Diz a
meteorologia que, na segunda-feira, vamos ter tempo chuvoso e frio. Entretanto,
fomos presenteados, com um bonito Sábado e Domingo.
Depois, após uma breve passagem por Chãs, fomos até ao
Orgal, com uma curta paragem junto à ponte do Rio Côa para contemplar o
rio florido e, de seguida, irmos ao encontro dos pais do Gualdim
Numa das
encostas, lá encontramos o pastor Mário, com o seu rebanho de noventa ovelhas e
os seus belos cães. Há vinte e tal anos nesta vida. Apesar das canseiras, não a
troca por outra “Ao menos assim não somos mandados por ninguém.” Queixa-se de
que nunca teve tão pouco leite como este ano: tudo por causa da chuva e do
frio. O que vale é que a Primavera, embora timidamente, já começou a
dar alguns sinais. Mas, se viessem mais uns dias como o de ontem e de hoje,
então é que os campos ainda se mostrariam mais belos e alegres. Pelos
vistos, a meteorologia, numa espécie de contranatura, é que vai ditando as
suas leis - Pois já basta de frio, de charcos, de enxurradas, de chuva. Mas também muito por culpa das agressões humanas, com que a poluem e turvam.
DOMINGO MARAVILHOSO
Hoje, na tarde de domingo, decidi ir até ao nosso Vale Cardoso. Pelo caminho, quem haveria de encontrar. O Gualdim e o pai António, sogro da minha irmã, que regressavam do Cabeço Douro e da Talisga, onde as amendoeiras ainda estão com a floração um bocado atrasada. Tinham ido às azedas e a dar por lá uma olhada - Havia algumas nuvens no céu mas o dia até estava convidativo.
Grande dor de alma é ver que as gentes envelhecem, a aldeia não se renova e se deprime - Embora à distância até pareça uma pequena cidade, vai-se despovoando e perdendo a vida de outrora
EM CRIANÇA, IA MORRENDO AFOGADO NUM POÇO BARRENTO E LARGO - NO VALE CARDOSO
O poço, que nos meus tempos de
criança, ainda não tinha sido emparedado, agora está rodeado de silvas, mas,
naquela altura, eram hortas. Tenho uma má recordação deste poço. Revejo o
episódio ainda com a mesma clareza. Num domingo, quando fomos regar a horta, eu
e a minha irmã, íamos lá morrendo afogados. O picanço, com que ela tirava a
água, rebentou, e, como eu estava uns metros abaixo a desviar o caldeiro de uma
pedra, fui arrastado com ela. Eu tinha nove anos e ela 15. Quem nos salvou foi
o meu irmão mais novo, que encaminhava a água para as valeiras.
Apercebendo-se da falta da água da regueira e dos gritos da Conceição, correu para junto do poço - Ela gritava muito, quando veio à superfície, ao mesmo tempo que tentava gatafunhar na margem barrenta - Eu também gatinhava e chapinhava num sítio menos íngreme mas não conseguia subir e fechava a boca e não pronunciava nem uma palavra para me livrar do afogamento. Vendo-nos aflitos, foi buscar uma cana. Desceu até à pedra onde eu estava e, agarrando-se a um braçado de juncos, estendeu a cana a minha irmã, que, com a sua ajuda, pôde erguer-se gatinhar. Depois foi ela que corajosamente me salvou a mim. Quando nos vimos cá fora, ainda tossindo, a mim até me parecia ter estado mais resignado a morrer de que a viver, pois, como ainda não sabia nadar, creio que já tinha mergulhado umas quantas vezes.
Atualmente, aquele terreno está sem vinha e por cultivar. A velha casa, destelhada. Há por lá umas figueiras, umas oliveiras e amendoeiras, mas não dão para o trabalho. É o que sucede com muitos dos terrenos nesta e noutras aldeias. Têm donos mas estão ao abandono. Todavia, muitas árvores teimam em frutificar mas não se lhe apanha o fruto. E, de facto, é pena ver amendoeiras, que, não obstante o desprezo a que são votadas, teimam em florir: mesmo já velhinhas e sem qualquer tipo de poda ou tratamento, lá vão embelezando a paisagem com as suas imaculadas flores. Lamentável é porém quem receba o subsídio para as cuidar e preservar e nem assim cuide dos amendoais.
A HISTÓRIA DE AMOR DA VACA QUE NÃO QUERIA PERDER O VITELO
De volta, já
junto à estrada, enquanto o Gualdim se entretinha com um estranho besouro
negro, que parecia dançar no asfalto e correr para a sombra, mal se lhe tocava,
pedi ao António que me contasse (para gravar em vídeo) a história da vaca que
não queria perder o seu vitelo.- Por duas vezes, deixou o cabanal e foi do
Orgal a Chãs , descendo e subindo íngremes ladeiras e atravessando o Câa, para
se juntar à sua cria, que havia sido vendida. Ouça o vídeo, pois vai ver
como o amor de uma vaca pela sua vitela ou vitelo, não fica atrás do amor humano:
do amor de uma mãe para com o seu bébé. Deixaram-me junto ao caminho do Cabeço Douro, visto querer
fazer o regresso a pé e descer até ao Vale Cheiroso, mais conhecido por Vale
Cheinho.
SOLAR DAS BRUXAS
E, de facto, havia nessas histórias um certo fundo de verdade: pois era lá que se reunia a velha irmandade das denominadas filhas do "Anjo da Luz", que adoravam a estrela da manhã. Vinham das várias aldeias vizinhas e juntavam-se lá.

Claro que o culto era regido sob o máximo secretismo. A tradição há muito foi extinta. Curiosamente, consta nos roteiros de algum cultos pagãos. Que vão lá, que mais não seja para lembrar a mulher que foi queimada no período negro da inquisição. E também porque a impressão que passa é a de que, além da beleza, o sítio oferece um recolhimento e um misticismo muito especial. Sem dúvida, um bonito passeio, que maravilhou os olhos e avivou muita memória.
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