho?
F.C.G – Eu, como tive ocasião de dizer no Tribunal, só conheço regularmente, a ação do Tenente-Coronel
Otelo, quando ele parte ou do Conselho da Revolução
, em que me esteve diretamente subordinado. – No Concelho de Revolução, porque eu era o
Presidente do Concelho de Revolução; no COPCON COPCON –, porque o COPOCON estava dependente do Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas e
eu acumulava as funções de Presidente da República e de Chefe do Estado-Maior
das Forças Armadas. Ora, nesse tempo, eu posso dizer-lhe que, Otelo teve as
suas deficiências, mas, de uma maneira
geral, foi um elemento positivo e a
Revolução de 25 de Abril, deve-lhe muito.
Depois, do 25 de Novembro, praticamente nunca mais tive contactos com Otelo, mas, daquilo que eu conheço, a forma como eu pus o problema no Tribunal, eu julgo que o caráter , a moral e a maneira de ser do Otelo, não são de molde a admitir que ele, direta ou indiretamente, tenha tomado parte em qualquer das ações terroristas.
Era bom que se visse, que
se estudasse bem, as ações terroristas, não só a partir de 1974 mas que se vissem bem as ações
terroristas, entre 1975 e 1976, porque, realmente, nessa data houve muito
terrorismo em Portugal! - Terrorismo
absolutamente escusado! Terrorismo que que visava, única e simplesmente, o regulamento do status quo, então estabelecido,
em que as pessoas, não hesitara em matar, em destruir, em fazer ações, que
realmente todo o mundo hoje as condena, porque, felizmente, o terrorismo hoje está
condenado internacionalmente de uma forma absoluta.
JTM – Portanto, em sua
opinião, acha injusta a prisão de Otelo?
F.G.C – Não posso dizer
que é injusta ou justa. Eu não sei as causas que levaram à prisão de Otelo. Penso
que – nisso acredito, acredito na
Justiça Portuguesa -, que o juiz que fez o inquérito e que promoveu a sua detenção, tinha as suas
razões. Podem não ser razões que não sejam razões suficientemente fortes para
justificar a prisão durante tanto tempo de Otelo.
Não há dúvida nenhuma é
que, Otelo Saraiva de carvalho, tem, em toda a Europa, uma data de pessoas importantes, sobretudo no
campo jurídico, que o apoiam, que o defendem e que estão constantemente a fazer diligências para a sua libertação.
A entrevista, que, honrosamente
me concedeu, continuaria com ainda com várias perguntas, desde a sua próxima
deslocação a Tóquio, no âmbito das conferências do Conselho Mundial da Paz, assim como de como recordava as funções que desempenhou, em Angola, 1970-72, como comandante-chefe da Região Militar de Angola –
Perguntei-lhe, que, tendo também estado,
como militar nesta ex-colónia, no
meu tempo (1966) se constava que havia
quem, dentro do Quartel general, passasse informações do MPLA – Costa Gomes, negou
que, de sua parte, alguma vez tivesse tomado essa atitude, não passando de
calúnias e de falsidades. Pena não puder reproduzir as suas palavras, visto, no dia seguinte ter ido fazer uma entrevista
ao Monsenhor Moreira das Neves, em sua casa, e, inadvertidamente, ao usar a mesma cassete, apagado o resto da
entrevista. Contudo, ainda disponho de
uma outra entrevista, esta feita no torno de uma conferência, em que ele também
participara, que igualmente conto editar oportunamente em vídeo.
«A APRENDIZAGEM DA ARTE DA «PRUDÊNCIA»
“A figura que sai das páginas de Luís Nuno Rodrigues é a de um general renitente. Da obra ressalta, desde logo, que a carreira militar de Costa Gomes deriva não tanto de um gosto pelas armas, mas sobretudo de uma evolução imposta pelas necessidades materiais da família. Do Colégio Militar à Academia Militar, o percurso de Costa Gomes resulta de uma evolução natural imposta pelas condicionantes familiares. A carreira militar não satisfazia em pleno Costa Gomes, que acabou por frequentar a Universidade do Porto, aí concluindo a licenciatura em Ciências Matemáticas (1939-1944). Este facto não o impediu de percorrer, ainda jovem, um extraordinário caminho como militar, ganhando prestígio no meio castrense, não deixando, contudo, de evidenciar uma renitência: a renitência ao uso e ao abuso da violência. Para o futuro marechal Costa Gomes, a violência (a força armada) só devia ser aplicada enquanto fosse útil ao equilíbrio e à paz na sociedade. O uso excessivo da violência, assim como a utilização da violência de forma inútil, eram-lhe repugnantes.
Na lógica do marechal Costa Gomes, cabia aos militares dosear o uso da violência, tendo sempre como fim assegurar os objectivos de ordem e paz social. – Excerto Relações Internacionais (R:I) - O general «renitente»
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