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quarta-feira, 25 de dezembro de 2019

Natal 2019 – Chãs – Foz Côa - “Sempre assim foi: Mistério, encantamento, / anjos cantando, a Estrela de Belém, /céus e Terra louvando o nascimento/ de Jesus que nasceu para o nosso Belém…” De Manuel Daniel

Jorge  Trabulo Marques - Jornalista
 

Hoje é dia de Natal –   Uma das datas mais significativas do ano: vou aproveitar para aqui recordar a festa natalícia de alguns dos idosos da minha aldeia – Decorreu na passada Sexta-Feira, no Centro do Dia e com a presença amável e carinhosa dos responsáveis desta instituição, bem como de todo o pessoal que aqui presta serviço e do Lar de Nª Srª de Assunção, que, em boa hora,  o ex-autarca, António Lourenço, teve a feliz iniciativa de erguer,   pois, se assim não fosse, porventura muitos dos idosos,  não podendo ficar em sua casa ou junto dos seus filhos, que é o que geralmente hoje sucede, teriam que procurar acolhimento fora do seu torrão natal  - Em todo o caso, nos seus olhos – e não são apenas os  idosos  aqui nascidos – transparecia mais tristeza de que alegria, se bem que o jantar fosse bem servido e bem acompanhado: mas quem é que, afinal, em tempo de Natal, não reflete,  com algum semblante carregado, em memórias que já lá vão? - Sim, o tempo  roda para frente e  não volta atrás.






Agora já me encontro de novo em Lisboa, se bem que com o pensamento naqueles meus adoráveis horizontes, depois de ali ter passado uns escassos dias: pois a centenária casa dos meus avós maternos,  que tocou por herança aos meus pais e que agora é propriedade de uma das minhas sobrinhas, sendo demasiado desconfortável e insalubre para permitir estadias prolongadas no Inverno ou mesmo até noutras estações – Em todo o caso,  valem as memórias; e quantas não me vieram à lembrança naquelas noites batidas pela ventania que soprava nas janelas e na porta da varanda! A depressão Elsa, também por aqui regou a extravasar e soprou a valer.

À hora que escrevo estas linhas, o dia está quase a escoar-se: passei-o sozinho,  em minha casa,  completamente ausente do bulício da cidade, se bem que bastaria ir ao pequeno terraço das águas furtadas  que habito para ver, pelo menos , um vasto leque do seu casario , pois, mas nem isso me interessou – Estou bem comigo e com a minha consciência. Ontem consoei em  casa do  meu irmão Fernando, com os seus dois filhos e a esposa; dos quatro que éramos, restamos dois, já partiram há muito os meus pais e também a minha irmã Conceição e o José – Deus assim o quis. Lá chegará também o dia  de prestar contas ao Criador: espero que tarde, pois gostaria de recordar algumas das muitas memórias que intensamente vivi, sobretudo, solitário na imensidão do Golfo da Guiné – Pena ter dispersado grande parte do tempo a pensar mais no coletivo de que em mim – Claro que ninguém me vai agradecer, mas nem eu tão pouco o fiz para que alguém mo reconhecesse.




Sim,  hoje é dia de Natal: data da tradicional Natividade e tempo de reflexão: há quem o aproveite para distribuir prendas e as receber – E dar umas esmolas caridosas aos sem-abrigo: a bem dizer,  hoje é o dia de todos sermos bonzinhos e dos sem-abrigo encherem a barriga para todo o ano, se possível sob os holofotes televisivos, que é para mostrar que vivemos num mundo cor de rosa, em que até os pobres são felizes com a sua pobreza e não há explorados nem exploradores. O mau é que, depois de receberem a esmola, muitos têm que dormir ao relento, sem o mínimo de conforto, em condições desumanas, deixados à sua sorte, como meros desperdícios do lixo.





Neste sagrado dia da Natividade, aproveito para transcrever um dos belos poemas, inseridos no Espírito Natalício, de Manuel Daniel com os votos amigos amigos de um Feliz Natal, junto dos que lhe são queridos e desejando que  a deficiência visual, que tão profundamente o afecta, recupere e não se agrave 

Noite de Natal
O Céu não estava estrelado
mas uma estrela luzia,
Num barraco desprezado
estavam José e Maria.
Num monte distanciado
A branca neve caía.
Mas no negrume fechado
De repente se fez dia.

Uma criança chorava
quando a luz se refectia
num espaço onde ecoava
um cântico de alegria,
cântico que reboava
numa perfeita harmonia
enquanto José Louvava
e aos céus agradecia.

Era um mistério sagrado
o que ali acontecia.
Um pastor admirado,
cantava, dançava e ria.
O próprio  tempo, abismado
em dois tempos se repartia.
E sobre palhas deitado
O Deus menino dormia.
.
Manuel Daniel – do Livro  Chão de Areia

 


CANTIGAS DO PERÍODO NATALÍCIO DA MINHA ALDEIA

Só na antiga memória de quem a cantou e viveu

Inda agora aqui cheguei,
E mal pus o pé na escada,
Logo o meu coração disse,
Aqui mora gente honrada 
Coro
Lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá!
Lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá! 
Esta casa é caiada,
Forrada de papelão,
Os senhores que moram nela,
Têm belo coração!

Levanta-se daí senhora,
Desse banco de cortiça,
Ai, venha dar-nos as janeiras,
Ai, ou morcelas ou chouriças!

Já se acabaram as festas
Agora vêm os Reis,
Vede lã por vossas casas,
Se lá tendes que nos “deis!”

Coro
Nasceu  a alegria,
Não pode haver mais,
Que nasceu Jesus!
Bendito sejas!

Versos extraídos do livro  - CHÃS DE FOZ CÔA – A SUA HISTÓRIA E A SUA GENTE – De Joaquim Trabulo




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