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terça-feira, 17 de outubro de 2023

QUINTA DA ERVAMOIRA - A pérola de Chãs e de Muxagata - -Foz Côa - No seu esplendor e geometria outonal - No Vale do Côa, onde nasceu o meu avô paterno e bisavô, meu pai Manuel da Quinta e seus irmãos com o mesmo apelido


                                                Jorge Trabulo Marques - Jornalista

Antiga Quinta de Santa Maria , situa-se em pleno Parque Arqueológico do Vale do Côa, estendendo os seus 200 hectares pelas freguesias das Chãs e Muxagata, na margem esquerda deste rio, ladeada pelo quadrante noroeste pela mar

Porém, depois da plantação da vinha, passou apenas a constar no registo predial de um dos termos, no de Muxagata.. No entanto, os marcos que  fazem a delimitação, inserem a maior parte da sua superfície no termo de Chãs, cujo acesso e escoamento dos seus produtos tem sido feito por  caminhos desta freguesia .- E a lei até é bem clara quando  às definições do seu enquadramento.

Eu, próprio, Jorge Trabulo Marques, e meu primo, Joaquim Manuel Trabulo, autor do livro Por Veredas do Vale do Côa, em Outubro de 2000, apresentamos uma exposição acerca dos limites territoriais da Freguesia de Chãs, ao Ministério do Ambiente e do Ordenamento, que nos deu parecer favorável, só que, depois não houve vontade política por parte da câmara municipal. 

As imagens foram fotografadas ainda no tempo da pelicula, já lá vão alguns anos  mas o cenário repete-se em cada inicio da estação  outonal, com os seus tons matizados de dourados esmaltes, que se espelham por toda a extensa geometria das vinhas, numa vasta e maravilhosa composição de encantamento romântico e nostálgico, naquela que é a concha mais larga do vale do Côa e que chegou a correr o risco de ser submersa, caso não tivessem sido descobertas as antiquíssimas gravuras em diferentes núcleos de placas de xisto.

Sim, grande parte desta quinta – a sua maior extensão – estaria hoje encoberta por uma enorme albufeira, porém, com a decisão da UNESCO de elevar as gravuras do Vale do Côa à categoria de Património da Humanidade, a Quinta de Ervamoira teve o privilégio de se converter na primeira quinta vinhateira a usufruir desse  título

Pessoalmente bati-me pela salvação do importantíssimo património arqueológico, mas, sobretudo. pela integridade do vale,  mesmo antes de sua descoberta, porque,  com a construção do projetado pântano, também iriam ficar submersas  muitas das minhas mais  recuadas e belas memórias  

Pois prendem-me  às margens e ao leito deste rio,  memórias inesquecíveis. um amor quase ilimitado - Por ali caminhei, muitas vezes, em criança, e até lá dormi umas quantas vezes, na casa da Quinta (hoje museu do sitio), no tempo das debulhas, que duravam várias semanas, ou quando o meu pai ali ia crestar os cortiços que lá tínhamos, junto à horta, uma herança do meu avô paterno, deixada a todos os filhos. A terra não era da família, mas ali perdurou, como rendeiros, durante mais de dois séculos.

ERVAMOIRA – NOME DE ERVA DANINHA E DO TITULO DE UM ROMANCE – Comprada pela Casa Ramos Pinto – Na fase pós 25 de Abril quando muitos proprietários se desfizeram das suas herdades, receando que fossem nacionalizadas

A antiga Quinta de Santa Maria, nome da imagem na capela que ali existia, era propriedade de duas irmãs e dos seus filhos, que detinham a herança desde há mais dois séculos, em cujas ladeiras apenas se faziam sementeiras de cereais. Foi comprada, na década de 70,  por José António Ramos Pinto Rosa,  herdeiro da linhagem da Casa Adriano Ramos-Pinto,  empresa de Vinho do Porto constituída em meados do século XIX

 Apelidou-a de Ervamoira - E o nome de Quinta de Santa Maria foi depois aproveitado para um restaurante de  provas dos vinhos  da mesma empresa., entre os quais se conta os vinhos das Duas Quintas e Barca Velha

O nome  foi transportado do romance de uma escritora francesa (de apelido Chantal), que chamou para título o nome de uma erva daninha, que, embora se debruce sobre questões ligadas à produção histórica do Vinho do Porto, na região demarcada do Douro, nada tem a ver com a o passado desta quinta e daqueles que a cultivaram ao longo de mais de duzentos nos, tendo-a convidado para apadrinhar o titulo do seu romance ao nome de mais uma das suas propriedades..

.A prioridade da compra caberia a um ramo da minha família, ou seja à minha primeira Aldina Marques e ao seu marido, José Sobral e filhos, que ali continuaram como caseiros, após o falecimento do meu tio Antoninho da Quinta, o mais velho dos irmãos, a  quem coube  a continuidade de caseiro, da  gestão e do cultivo da quinta.

José Sobral confessou-me que o cultivo dos cereais estava já em decadência, em vias de desaparecimento no concelho, por via da importação externa dos cerais e não esperava que as encostas pudessem vir a ser desbravadas para cultivo da vinha, pelo que apenas veio aceitar continuar como feitor da mesma.  

José António Ramos Pinto Rosas, convidou o sobrinho, João Nicolau de Almeida,  após a sua formação de Enologia em Dijon, na França, e, com a sua colaboração vai realmente revolucionar a produção de vinho de consumo e de vinho generoso, graças à  introdução de novos alinhamentos de valados e castas adaptadas ao solo e ao microclima de cada encosta ou colina da  Ervamoira e das  outras quintas que empresa fora adquirindo  ou que possuía no concelho de Foz Côa e na região do Douro. Afirmando-se como uma referência na região demarcada do douro,  como  vinhos como o da Barca Velha, entre outros. .

É recordado nas suas declarações, que, por volta dos anos 60, começou a projetar a ideia de uma quinta modelo. Teria de ser bela para lhe encher a alma de artista, mas igualmente moderna para acolher as inovações da ciência. Durante anos, olhou minuciosamente os mapas militares à procura desse lugar de destino. Um dia, decidiu visitar a encosta de Santa Maria e apercebeu-se de que  o lugar que procurava estava ali, no Douro Superior, a poucos quilômetros da fronteira com a Espanha.

Os herdeiros eram vários – filhos de duas irmãs – e viviam longe desta quinta, alguns dos quais em Lisboa. E  a compra não se afigurava fácil. Porém, com a revolução de Abril e a baldada reforma agrária.  gerou-se um ambiente  de apreensão e de  instabilidade nas grandes herdades, tanto nas alentejanas como na região do Douro. Os proprietários pensaram que poderiam ficar sem  o seu património  a favor do Estado e decidiram desfazer-se dele, receando perder tudo.

Foi também o que sucedeu à vizinha Quinta do Monte, outra propriedade de mais de 300 hectares, igualmente servida unicamente pelos caminhos da freguesia de Chas, tanto mais que havia a separa-las a Ribeira dos Piscos e sem qualquer tipo de ponte, propriedade de produção de vinha, olival e amêndoa,  distribuída igualmente pelas áreas dos dois termos de Muxagata e Chãs, mas que ficaria anexada somente a Muxagata, até porque era também a elite desta freguesia, com as suas encostas  dominadas por meia dúzia de famílias judaicas, às quais  viria juntar-se o chamado Padre Costa (dedicado à compra de uvas e  seu fabrico), que exerciam grande poder de influência na sede do  município

Enquanto em Chãs, antiga anexa de Longroiva, embora houvesse um membro da maçonaria, o maior proprietário da aldeia mas  estava mais voltado  em algara o seu domínio, apanhar propriedades de que  a pensar no coletivo da freguesia., tendo mesmo chegado a recrutar forças da GNR  para reprimir e prender um  certo número de pessoas por se terem ido manifestar junto à sua casa.

A Quinta do Monte era pertença da família Proença, também proprietários de dois dos mais belos solares da minha aldeia, Chãs e que, por herança, caberia  a um filho médico que residia na cidade do Porto. Acabou por ser vendida a um preço de saldo – Hoje o seu valor é indubitavelmente bem maior.  

 MUSEU DE SÍTIO DA ERVAMOIRA NA ROTA DO IMPÉRIO ROMANO - IMPORTANTE ACERVO HISTÓRICO DE DUAS DÉCADAS DE ESCAVAÇÕES.

 

       Conhecido hoje em todo o mundo pelo seu excecional conjunto de gravuras paleolíticas, o Vale do Côa apresenta igualmente importantes ocupações humanas de diversas épocas, nomeadamente do período romano e da Idade Média.

       Desde os anos trinta que vários estudiosos se haviam apercebido da importância arqueológica deste vale. Porém, só em 1984, quando um feliz acaso põe a descoberto um sarcófago medieval, numa pequena colina da Quinta da Ervamoira, sobranceira ao Côa que ia a ser surribada, é que, os proprietários, alertados para o achado, decidem contactar dois arqueólogos do Gabinete de História e Arqueologia de Vila Nova de Gaia. Por isso, muito antes da famosa polémica gravuras-barragem se instalar, surge a primeira oportunidade científica de, nas margens deste rio, se começarem a desvendar alguns dos seus muitos e valiosos tesouros.

       No ano seguinte, em 1985, formam-se, então, os grupos de trabalhos sob a orientação do arqueólogo e professor universitário, Gonçalves Guimarães, o qual,  desde logo, rendido ao fascínio do lugar, acabaria por dar início a sucessivas campanhas de escavações, que não tardariam a desenterrar do silêncio, séculos e séculos de história, pondo a descoberto importantes vestígios de níveis romanos, tardo-romanos, paleocristãos, visigóticos e medievais.

       Segundo este investigador “ao longo de dois mil anos, por ali passaram  soldados, carreteiros, funcionários, almocreves, sacerdotes... romanos, visigodos, berberes, leoneses, portugueses... Os que iam permanecendo lavravam os campos, acendiam a forja, teciam a lã, semeavam centeio, plantavam a vinha e a oliveira, vivendo dependentes das grandes mudanças lá longe, mas em convivência pacífica com a Natureza.”

       Para Gonçalves Guimarães, “a Estação arqueológica da Quinta da Ervamoira tem ocupação confirmada  desde o século III d.C., sendo no entanto as suas principais estruturas e espólio tardios, datados  da primeira metade do século IV, do tempo dos imperadores Constantino e Constante II. Trata-se de uma mutatio (estação de muda), com taberna  e outros serviços de apoio que controlava a passagem a vau da via que atravessava o Côa em direcção a Callabria. Com a queda de Roma  em 410 e o consequente desmembramento  do Império Romano a partir das invasões bárbaras, transformou numa pequena villa rustica “, conclui o investigador

       São, pois, algumas dessas ruínas romanas e medievais que podem ali ser observadas, através de visitas guiadas, na área das escavações ou aos vestígios que se encontram expostos no diversificado espólio do Museu de Sítio - Sem dúvida, uma valiosa oferta turística que, integrada num complexo agro-turístico-cultural, vem diversificar e enriquecer aquele que é já considerado como Património da Humanidade

        

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