Entrevista a Artur Semedo – ator e realizador: - 1925-2001 –
Com mais de 80 filmes: nasci para o espetáculo! - Realizador de
Cinema, Produtor de Televisão e Empresário Teatral – -“Eu nasci para o mundo do Espetáculo . “Fiz bastante filmes.
E, como actor, tenho mais de 80 filmes - -Declarou-me
numa entrevista que me concedeu por
ocasião da estreia do filme português, em 1989, “O Querido Lilás” , que, teve
como grande vedeta, Herman José - Natural de Arronches, Portalegre faleceu em 2001, aos 77 anos – Sem dúvida, um dos atores mais carismáticos
do meio artístico português. Um artista, multifacetado, com um grande sentido
de humor, que, por força do seu talento, o levaria a realizar ou a entrar como ator,
em vários países, ou, tal como ele diz, a percorrer a sete partidas do mundo – Foi a figura
central da peça de Laura Alves, o meu Amor é Traiçoeiro, que, devido ao estrondoso
êxito nacional e internacional, o haveria
de notabilizar, junto do grande público, que passaria associar o seu nome ao
titulo da peça.
Artur Francisco da Cunha Semedo foi Actor, Realizador de Cinema, Produtor de Televisão
e Empresário Teatral,
“Descendente de uma família de tradições militares,
mal acabou o ensino primário e o exame de admissão aos liceus, foi obrigado a
deixar a sua terra natal (Arronches, Portalegre) para frequentar o Colégio
Militar, em Lisboa. Mas seis anos depois foi expulso devido à irreverência da
sua personalidade pouco dada a preceitos disciplinares demasiado rígidos.
Regressou então ao seu Alentejo para concluir o curso dos liceus em Évora,
partindo depois para Coimbra como calouro da Faculdade de Ciências. Mas cedo
percebeu que o seu futuro passaria pelas atividades artísticas, como havia,
aliás, antecipado o seu professor primário, o escritor José Régio, que, ao
constatar a vocação do jovem aluno para a arte dramática, escrevera “Sonho em
Véspera de Exame”, uma peça em três atos, para ele representar enquanto aluno
do liceu. . Excerto de No palco da saudade: Carlos César - Jornal Audiência
TENHO UMA CARREIRA DE OITENTA E
TAL FILMES - EU NASCI PARA O MUNDO DO
ESPECTÁCULO
Fui educado no Colégio Militar; tive uma
educação bastante disciplinada para uma pessoa indisciplinada mas ao mesmo
tempo foi para mim muito útil a forma como me conduziram durante esses set anos.
Mas eu nasci, seja bom ou mau autor, sejam bom ou mau realizador ou homem de
cinema ou de televisão – não sou eu próprio -
que me devo classificar a mim –mas eu nasci, realmente, para o mundo do
espetáculo,
Fiz bastante filmes… Até como ator, tenho
na minha carreira oitenta e tal filmes, já!
Filmei na Suécia! Filmei na Hungria!
Filmei no Brasil! Filmei em Espanha! Filmei em Portugal Em Angola, em Moçambique!..
Quer dizer: filmei nas sete partidas do mundo!
E fui sempre um apaixonado!... Mais do
que, como actor de cinema foi mais ainda
como diretor! Como realizador!... Senti sempre uma grande paixão por estar
atrás da câmara de filmar; foi o que mais me seduziu em toda a minha vida artística!
JTM
- Mas também fez teatro!... Aliás, foi no teatro que começou?
AS – Não!... O que é curioso é que eu
estreei-me no cinema!... Fiz O Sol e Touros, e até com uma certa importância,
no Vendaval Maravilhoso, do Leitão de Barros!.... Estava eu a frequentar o
Conservatório, e, nessa altura, era proibido, aos alunos do Conservatório,
começarem a trabalhar em Teatro!
Eu já tinha para assinar, vários
contratos, com a Companhia Maria Matos e com os Comediantes de Lisboa, mas não
me deixavam trabalhar, porque era ainda
aluno do Conservatório.
Terminado, o curso, então entrei logo para
o teatro, e, numa grande companhia: os comediantes de Lisboa, com João Vilaré,
Alves da Cunha, Maria Lalande!.... Logo, por cima…
JTM – Foi uma entrada, apoteótica!
AS – (rindo) Exato!...
JTM – E agradou-lhe fazer teatro?
AS – Agradou-me muito!... Sentia-me muitíssimo
bem a fazer teatro!... E, como subi muito depressa em teatro, para mim a
carreira teatral, foi fácil!
Depois trabalhei, onze anos, com a Laura
Alves!... Com ela fiz poucas peças, porque as peças eram um grande êxito!... E
uma das últimas, que fiz com ela, foi o Amor é Traiçoeiro!... Que nós fizemos,
aqui em Lisboa, durante um ano e tal!... Foi um êxito extraordinário!...
Fomos fazê-lo a Espanha! Ao Brasil!
..JTM – E a África, também?
AS – Sim, também a África!... Foi um
grande êxito, que me marcou muito!... Ainda hoje, eu passo na rua, e me dizem: “ali
vai o Artur Semedo! O homem do amor é traiçoeiro! …
JTM – Olhe, mas já agora que falou do amor
é traiçoeiro: é uma expressão, que se usa de vez em quando…. Acha que o amor é
uma traição?!...
AS – O amor, geralmente, é uma traição até
a nós próprios!.. Que nos rouba… da outra
parte (…) Há sempre uma traiçãozinha!...
Não no lugar comum de trair – o amor é traiçoeiro – ou que atraiçoa... Não!...
O amor atraiçoa-nos a nós próprios!... Tira-nos, até, uma certa personalidade!...
Começamos, a viver com uma presença emocional
noutro mundo!... E dizem que é o perigo do amor, que se torna em paixão!
JTM – É uma espécie de subversão no próprio
amor!
AS – Ah, sim!...
JTM – E se eu lhe fizesse esta pergunta:
se já alguma vez foi traído em termos de amor?
AS – (rindo) Não!... Nunca!... Houve aí um
escritor, que foi o Lobo Antunes, que escreveu: “ - esse homem nasceu para
trair e nunca para ser traído!”
JTM – Sim, mas já traiu?!...
AS – Agora, não!... Sim, trai!... Traí!... São coisas que se pagam!... Porque, era um homem que gostava de estar na moda!... Nos anos 50!... Estive muito na moda!
JTM – Era galâ!...
AS -
Sim, ainda haviam os galãs… e tal!
JTM – Olhe, isso refletia-se também no
cinema, porque, enfim, uma imagem, bem apresentável!... Acha que isso se deve
também à sua figura, à sua imagem?...
AS – Sim, refletia-se, junto do público, e
até por causa da televisão… Eu fiz um programa na televisão, que era o Carlinhos
e a Lena, que teve grande êxito!... Outro também, nos anos 50! Com a Maria Dulce!...
E outro, com Eva Todor!... Uma
brasileira, em que eu fazia o Doutor Bórel!... E tudo isso tinha uma
influência, junto das mulheres!...
JTM – Recebeu muitas cartas?....
AS – Recebi cartas!... Telefonemas!...
Encontros marcados!...
JTM – Quer dizer, muitas apaixonadas!...
AS
(rindo) Muitas apaixonadas!...Ao mesmo tempo, tinha a sua graça!... Hoje os tempos mudaram!... Hoje a situação é diferente.
"O QUERIDO LILÁS" - Estreado numa sexta-feira, dia 13
JTM – Estamos em véspera da estreia de um
novo filme: do Querido Lilás!
AS -
Do Querido Lilás!!... (rindo) A escrever
no computador, sai sempre Lilas!... Mas é o Querido Lilás!...
JTM – Fale-me desse filme.
AS – Eu criei o filme na frase que dei no próprio cartaz, e, no próprio
trailer que corre nos cinemas… Que é o amor impossível de um fim de todo o tamanho!
JTM – Onde foi buscar isso?
AS -
Fui buscar à trama, digamos, ao enredo, ao entrecho do próprio filme!...
Porque, o Herman José. Faz dois papéis autónomos!... Faz o da mãe e faz o filho!... Cujo filho, desapareceu!... Disseram
que o filho tinha morrido, quando nasceu, com seis minutos de vida!...
Tiraram-no de casa… E, mais tarde, por uma casualidade superior, o destino vai
reuni-los!...
As -
Sim… vai reuni-los numa casa de fados!... Eles encontram-se e
apaixonam-se!... Foi o amor à primeira vista!... No fundo, seria a voz do
sangue… que os estava a chamar!...
E então eles apaixonam-se um pelo outro!...
E aí é um pouco a Tragédia da Rua das Flores”… É o Caso do Édipo!... O que eu
acho aqui extraordinário, além da história ser profunda, é uma história séria
mas tratada com dignidade… E o filme tem realmente muita graça!
E o Herman José, representa as duas
personagens… o que é extraordinário!... Não é que ele vá para lá partir coisas….
Que não parte absolutamente nada no filme!... Parte só o coração da mãe!... Que
é uma grande partida que ele faz!... E acompanham o Herman José, que é sensacional no filmem acores de grande
categoria: o Henrique Viana! O Couto Viana! A Fernanda Borsatti!... O Rui
Luís!... Eu próprio, também entro como ator!... E, das mulheres, também podemos
destacar a Rita Ribeiro!... Que tem realmente uma grande criação e que canta
extraordinariamente bem o fado!... E a Natalina José… Tem realmente um naipe de
atores de luxo!.. Que rodeiam o Herman José! (…)
JTM – Portanto, vai ser um filme que vai naturalmente
agradar ao grande público!
AS – Estou convencido que sim… Porque é um
filme popular… que tem uma leitura rápida e de perceção fácil. E vai estrear
num dos cinemas populares, que é o Éden –
que é um cinema de uma grande lotação -
aqui em Lisboa e no Estúdio 444. E, no Porto, no Cinema Lumier.
Que dizer, é uma ideia simultânea. E então
estreá-lo, numa data que me agrada, sobremodo… Que é Sexta-Feira,13!... Todas
as pessoas dizem “Há!... Sexta-feira,13!... Eu adoro, as sextas-feiras, 13!..
..
Não, no seu supersticioso!...
JTM – Então vê algum significado nesse
dia?!...
AS – Não!... Acho graça!... Acho graça ser
numa sexta-feira 23, em que, as pessoas, por norma, em que as pessoas… Por exemplo,
em Espanha, as Sextas-feiras, 13, é um
dia de sorte… As pessoas dizem que é um dia de sorte!...
JTM – Então é um pouco a contrariar!...
AS –
A brincar!... Nós não devemos tomar muito a sério a vida!... Nós devemos
brincar!... E brincar até com a própria vida!... Inventar a vida e brincar com ela!...
JTM
- Não quer dizer…
AS - Sim, não quer dizer que não
trabalhemos e sejamos pessoas dignas e sérias!...
JTM – Digamos, para afastar uns certos fantasmas!...
AS – Exato! … O nosso imaginário, sempre a
funcionar…
JTM – A vida real, tal como se apresenta é
já um bocado chata!...
AS - É muito chata! E temos por obrigação, nós,
atores, as pessoas do espetáculo, temos por obrigação, ajudar as outras
pessoas, a tirar os grandes problemas
que têm em cima deles.
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