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terça-feira, 28 de janeiro de 2014

Escritor Vergílio Ferreira - Nasceu há 98 anos, até que, sentindo o “Apelo da Noite” e do “Cântico Final” , despediu-se “Para Sempre” “Em Nome da Terra” aos 80 - “Há no fundo da linguagem um silêncio primordial. Os mudos sabem-no. A arte também” – E o antigo seminarista de “Manhã Submersa”, soube elevá-la à sublimidade da expressão


“Morrerás em breve. É incontestável. E quanta verdade morrerá contigo sem saberes que a sabias. Só por não teres tido a sorte de num simples encontro ou encontrão de ta fazerem vir ao de cima”


Vergílio Ferreira não era apenas o grande escritor mas o existencialista, o pensador. Deu-me o prazer de me receber várias vezes em sua casa – Algumas das quais no próprio dia do seu aniversário. É uma data que dificilmente me pode passar despercebida. Nasceu em Melo, no dia 28 de Janeiro, tendo como fundo a Serra da Estrela, ambiente e paisagem que iria moldar a sua personalidade e influenciar a sua vasta obra - Os seus romances, ensaios, diários e também  alguns poemas. "Este homem reuniu em si diversas facetas, a de filósofo e a de escritor, a de ensaísta, a de romancista e a de professor. Contudo, foi na escrita que mais se destacou, sendo dos intelectuais contemporâneos mais representativos. Toda a sua obra está impregnada de uma profunda preocupação ensaística. Vergílio Ferreira


Faleceu na sua casa de campo, em Fontanelas, no dia  1 de Março de 1966, pouco depois da hora do lanche. Quando a sua esposa (Regina Kasprzykowski) entrou na sala para ir buscar a chávena e bule, encontrou-o estendido de costas sobre o tapete no chão e com rosto voltado para a janela. Ele, que tanto interrogara a morte, pelos vistos, respondeu ao seu apelo da forma mais pacífica e tranquila.

"Das janelas abertas, a aragem passa leve pela casa toda, traz ainda dos recantos o odor das eras mortas. O silêncio pesa sobre a terra como um augúrio, a luz é intensa como uma treva. Olho-a deslumbrado até à cegueira, quase esquecido de  mim. A morte alastra à minha volta no silêncio, sob pelo meu corpo até aos meus olhos parados. Que é que quer dizer a vida e a vertigem do seu milagre? Onde se gera o espanto e o arrepio do seu alarme? Estou só, esvaziado de tudo. Ideias, projectos, e as súbitas revelações, e o mundo, e a visão original das coisas, a recuperação do ser de início mesmo depois de já sabidas, e o encantamento da beleza primordial onde estão? Só, na nulidade de mim, na frieza linear e vegetativa. E todavia , por vezes: que é que vai morrer de mim depois da morte?" -In "Para Sempre"


NÃO É PRECISO QUE OS OUTROS NOS DÊEM O AVISO PARA FAZERMOS O OBSÉQUIO DE NOS CHEGARMOS PARA LÁ. A GENTE SABE…





“Depois da morte não há nada” –    Eu já pensei que a morte era uma a passagem para o além, para uma vida que se seguiria a esta…Aliás, quando pensei, tinha toda a aparelhagem para isso, nesse mesmo além… Haveria um céu, haveria um inferno, haveria um purgatório, etc  - Recordando um dos maiores vultos da literatura portuguesa, que me deu a honra e o prazer de me receber, várias vezes em sua casa e de me conceder várias entrevistas -  A que aqui, hoje recordo, teve como tema principal a questão da morte – Há vida para além da morte? – Entre outras perguntas  - Jorge Trabulo Marques 



 “Morte, podes vir. Está a porta aberta, podes. Deixa-me só arrumar uns problemas ainda em aberto mas em que não está o de existir. Realizado o possível do que, em retórica se chama o “sonho”, o impossível dele, que também lá está, valerá a pena que seja o de um paralítico? De um taralhoco? Morte, não faças cerimónia. Esgotei tudo, pode avançar. A energia de ser vivente, as relações viáveis com os outros, as ideias aproveitáveis que me bateram no sítio de serem e ficaram , e o mais, e o mais – tudo se cumpriu. Há um momento em que o invisível e o repentino nos toca ao de leve no ombro. É quando entre nós e a vida se impõe  o inesperado da estranheza, de um falar de línguas diferentes, um ver-se que a senha  de passe de nós para a nossa circunstância não nos dá um trânsito fácil  e normal. Cada idade traz consigo um todo em que se integra  e com ele avança pela vida. A nossa procura e o estar bem  com os da nossa idade é a procura de uma pátria comum com um sistema integrado de relações. Não é preciso que os outros nos dêem o aviso para fazermos o obséquio de nos chegarmos para lá. A gente sabe. Mesmo no olhar de distanciação que há no olhar respeitoso. É já o respeito que se tem pelo morto, para afastar o mau agoiro. Que distância enorme. Nos interesses imediatos, livros, formas de arte, ideias políticas, o modo de se ser em banalidade quotidiana. Nem já ninguém nos dá luta, dá-nos quanto muito o ridículo, quando não sabemos ocupar o nosso lugar. Ou quando sabemos e se é compreensivo, dão-nos apenas a boa educação. O ar que se respira, a ocupação do nosso espaço para o nosso trânsito intervalar ao  dos outros, o nosso hábito maníaco de existirmos, é  um benefício a que já não temos direito nenhum. O ser que somos e o que nele acumulámos são as nossas reservas  para irmos gastando. Mas a estranheza com que nos olham  reflui-nos a nós, à nossa solidão, ao impraticável de nós. Que se imagine um medievo reposto a viver. Mas o velho é isso em ameaça ou começo. A morte não é assim um flagelo, mas a retificação do que já foi decidido. A morte apenas subscreve o que já somos como excedentários. E há só que deixá-la rubricar à pressa o nosso destino, que tem mais que fazer. Morte, podes vir. Não faças cerimónia. Mas sê educada e não me maces muito.” – In Vergílio Ferreira – Pensar

“Morre em confiança, escriba meu irmão. Se triunfaste e te exaltaram, não há razão para pensares que o não serás pelos séculos. Se te diminuíram e foste incompreendido, não há razão  para o seres amanhã”



"Luar opalescente, lembro-me!Há uma beleza plácida, eu olho-a e tenho vontade de chorar" - In Estrela Polar - V.F



Sol bonito, deixa-te estar. Andaste estes dias todos na vadiagem nefelibata, vieste enfim. Não vás. Sol português, tens as tuas obrigações para com a nossa identidade nacional, não nos deixes à mercê  de um polícia  que nos pilhe  sem identificação. E ficas bem, deitado no tapete como um cão luminoso” 



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