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terça-feira, 29 de maio de 2018

Fernando Mimoso e o Vale do Côa – O Último Artista "Rupestre dos Antepassados e dos Novos Tempos

Jorge Trabulo Marques


O talento artístico de António Fernando Mimoso, um filho querido e muito admirado de Vila nova de  Foz Côa, é sobejamente conhecido em todo o concelho, quer nas muitas e bonitas casas que fez através da sua empresa de construção civil, quer pelos dotes excepcionais de escultor, revelados há 23 anos, aquando da descoberta das gravuras rupestres  e também por sempre se haver revelado um dos grandes entusiastas  e animadores do tradicional cortejo alegórico, por altura das festas da amendoeira em flor.

 Sem dúvida, o  homem que sempre viveu apegado às suas razies campesinas, o conceituado empresário, que subiu  a corda da vida a pulso, graças ao seu espírito  de esforçado empreendedor, mas também o talentoso artista, que teve a genial ideia, aquando da descoberta das gravuras do  Vale Côa,  de criar maravilhosas réplicas, embora inscritas em pequenos  pedaços de xisto azul ou castanho, mas de surpreendente beleza artística.
 
Os homens do paleolítico Superior, que, há mais de 20 mil anos,  aproveitando-se da amenidade do clima do Vale  Côa, bem mais temperado e diferente do que se fazia sentir nas zonas altas e planálticas,  ali ergueram os seus acampamentos nas   margens ou se refugiavam por entre os naturais  abrigos xistosos das mesmas, sim, e  ali , deram largas à sua veia artística, desenhando nas placas de xisto, com simples lâminas de sílex,  os principais motivos relacionados com a sua sobrevivência, a caça e a pesca, magnifica herança classificada como Património da Humanidade, pois bem, no auge da acesa polémica, na então dicotomia - barragem-gravuras, entre os que achavam que era possível ter as duas cosias - construir  a barragem e   mostrar uma réplica das gravuras, claro com estas submersas e os que se bateram para que estas fossem salvaguardas e mostradas nos seus santuários, há um homem, com larga experiência de quase duas décadas como pedreiro,  filho de antigo pastor, do  Sr.Cabreirinha, alcunha que ele preza com muito carinho, que  surpreende os próprios arqueólogos e é motivo de destaque nos telejornais.

 

Aproveito para aqui transcrever um artigo, que editamos  no Jornal ÉCÔA, na edição de Março de 1995, na altura emm que passou a registar em placas de xisto as habilidades dos homens pré-históricos  - E a revelar-se uma das mais imaginativas surpresas no tradicional cortejo etnográfico da quinzena da amendoeira.


Fernando Mimoso - Numa das suas coreografias do Cortejo da Festa da Amendoeira 
"O xisto e a lousa do Vale do Côa continuam a ser gravados 20 mil anos depois de desenhadas as primeiras gravuras. Agora é António Fernando Mimoso que marca a pedra com figuras rupestres 


Para este empresário de 55 anos gravar na pedra é um passatempo que já vem dos tempos de infância e juventude quando, durante o Verão, pouco havia que fazer na agricultura e a tertúlia, os Ioqos de cartas e os passeios pelo campo preenchiam as horas livres.



A ocasião era aproveitada pelos jovens para gravarem nomes e desenhos, à navalha, nas árvores silvestres, sobretudo nas faias dispersas por Foz Côa.



António Mimoso não se considera um artista plástico. É apenas «amigo da arte, dos valores históricos, da natureza e do desenvolvimento».



Esta filosofia de vida levou-o inicialmente a defender a construção da barragem do Côa e a preservação das gravuras rupestres através da musealização ou transferência dos blocos xistosos em que se encontram.



Quatro anos depois da suspensão da construção da barragem a opinião não mudou mudou, mas prefere dizer que «Venha o que seja melhor para Foz Cõa e para o seu progresso".

As pessoas vão lá e não entendem nada e não vêem nada que encha o olho», observa para sustentar a necessidade de maiores atracções culturais e turísticas. 


A reconstrução de velhos moinhos abandonados ou em ruínas perto dos núcleos de gravuras podia ser uma forma de mostrar -a arte de moer em tempos de antigamente..

António Fernando Mimoso ganhou ao longo do tempo um certo carinho pelas figuras de auroques, cabras cavalos gravados à beira do rio Côa mas também nas pendentes do Douro, lá para as bandas do Vale de Canivães ou Vermelhosa. 


A afeição" pelas figuras a que muitos teimam apelidar de simples «riscos», materializou-se na reprodução em pedaços de xisto com face lisa e coloração escura que procura tanto na berma das estradas como no campo.



As técnicas utilizadas de gravar figuras -rupestres» são simples, quase rudimentares.

Um grosso "cepo" de tronco de amendoeira serve de mesa de trabalho, o martelo é um pedaço de xisto em forma retangular e como percutor um pequeno escopro ou ponteira de aço. 


CADA PEÇA É UM ATO DE AMOR


Depois de colocar a pedra sobre o tronco de madeira, o desenho previamente realizado num pedaço de papel vegetal é decalcado. 


Os desenhos, sempre baseados nas figuras paleolíticas tanto podem ter sido recolhidos em fotografias ou figuras de publicações como ser fruto da Imaginação. 


Com pancada certa e frequente, é picotado meticulosamente o traço previamente riscado na lousa, depois aprofundado pela mesma ponta de aço para lhe dar mais relevo. Mais uns pequenos retoques e está feita a obra: cavalos e auroques entrelaçam-se numa combinação que mal parece uma dança ritual.



Para rematar, uma legenda simples: "FOZ COA” e “F. M." ou "'A. M.", iniciais de seu nome Fernando Mimoso.



O artesão “rupestre” já está ajeitado ao desenho de figuras iguais. Embora em escala menor, aquelas que há 20 mil anos os primeiros habitantes do Vale do Côa traçaram nas rochas ainda não descobertas no seu todo, por estarem dispersas,  submersas nas águas do Côa e do Douro ou então escondidas numa qualquer encosta. 



Para provar a "arte" e engenho, António Fernando Mimoso escolheu uma pedra lisa de xisto incrustada numa parede da via pública perto da sua residência. Com a ponta de aço riscou a figura de um auroque, picotou o contorno e assinou F. M .. 


E confessa: -“Num  dia inteiro era capaz de encher o Vale do Côa todo de figuras>>. Tal a rapidez e agilidade com que grava as réplicas das manifestações paleolíticas. 


Sentindo-se como «um quase filho da Terra» porque, diz, “é dela que vem tudo», Mimoso afirma-se amigo dos animais, dos que representa já extintos e dos que na sua "criação" consigo conviveram no dia-a-dia: a galinha, o porco, o burro.


“Quando estou a desenhar os animais , penso neles”, afirma, E acrescenta: “Cada peça é um acto de amor,  é como se de um filho se tratasse. Cada pedra é singular, única e por mais voltas que se dê nunca se encontra outra igual”


António Fernando Mimoso tem um sonho: “que um dia a Câmara Municipal de Vila Nova de Foz Côa ou outra qualquer entidade inclua as suas peças num Museu Municipal ou noutro


Até lá, vai criando e recriando o passado distante dos homens do Paleolítico que já representou em cortejos etnográficos da "Quinzena da Amendoeira em Flor" de Foz Côa: vestiu-se de pele de cordeiro, cingiu-se com cordas, ajeitou um bordão em forma de lança, colocou um peixe na boca, gesticulou  


e soltou gritos, cobriu a cabeça com u cabeleira desordenada e agarrou-se a u árvore que encimava o carro alegórico. 


Foi mais uma homenagem ao passa que fez de Vila Nova de Foz Côa a Capital Mundial da Arte Rupestre ao ar livre.

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