Jorge Trabulo Marques - Jornalista e investigador
Recordo-lhe aqui a minha experiência na apicultura em S. Tomé -
Como lidar com as abelhinhas amigas e fazer de um enxame uma bonita barbinha, tal como eu a fiz há uns bons anos?... Sim, com as quais não se brinca e muito menos com as híbridas assassinas – Tendo soado às estopinhas, tal como se vê no sovacos da camisa, dada a elevada temperatura ambiental (clima quente húmido), acrescida ao calor do enxame, e também pela dificuldade de respirar pelo nariz e pela boca enquanto mantive o enxame preso ao queixo com abelha mestra, enclausurada numa pequena gaiola de rede, cujo amontoado de obreiras pesaria talvez mais de 5 quilos.
As abelhas africanas são mais pequenas que a europeias mas mais agressivas (defensivas) - São menos produtivas mas podem aumentar a safra do Café em 50%” - São Tomé, tem o melhor café do mundo, deve promover a apicultura – Levei milhares de ferroadas, até ao dia em que as compreendi melhor e fiz, de um enorme enxame, uma bela barba – Vale a pena promover a apicultura, trabalho em que me envolvi na BFAP, onde o saudoso Presidente de STP, Evaristo de Carvalho, também trabalhou
OS PATOS, COMO SÃO MAIS PACHORRENTOS, ERAM OS ALVOS PREFERIDOS DAS NOSSAS ABELHINHAS - - Todavia, em STP não existem cruzamentos de abelhas africanas com europeias - As mais atrevidas.
No serviço militar - Encarregado da Agro-Pecuária |
Uma tropa mais agrícola que militar |
Apesar dos riscos inerentes (e não eram tão poucos como isso), considero ter sido a atividade de apicultor, um dos trabalhos mais interessantes, que mais gostei de exercer, quando trabalhei na Brigada de Fomento Agropecuário, em S. Tomé - Além de que tive como empregado de mato na Roça Uba-Budo, Ribeira Peixe e Rio do Ouro - Ali na condição de mais um escravo a juntar a muitos outros - Pois quem lucrava eram os chamados “inspetores da Gravana ou do cachimbo", os proprietários, das grandes plantações, que, vivendo refastelados em Lisboa, ali iam banquetear-se no período mais fresco do ano
Fernão Dias - Na antiga Roça Rio do Oiro |
É, desde há muito reconhecido o papel importantíssimo das abelhas e de outros insectos na polinização de diversas espécies agrícolas, com o aumento substancial das suas colheitas – Esta foi uma das razões que levou a que, a Brigada de Fomento Agro-Pecuário, sob a orientação da Junta de Investigação do Ultramar, em meados dos anos sessenta, introduzisse no campo experimental das suas várias investigações, junto à Roça Santa Margarida, próximo da então Vila da Trindade, atual capital do distrito de Mé-Zóchi, um pequeno colmeal com algumas colónias capturadas de exames selvagens, por forma a que ali se procedesse ao estudo do seu comportamento e à reprodução intensiva, com vista ao desenvolvimento da apicultura em STP: quer para o aproveitamento do mel – produzem pouco, mas o mel é de boa qualidade: pois têm flora todo o ano e não precisam de o armazenar, mas sobretudo para melhorar a polinização dos cafezeiros e nos coqueiros
Trabalhei nesse estudo, sob a orientação do Eng Rosário Nunes, acompanhado de um excelente auxiliar santomense, com o qual procedíamos à recolha de vários enxames e nas mais diversas proveniências, quer de buracos de troncos de árvores, sobretudo de coqueiros, seus sítios preferidos, quer dos novos exames que se replicavam na altura de enxamear e iam pousar até nos telhados, tal como sucedeu numa casa da cidade, perto do Tribunal, num percurso movimentado, onde, alguns motoristas, não querendo respeitar os avisos que lhe fizemos, de fecharem os vidros dos carros, acabaram por protagonizar os mais insólitos episódios, abandonando a condução em precipitadas fugas, enquanto as abelhas os flagelavam.
Sim, fui um dos pioneiros na recolha de exames selvagens para a sua domesticação, num pequeno colmeal, em trabalhos técnicos de investigação, em S. Tomé. Os primeiros meses, foram terríveis!... Depois passei a ficar imune às suas ferroadas e a até apanhar os enxames às mãos cheias. Mas também só o podia fazer, após montes de picadas cegas e a molho sobre a máscara e o fato e lhes aplicar várias fumigações: sobretudo após 1/3 ter-se atirado num autêntico suicídio, sobre mim e meu auxiliar, dado pagarem cara a vida por cada ferroada, até que, por fim - talvez por um instinto de sobrevivência do enxame – lá se acalmarem e ficarem absolutamente inofensivas.
A rainha rodeada das suas damas- Web |
Recordo-me bem, que, quando apanhávamos um enxame, nas imediações do terreiro de uma roça ou onde houvesse habitações e a criação de animais, depressa se espalhavam pelos ares, zumbindo e atacando as cabeças das pessoas ou dos animais domésticos: - Tínhamos sempre mais alguém para ficar nos caminhos avisar que não passassem naqueles momentos. Mas havia sempre quem não fizesse caso das nossas recomendações e acabasse depois por fugir a pular e a sacudir as orelhas e a cabeça com as mãos. Nem por isso se livrando das suas picadas, pois a abelha africana, quando ataca, persegue, por várias centenas de metros, tudo quanto for vivo até cair morta com o ferrão.
MEU PAI IA MORRENDO COM PICADAS DE ABELHAS
Enquanto não me adaptei, não havia máscara e fato de apicultor que me valesse: ao ponto de ter ficado, algumas vezes, imobilizado em casa: ou com os olhos inchados e não podendo ver ou com os pés demasiados inchados e não podendo caminhar – Deus meu! No rol das minhas aventuras, desde a escalada de um pico aprumo ou solitário em pirogas nos mares do Golfo da Guiné, até, por essa experiência, haveria de passar! Quase por a mesma que ia levando à morte o meu pai, por ser alérgico às suas picadas: era eu criança, quando, na propriedade do nosso “Lavor do Ferro”, onde ela andava a lavrar, vendo um enxame junto às raízes de uma oliveira, resolveu ascender umas giestas para as afugentar e tirarmos de lá o mel, como suplemento à nossa magra merenda
Viu-se aflito! E, às tantas, de tanto vomitar, abraçava-se a mim, dizendo-me que ia morrer – “Meu filho! Vou morrer!. Vai para casa! Deixa-me aqui ficar!” Enquanto eu o confortava a chorar!.. Estávamos só os dois e longe da aldeia. Vá lá, que, horas depois, lá se recompôs, melhorou e pudemos regressar a casa no mancho, que era a besta com que ele andava a lavrar a vinha daquela encosta voltada para o Rio Côa – Episódio que jamais esquecerei, tal como outro, que ali me ocorreu, ainda de mais tenra idade: ao levar o macho a beber no ribeiro, enquanto ele bebia, dei-lhe um beliscão nas ancas, tendo-me dado um coice que me ia matando.
Porém, uns meses depois, desse meu trabalho em S. Tomé, quando passei a compreender melhor o seu comportamento, os sons da sua linguagem, as suas danças, até a encarar o meu trabalho com prazer e alguma diversão, ao ponto de as fazer pousar sobre o meu queixo com a rainha mestra engaiolada, tal como documenta a imagem, publicada no extinto Diário Popular.
COMO EXPLICAR O COMPORTAMENTO DE ABELHAS TÃO MINÚSCULAS MAS E TÃO TREMENDAMENTE DEFENSIVAS! – Que na América Latina, depois de um cruzamento com as abelhas nativas, até já foram apelidadas de “abelhas assassinas”
S. Tomé - 40 anos depois |
Reconhecem estudiosos que. “Durante milhares de anos, por influência do meio ambiente, as características genéticas e comportamentais das abelhas africanas foram se diferenciando das europeias, que são muito mais mansas e fáceis de domesticar”, afirma o biólogo Osmar Malaspina, do Centro de Estudos de Insetos Sociais da Universidade Estadual Paulista (UNESP).
Acredita-se que o modo agressivo como os nativos africanos retiravam o mel, ateando fogo nas colónias, teria provocado a formação de um espírito tão guerreiro na espécie. Assim, as abelhas africanas ficaram tão preparadas para a autodefesa que percebem vibrações no ar a 30 metros de distância e já se sentem ameaçadas quando alguém chega a menos de 15 metros da colmeia. Quando atacam, podem perseguir sua vítima por mais de 1 quilometro”.
De tão perigosas, passaram a ser conhecidas em todo o mundo como abelhas assassinas. O apelido não pegou à toa: desde a década de 50, mais de 1 000 pessoas já morreram por causa de suas picadas só no continente americano. No Brasil, elas chegaram em 1956, trazidas pelo agrónomo paulista Warwick Estevan Kerr, que queria melhorar a produção de mel – mais resistente a doença https://super.abril.com.br/mundo-estranho/por-que-as-abelhas-africanas-sao-tao-perigosas/
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