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quinta-feira, 3 de maio de 2018

Alda Espírito Santo – Tributo à diva do sorriso e da alegria à poesia de amor à alma do Povo e da Pátria santomense – À saudade da inesquecível poetiza, que “Sentada à beira do cais da" sua " baía” …. vai “pintando na grande tela da vida uma história bela para os homens de todas as terras”




A fotografia, que aqui edito, com muito gosto, de Alda Espírito Santo,  foi registada, nos anos 80,  à saída de um espetáculo no Casino Estoril  - A outra, eu com a minha companheira, foi ela mesma que amavelmente no-la fez. 

Meu singelo tributo, três dias depois do aniversário do seu nascimento, em 30 de Abril de 1926, na cidade de São Tomé. Faleceu, em Luanda, por razões de saúde,   em 9 de Março de 2010


Recordando a poesia, a simplicidade e alegria do sorriso da grande diva da poesia e do amor que votava à alma do Povo e da Pátria santomense, por cuja liberdade e independência também se bateu através da palavra e dos muitos encontros que teve com vários intelectuais, escritores, alguns dos quais  viriam a ser os futuros dirigentes dos movimentos de independência das colónias portuguesas de África, tais como Amílcar Cabral, Mário Pinto de Andrade, Agostinho Neto, Francisco José Tenreiro, entre outros. 

Falar de poesia das maravilhosas ilhas Verdes do Equador, que intrinsecamente se espelha no rosto e na alegria do seu povo e nas suas belezas naturais, pese as muitas vicissitudes por que tem passado, quer na colonização, como agora,    incontornável se torna, pois, associar o nome de Alda Espírito Santo,  conhecida geralmente por Alda Graça, ao imaginário linguístico, poético, social e político de São Tomé e Príncipe. Sim, à singular poeta, professora e jornalista, ativista, que criou belos poemas e inspirou gerações de poetas. Uma referência nacional, que sempre rejeitou vanglórias e com humildade continuou a batalhar pela conquista do progresso do país soberano


Tive a oportunidade de a conhecer pessoalmente e de com ela ter tido também o prazer de dialogar, em vários momentos, quer em S. Tomé, quer em Lisboa, depois do meu regresso a Portugal - A casa de sua família, situava-se na Rua Actor Vale, º 37, e eu cheguei a residir   num quarto alugado no Nº 17 da mesma rua, tendo tido, por isso, ocasião de a encontrar, tanto a ela, como aos seus irmãos . E, mesmo quando mudei para as águas furtadas, que atualmente habito, também transitei para uma rua, relativamente próxima, praticamente lugar de passagem obrigatório, quando desciam ao Mercado de Arróios ou para qualquer outro ponto da cidade


Refere a sua biografia, que,  Alda Neves da Graça do Espírito Santo, era filha de uma professora primária e de um funcionário dos Correios, tendo, ainda nova, conluio os seus primeiros estudos em São Tomé. Em meados de 1940, muda-se com a família para o norte de Portugal, anos depois a família muda-se para Lisboa onde Alda inicia seus estudos universitários. E é justamente, aqui, na capital, em casa da família, que Alda Graça aproveita para promover  encontros regulares  e palestras sobre temas diversos como Linguística, História e também sobre a consciência cultural e política acerca do colonialismo, do assimilacionismo e da defesa do colonizado. Na mesma época, Alda Espírito Santo frequenta a CEI (Casa dos Estudantes do Império). 

Algum tempo depois, abandona o curso universitário por razões políticas e também financeiras. Em janeiro de 1953, regressa a São Tomé e Príncipe, onde atua como professora e jornalista. Nesse mesmo ano, escreve o poema “Trindade” que denuncia o massacre ocorrido em 5 de fevereiro em Trindade (São Tomé e Príncipe). Após a independência de São Tomé e Príncipe, ocorrida em 12 de junho de 1975, Alda Espírito Santo ocupa vários cargos sucessivos no governo da jovem nação, entre os quais os de Ministra da Educação e Cultura, Ministra da Informação e Cultura, Presidente da Assembleia Nacional e Secretária Geral da União Nacional de Escritores e Artistas de São Tomé e Príncipe. Nesse ano, em novembro, compõe a letra do Hino Nacional de São Tomé e Príncipe, intitulado “Independência Total”. No ano de 1976, publica seu primeiro livro de poemas intitulado "O jogral das Ilhas". Em 1978, publica o livro  de poemas "É nosso o solo sagrado da terra-poesia de protesto e luta", que reúne uma colectânea dos poemas produzidos por Alda entre os anos de 1950
http://www.elfikurten.com.br/2015/07/alda-espirito-santo.html






Alda da Graça do Espírito Santo, S.Tomé 2008, foto: Marta Lança
Em torno da minha baía
Em torno da minha baía
Aqui, na areia,
Sentada à beira do cais da minha baía
do cais simbólico, dos fardos,
das malas e da chuva
caindo em torrentes
obre o cais desmantelado,
caindo em ruínas
eu queria ver à volta de mim,
nesta hora morna do entardecer
no mormaço tropical
desta terra de África
à beira do cais a desfazer-se em ruínas,
abrigados por um toldo movediço
uma legião de cabecinhas pequenas,             

à roda de mim,
num vôo magistral em torno do mundo
desenhando na areia 
a senda de todos os destinos
pintando na grande tela da vida
uma história bela
para os homens de todas as terras
ciciando em coro, canções melodiosas
numa toada universal
num cortejo gigante de humana poesia        

na mais bela de todas as lições:

HUMANIDADE






Para lá da praia
Baía morena da nossa terra  
vem beijar os pézinhos agrestes  
das nossas praias sedentas,  
e canta, baía minha  
os ventres inchados  
da minha infância,  
sonhos meus, ardentes  
da minha gente pequena  
lançada na areia  
da Praia Gamboa morena  
gemendo na areia  
 da Praia Gamboa. 

Canta, criança minha 
teu sonho gritante  
na areia distante  
da praia morena.

Teu teto de andala  
à berma da praia. 
Teu ninho deserto  
em dias de feira.                

Mamã tua, menino  
na luta da vida  
gamã pixi à cabeça  
na faina do dia  
maninho pequeno, no dorso ambulante  
e tu, sonho meu, na areia morena  
camisa rasgada,  
no lote da vida, 
na longa espera, duma perna inchada  
Mamã caminhando p'ra venda do peixe  
e tu, na canoa das águas marinhas ... 
    



Ilha nua
Coqueiros e palmares da Terra Natal 
Mar azul das ilhas perdidas na conjuntura dos séculos 
Vegetação densa no horizonte imenso dos nossos sonhos. 
Verdura, oceano, calor tropical 
Gritando a sede imensa do salgado mar 
No deserto paradoxal das praias humanas 
Sedentas de espaço e devida 
Nos cantos amargos do ossobô 
Anunciando o cair das chuvas 
Varrendo de rijo a terra calcinada 
Saturada do calor ardente 
Mas faminta da irradiação humana 
Ilhas paradoxais do Sul do Sará 
Os desertos humanos clamam 
Na floresta virgem 

Dos teus destinos sem planuras... 
- Alda do Espírito Santo, em "É nosso o solo sagrado da terra". Lisboa: Ulmeiro, 1978, p. 121


Lá no água grande
Lá no "Água Grande" a caminho da roça  
negritas batem que batem co'a roupa na pedra.  
 
Batem e cantam modinhas da terra.

Cantam e riem em riso de mofa  
histórias contadas, arrastadas pelo vento.

Riem alto de rijo, com a roupa na pedra 

e põem de branco a roupa lavada.

As crianças brincam e a água canta.  
Brincam na água felizes... 
Velam no capim um negrito pequenino.

E os gemidos cantados das negritas lá do rio  
ficam mudos lá na hora do regresso...  

Jazem quedos no regresso para a roça.
- Alda Espírito Santo, em "É nosso o solo sagrado da terra". Lisboa: Ulmeiro, 1978, p. 35.


No mesmo lado da canoa
As palavras do nosso dia

são palavras simples
claras como a água do regato,
jorrando das encostas ferruginosas
na manhã clara do dia-a-dia.

 
É assim que eu te falo,
meu irmão contratado numa roça de café
meu irmão que deixas teu sangue numa ponte
ou navegas no mar, num pedaço de ti mesmo em luta
[com o gandu

 
 
Minha irmã, lavando, lavando
p'lo pão dos seus filhos,
minha irmã vendendo caroço
na loja mais próxima
p'lo luto dos seus mortos,
minha irmã conformada
vendendo-se por uma vida mais serena,
aumentando afinal as suas penas...
É para vós, irmãos, companheiros da estrada
o meu grito de esperança
convosco eu me sinto dançando
nas noites de tuna
em qualquer fundão, onde a gente se junta,
convosco, irmãos, na safra do cacau,
convosco ainda na feira,
onde o izaquente e a galinha vão render dinheiro.
Convosco, impelindo a canoa p'la praia
juntando-me convosco
em redor do voador panhá
juntando-me na gamela
vadô tlebessá
a dez tostões.


 
Mas as nossas mãos milenárias
separam-se na areia imensa
desta praia de S. João
porque eu sei, irmão meu, tisnado como eu p'la vida,
tu pensas irmão da canoa
que nós os dois, carne da mesma carne
batidos p'los vendavais do tornado
não estamos do mesmo lado da canoa.

Escureceu de repente.
Lá longe no outro lado da Praia
na ponta de S. Marçal
há luzes, muitas luzes
nos quixipás sombrios...
O pito dóxi arrepiante, em sinais misteriosos
convida à unção desta noite feiticeira...
Aqui só os iniciados
no ritmo frenético dum batuque de encomendação
aqui os irmão do Santu
requebrando loucamente suas cadeiras
soltando gritos desgarrados,
palavras, gestos,
na loucura dum rito secular.

 



Neste lado da canoa, eu também estou irmão,
na tua voz agonizante, encomendando preces, juras,
[Maldições.

 
 

Estou aqui, sim, irmão
nos nozados sem tréguas
onde a gente joga
a vida dos nossos filhos.
Estou aqui, sim, meu irmão
no mesmo lado da canoa.


 
Mas nós queremos ainda uma coisa mais bela.
Queremos unir as nossas mãos milenárias,
das docas dos guindastes
das roças, das praias
numa liga grande, comprida
dum pólo a outro da terra
p'los sonhos dos nossos filhos
para nos situarmos todos do mesmo lado da canoa.
E a tarde desce...
A canoa desliza serena,
rumo à Praia Maravilhosa
onde se juntam os nossos braços
e nos sentamos todos, lado a lado,
na canoa das nossas praias.
- Alda Espírito Santo, em "É nosso o solo sagrado da terra". Lisboa: Ulmeiro, 1978.


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