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domingo, 18 de outubro de 2015

"Há um Mistério em tudo, que nos faz sinais (…)Sentimos-lhe a presença que nos transporta de arrepio e plenitude" Há no fundo da linguagem um silêncio primordial. Os mudos sabem-no . A arte também - VergÍlio Ferreira

JORGE TRABULO MARQUES - JORNALISTA      C


Eu penso que tive a felicidade de ter nascido numa aldeia que tem à sua volta pedras muito bonitas e caprichosas, pedras com formas muito estranhas, bizarras, misteriosas, pedras que, desde a minha infância e adolescência, aprendi a admirar  - E, mais tarde, já em adulto, a idolatrar e a venerar - Este é o local sagrado do meu recolhimento, para onde peregrino, sempre que posso, em qualquer altura do ano, do dia e até da hora - Sim, é o meu retiro sagrado - E também cenário da minha expressão artística. E de pendor  místico - Acho que estas buscas não se encontram apenas sob o teto de um templo mas também sob a abóbada imensa dos céu

Mas hoje vou aqui, uma vez mais, citar Virgílio Ferreira, o escritor que várias vezes me recebeu em sua casa - Ele que, nos seus pensamentos, tantas interrogações fez à volta do sentido da vida e do sagrado.  Mesmo quando ele diz - .Dar sentido à vida. Para lho darem aos domingos, quando não trabalham, os campónios da aldeia embebedam-se e dão-se facadas. A arte do nosso tempo sabe-o e faz o mesmo - Pois, essa é outra arte, a do culto das aparências - E não é aquela a que o autor do "Espaço Invisível" ou do Apelo da Noite, entre tantos outros títulos, se quis referir.



“Nós servimo-nos do mistério para a comunicação, porque todo o olhar é misterioso. Que admira que muitas vezes se utilize com o desconhecido, sobreposto ao mistério que tem? (…) Há no fundo da linguagem um silêncio primordial. Os mudos sabem-no . A arte também. Nós levamos muitas vezes uma vida para aprendê-lo e só na velhice temos as primeiras noções. – Vergílio Ferreira

"Há um mistério em tudo, que nos faz sinais, e que todavia não existe. Sentimos-lhe a presença que nos transporta de arrepio e plenitude. E que não há. Atrás se comparou isso a um quadro, que é só tela e tintas, e pelo qual, no entanto, se pagam milhões em razão da outra coisa que aí está e que não existe. Mas o maior mistério  está em nós. Agimos, pensamos, emocionamo-nos, mas há o insondável de nós onde tudo tem a sua origem. Não o sabemos. E mesmo que se se desdobrasse perante a nossa atenção, ele furtar-se-ia, logo que nele pousássemos o olhar. Porque o insondável é a razão do nosso ser e conhecê-lo seria destruí-lo. Somos movidos pelo ininteligível que está atrás do nosso ser e que é o próprio estar vivo para haver agir e pensar e o mais. Que é que está nesse estar vivo, para ser o que é em acção e pensamento e o resto? Jamais o saberemos. Todo o homem tem em si um segredo inviolável. O próprio Deus o desconhece porque é já esse segredo uma criação. Morreremos sem o conhecer. Mas não seria horrível"

 
"Sim, o retorno do sagrado. Fala-se tanto nele, como, aliás, estava previsto. Mas não no que dele mais importa e não passa pelos deuses e muito menos pelas sacristias. O retorno do sagrado deve ter que ver fundamentalmente com a recuperação da sacralidade do homem, da vida, da palavra, do mundo. A sacralidade está no que suspeitamos de mistério nas coisas, a força original de tudo, o que espera o nosso olhar limpo, a nossa atenção humilde, a divindade que está em nós. O grande acontecimento do nosso tempo, que é o sinal do nosso desastre, é a profanação de tudo, a dessacralização do que abusivamente foi invadido pelos deuses. Os deuses morreram e quiseram arrastar consigo a morte . do que era divino sem eles. Penso em tudo o que nos rodeia, mas penso agora sobretudo na profanação da palavra. Não se trata apenas de redimi-la da «tribo», como um poeta queria para os poetas, trata-se de lhe recuperar a sacralização que lhe reponha o mistério, o intangível, o poder criacional que lhe roubaram. Mais divina que os deuses, foi a ela que Deus recorreu para criar o mundo. Não  veio dele a divindade para a palavra, mas se veio, nela ainda permanece, nela ficou depois que Deus desistiu de existir. A sacralidade. Na vida, na palavra, no homem; No seu sentir, nas suas relações, no seu corpo, que tem a divindade de todos os deuses de todas as mitologias. É o que brutalmente se tenta em tudo destruir. A sacralidade. E o que devemos salvar para salvarmos o pouco da grandeza que nos coube. A. arte está morta ~ ouve-se já dizer. É uma forma de se afirmar que o sagrado não morreu. Não morreu. Como não morreu a arte, sua morada mais visível, E para o sabermos, que outra razão mais radical do que a de que o homem continua?"





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