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sexta-feira, 14 de junho de 2024

António Variações – Entrevista antes de ser famoso - Você que é cabeleireiro e também artista: porque é que não envereda pela carreira artista? - Eu quero! Eu queria! Isso, para mim, está cima de tudo! Agora que se está a desenhar uma carreira, vou agarrá-la o mais que eu puder, claro!

                                                                     Jorge Trabulo Marques  - Jornalista 




ANTÓNIO VARIAÇÕES -  A  GRANDE ATRAÇÃO DE UMA "NOITE TROPICAL", EM NOITE FRIA DE DEZEMBRO DE 1982 -  Num ambiente de personagens burlescas, entre a alegoria ultramoderna e o fantasmagórico: onde predominavam as cores brancas e negras - Algumas assumidamente dráculas ou travestidas de  andorinhas - Mas, onde a sua presença ainda mais se  destacava, tanto pela voz como pela sua imagem simpática, singular e que nunca descaía para a banalidade e o trivial  ridículo.  

“Visto-me da maneira como me sinto bem!... Mais nada! …Tenho preocupações estéticas mas nunca de modas!...”  Declarou-me no final de um espetáculo na discoteca Trumps em 1982 para angariar fundos para uma associação de idosos – Onde fez a antestreia Voz-Amália-de-Nós, “Nostradamus” e “O Corpo é Que Paga” 

Conheci-o, pela primeira vez, num espetáculo noturno do Ritz Club, na Rua da Glória, quando ainda ensaiava os caminhos da fama  -  E também o visitei na sua barbearia -  "É Pró Menino e Prá Menina, na Rua de São José" - .tendo aproveitado para cortar o cabelo, que, geralmente, me era cortado por outro famoso cabeleiro, o Zé Carlos

Falámos da nossa adolescência: ambos fomos marçanos  nas velhas mercearias de Lisboa - E, pelos vistos, ambos ainda crianças Eu com 12 anos de idade. E ele sensivelmente com a mesma idade.  

A sua voz era calorosa e genuinamente Lusa, com as tonalidades da alegria minhota  - Se a morte, o não tivesse levado tão cedo, poderia ter hoje a projeção de Amália Rodrigues, de que se confessava  grande admirador tendo-lhe dedicado um dos seus mais populares temas musicais


JTM - ANTÓNIO VARIAÇÕES,- Você que é cabeleireiro e também artista: por que é que não envereda pela carreira artistica? - - Eu quero!..... Isso, para mim, está cima de tudo! 
Agora, que se está a desenhar uma carreira, vou agarrá-la o mais que eu puder, claro!- 

Infelizmente, por pouco tempo: morreu no dia 13 de Junho de 1984, em consequência de uma broncopneumonia bilateral grave 

UMA VIDA BREVE MAS INTENSA E CHEIA DE EMOÇÕES  - Chamou a si o apelido artístico de António Variações - De seu nome completo,  António Joaquim Rodrigues Ribeiro, filho de camponeses minhotos  – Nascido na  aldeia  Lugar do Pilar, freguesia de Fiscal em 3 de Dezembro de 1944, tal como muitas crianças da sua  em 1957, partiu para a capital  para se lançar na vida  - Tal como sucedeu  a quem não tinha posses para estudar ou não era aceite no seminário - Donde fui exluido ao cabo de 2 meses depois de uma dura experiências de marçano em Lisboa-

PERDEU-SE  DA  CANÇÃO PORTUGUESA,  UM LEGÍTIMO SUCESSOR DA AMÁLIA RODRIGUES  - AOS 40 ANOS 

A sua voz era calorosa e genuinamente Lusa, com as tonalidades da alegria minhota  - Se a morte, o não tivesse levado tão cedo, poderia ter hoje a projeção de Amália Rodrigues, de que se confessava  grande admirador tendo-lhe dedicado um dos seus mais populares temas musicais




 António Variações, o artista convidado para a abrilhantar a festa na discoteca Tramps, naquela noite destinada angariar fundos para uma instituição de caridade. “Questionado, no fim do espetáculo, se gostava deste ambiente noturno, respondeu-me:
"Gosto!...   Não tanto como gostaria, porque tenho outras atividades durante o dia e um horário a cumprir, que não dá para grandes noitadas!... Tenho de estar de manhã acordado!..  

JTM – António Variações: você apresentou aqui alguns temas que ainda não foram apresentados em disco

A. V. - Três temas que hoje aqui apresentei vão ser incluídos no meu próximo álbum em 3 de Fevereiro de 83: é o tema que eu dedico a Amália, que se chama  Voz-Amália-de-Nós, outro que se vai chamar “Nostradamus”  e outro tema, que se chama “O Corpo é Que Paga

JTM - Você que é cabeleireiro e também artista: porque é que não envereda pela carreira artista”

A.V. - Eu quero!  Eu queria! Isso, para mim, está cima de tudo! Agora que se está a desenhar uma carreira, vou agarrá-la o mais que eu puder, claro!

JTM – Você é um homem moderno!  Prá indumentária que enverga!... Considera-se mesmo um homem moderno?!
A.V. – Não, não! Eu não tenho preocupações para parecer uma figura moderna!... Eu arranjo-me para mim!.. Visto-me para mim!...Da maneira como me sinto bem!... Mais nada! …Tenho preocupações estéticas mas nunca de modas!...

JTM - Aliás, de uma forma original!... Será para chamar atenção  o é o esse o seu estilo?
A.V – É para me sentir bem comigo
JTM – Tivemos muito gosto! E votos para que continue a brilhar na sua carreira



 ANTÓNIO VARIAÇÕES  - INEGUALÁVEL  NA SONORIDADE DA VOZ CALOROSA E  ENÉRGICA
É P'ra Amanhã" ou "O Corpo É Que Paga"? Durante o Verão de 1983 Variações é muito solicitado para espectáculos ao vivo, sobretudo em aldeias por este país fora. Em Fevereiro do ano seguinte, António Variações entra em estúdio com os músicos dos Heróis do Mar para gravar o seu segundo longa duração que se intitulará "Dar e Receber". O tema mais conhecido deste disco é, sem sombra de dúvidas, "Canção De Engate" que, posteriormente, se tornará um imenso sucesso numa versão dos Delfins. Em Maio desse mesmo ano dá entrada no Hospital e, no dia 13 de Junho de 1984, morre em consequência de uma broncopneumonia bilateral grave. Será sepultado, dois dias depois, no cemitério de Amares (Braga), perto da sua aldeia natal, com a presença de poucos músicos acompanhando o funeral. Com a sua morte desaparece um dos maiores renovadores da canção portuguesa das últimas décadas. No entanto o seu espólio musical foi sendo aberto e Lena d'Água edita, em 1989, o disco "Tu Aqui" que inclui cinco composições inéditas de António Variações.


Em Janeiro de 1994 é editado um disco de homenagem a António Variações que reúne, em torno de versões do cantor, os nomes de Mão Morta, Três Tristes Tigres, Resistência, Sitiados, Madredeus, Sérgio Godinho, Santos e Pecadores, Delfins, Isabel Silvestre e Ritual Tejo. Isabel Silvestre incluirá no seu disco de 1996 "A Portuguesa" o tema "Deolinda de Jesus" de Variações. Este tema, uma sentida homenagem de Variações à sua mãe (que se chama exactamente Deolinda de Jesus) é o contraponto de qualidade a todas as "Mães Queridas" e quejandos deste país. Em 1997 é editado o CD "O Melhor de António Variações", o qual recupera material editado em todos os seus discos. Em 2006 é editada a compilação "A História de António Variações - Entre Braga e Nova Iorque https://www.fnac.pt/Antonio-Variacoes/ia6976/biografia

“ERA UM SELF MADE MAN” –
Escreve Miguel Cadete – Diretor  do Blitz - Expresso

(..) “Faleceu na noite de Santo António, em 1984, no Hospital da Cruz Vermelha, em Lisboa, onde estava internado no serviço de doenças infecto-contagiosas. A certidão de óbito dá como certa uma broncopneumonia bilateral extensa como a causa da morte, mas os cuidados postos na selagem do caixão levam a crer que era seropositivo e que foi uma das primeiras vítimas de sida em Portugal, o que não foi confirmado pelos médicos. Teresa Pinto Couto alternava com Jaime Ribeiro as noitadas passadas no hospital e o irmão ofereceu-lhe uns auscultadores para que pudesse ouvir as suas novas músicas tocarem na rádio. Os Heróis do Mar levaram-lhe as provas da capa do álbum. Ele só pedia, confirmou Carlos Maria Trindade, "que o tirassem dali".es-

(...) Jaime Rodrigues Ribeiro é um dos nove irmãos de António Variações. Sete anos mais novo do que o cantor, tem escritório de advocacia em Lisboa e é um dos principais interessados na recuperação da memória de Variações. Defende o Variações "fiel às suas raízes rurais, religiosas e educacionais", mas compreende a transição de cariz urbano. "Como ele veio cedo para Lisboa, começou a cultivar outros gostos, outras formas de estar e atitudes. O António só tinha a 4ª classe mas era um 'self-made man'. Apenas tinha a instrução primária."

Chegado à capital aos 12 anos, António Joaquim Rodrigues Ribeiro foi acolhido em casa de uns primos e empregou-se como marçano ("distribuía mercearias em casa dos clientes") e mais tarde, depois de tirar um curso de tipografia, como escriturário. Mas não era isso que mais ambicionava, pois nas férias da Páscoa ou do Natal, quando subia ao Minho para rever a família, demonstrava o seu interesse pela música, o fado em particular. "Passou a ser amante do fado, sobretudo da Amália, o grande ídolo. Quando ia ao Minho, levava revistas onde se falava da Amália, foi ele que nos cultivou o gosto do fado, coisa que não se ouve no Minho. Cantava fados da Amália lá no quintal, o que para nós era desconhecido. O que é certo é que gostávamos de ouvir", continua Jaime Ribeiro quando discorre sobre o gosto pela música que então a família descobria em António.

Recordo-o também, quando ele já tinha vinte e tal anos, numa dessas férias, a compor uma canção relacionada com a aldeia. Lembro-me da letra - 'todas as manhãs, bem antes do sol na montanha despontar; era acordado pelos camponeses que passavam a cantar; sempre a mesma animação; e eu senti então uma vontade louca de os acompanhar'. Este é um quadro muito próprio da nossa aldeia, pois próximo da nossa casa existia uma quinta para a qual se dirigiam ranchos de jornaleiros que passavam muito cedo, cantando enquanto se dirigiam para o trabalho. Isto é um paradoxo porque hoje vivemos num mundo de tristeza em que as pessoas têm tudo mas andam sempre cabisbaixas." António Variações nunca viria a gravar esse tema.

Depois do escritório veio a tropa. Em 1964, António foi destacado para Angola, durante a guerra, onde veio a operar na retaguarda, como especialista em mensagens cifradas. Cumpriu a comissão de três anos e quando regressava a Portugal, mesmo depois de cumprir o serviço militar, não podia sair do país sem autorização da polícia política dado estar em posse do sistema de descodificação de mensagens confidenciais do Exército. É com um certo enlevo que o irmão mais novo descreve as fotografias que António enviava do Ultramar, em situações diversas como quando estava a banhos num rio ou, "o que me espanta muito - porque ele quando veio para Lisboa deixou de praticar a religião católica -, rodeado de meninos negros a dar catequese".
Cumprida a comissão, António regressou a Lisboa e começou a viajar para Londres - onde ainda hoje se encontra outro irmão, José, que também seguiu o ofício de barbeiro - e Amesterdão, onde viria a aprender essa arte. Nessas viagens "desenrascava-se a lavar pratos para arranjar alguns trocos" e quando chegou a Lisboa foi trabalhar para os salões de Isabel Queiroz do Vale, no Centro Imaviz, primeiro, e no Centro Comercial Alvalade, depois, onde trabalhou com Zé Carlos.
"Para a família foi uma surpresa ele enveredar por essa profissão - barbeiro, pois não admitia que lhe chamassem cabeleireiro", prossegue Jaime Ribeiro. Foi nessa altura que António comunicou ao irmão o seu gosto pela composição de canções. "Soube mais tarde que ele até tinha assinado um contrato com a Valentim de Carvalho, em 1977 ou 1978. Não sei em que contexto, penso que enviou uma maqueta e eles acharam que aquilo tinha pernas para andar." – Mais pormenores em https://blitz.pt/principal/update/2019-08-22-Quem-era-afinal-Antonio-Variacoes-

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