Jorge Trabulo Marques - Jornalista
Tive oportunidade e o
prazer de ser amigo de Mário Cesariny de Vasconcelos, de ter partilhado com ele
variadíssimos e inesquecíveis momentos de agradável convívio, com um dos mais
singulares poetas pintores e do surrealismo português - "Passados 17 anos,
sobre a sua morte - "é uma voz que ainda ecoa" e o seu surrealismo
uma revolta que ainda não perdeu o sentido” - Entre os amigos mais
chegados, a sua presença continua tão forte quanto antes. Como naqueles tempos
passados em redor de uma mesa de café a falar de literatura, de política, de
arte, de tudo.
Outro dos seus grandes amigos e confidente era o mestre Cruzeiro Seixas
O Carismático Poeta e Pintor admirava o meu espírito aventureiro e eu, desde que o conheci, passei também admirar a imagem e a voz de um rosto e de uma personalidade, verdadeiramente invulgar, de um grande poeta de corpo inteiro, frontal e direto sem a pretensão de humilhar ou de superiorizar, mas tão somente ser real e verdadeiro.
Gostava de ouvir as minhas narrativas das escaladas a prumo do Pico Cão Grande
em São Tomé e as minhas travessias em frágeis pirogas nos mares do Golfo da
Guiné. E também apreciava os meus apontamentos insólitos de reportagens e
entrevistas na extinta RDP- Rádio Comercial – Um dia haveria de ser ele a
substituir o repórter com a empregada de Natália Correia, deslindando segredos,
de almoços e jantares, no lendário Botequim e em sua casa e outras revelações -
Quem haveria de imaginar tão inesperado acaso!
Aprendi com ele esta elementar verdade : Sê o vosso fermento, a vossa
inquietação e a vossa própria luxúria - Assumi até os vossos próprios
fantasmas; sê íntegros e verdadeiros, tal como sóis. Se assim procederes, o
apregoado diabo anticatólico ou anticristão, farisaico, não entrará em vós e
não terá no vosso corpo e no vosso espírito, o vosso melhor aliado
Mário Cesariny de Vasconcelos, sem dúvida, uma das mais singulares e
surpreendentes figuras do surrealismo português, tanto na poesia como na
pintura, tive o prazer de ser seu amigo, de ter partilhado com ele
varridíssimos e inesquecíveis momentos de agradável convívio.
Sim, o carismático artista, admirava muito os meus trabalhos de reportagens e
entrevistas na extinta RDP- Rádio Comercial, nas mais diversas circunstâncias:
- Desde as obtidas no interior das prisões, nas ruas da cidade e em casa das
mais diversas personalidades
Quando me encontrava, nas suas e também minhas deambulações noturnas, aí vinha
a pergunta sacramental: Ó Jorge! Tens aí a maquineta? (o gravador) – Claro que
era o meu indispensável instrumento de trabalho que trazia sempre no meu saco,
fosse para onde fosse .
E, não tardou a dar o seU contributo: começando por falar com uma das mulheres, que
nos ladeavam, sobre o casamento. e, pouco depois, veja-se também a curiosa
coincidência!... – Ao nosso lado, a escassos metros, quem haveria de estar?...
Uma cabo-verdiana em acalorada discussão, sobre o festivo ambiente das marchas
- E quem era essa mulher? - A empregada de Natália Correia, no lendário
Botequim, com a qual haveria de travar um diálogo, a bem dizer, verdadeiramente
surreal, deslindando segredos de almoços e jantares, naquele mais famoso espaço
de tertúlia da capital, além de outros episódios da vida pessoal de quem, no
seu dia a dia, tinha de enfrentar extremas dificuldades de sobrevivência,
habitando tugúrios onde as ratazanas roíam as mãozinhas e as orelhas das
criancinhas
Mário Cesariny de Vasconcelos, nasceu em Lisboa, a 9 de Agosto de 1923 —
faleceu nesta mesma cidade, no dia 26 de Novembro de 2006 - Poeta e pintor,
considerado o principal representante do surrealismo português, além de
antologista, compilador e historiador (polémico) das atividades surrealistas em
Portugal. "Passados 11 anos, sobre a sua morte - "é uma voz que ainda
ecoa" e o seu surrealismo uma revolta que ainda não perdeu o sentido” –
Entre os amigos mais chegados, a sua presença continua tão forte quanto antes.
Como naqueles tempos passados em redor de uma mesa de café a falar de
literatura, de política, de arte, de tudo
NO DIA EM QUE O POETA ERGUEU UM CARTAZ DE PROTESTO - À extinção do Cineteatro-Éden, que iria dar lugar a um Hotel
Mário Cesariny, foi, sem dúvida, uma das mais singulares e surpreendentes figuras do surrealismo português, tanto na poesia como na pintura, Tive o prazer de ser seu amigo, de ter partilhado com ele varridíssimos e inesquecíveis momentos de agradável convívio.
No dia em que ele não quis embandeirar com “A Necrofilia do poder” que “vem aplaudir a próxima destruição do maior e melhor apetrechado teatro que se construi em Portugal -
Sucedeu no dia em que, Sophia de Mello Breyner Andresen, foi apresentar um livro de poemas, no antigo Éden Cineteatro, nos Restauradores, em Lisboa, edifício desenhado pelo arquiteto Cassiano Branco, um dos mais conhecidos marcos da arquitetura de estilo art déco em Portugal, com plateia, balcão e capacidade para mais de 2000 espectadores, inaugurado a 25 de setembro de 1914, abrindo com a opereta "O Burro do Sr. Alcaide", da autoria de Gervásio Lobato e D. João da Câmara, e interpretações de José Ricardo, Palmira Bastos[10] e Joaquim Costa, encerrou a 31 de janeiro de 1989 com a última sessão de cinema do filme "Os Deuses Devem Estar Loucos II" –
Só não estava louco o militante do surrealismo português, o artista mais genuíno do Surrealismo em Portugal, desde pintura à poesia, tudo nele era a genuína expressão do sonho, do automatismo e da espontaneidade, embora tivesse passado por marginal, quando ali se plantara no hall do famoso Cineteatro, antes do consumado o já previsto encerramento, eis que ali está plantado, naquele dia especial um dos mais cotados poetas portuguesas, outra figura não menos relevante da poesia portuguesa.
A NEGA AZEDA À REPORTAGEM DE SOPHIA DE MELLO BRYNER, FEZ-ME ABANDONAR A CESSÃO
Foi por um feliz acaso que me apercebi da presença de Mário Cesariny, pois quando ele entrou, já eu tinha subido ao espaço do primeiro andar, onde ia decorrer a cerimónia do lançamento do livro. Mas acabei por me vir embora: afinal, ninguém se sentava e toda a gente rodeava, a conhecida poetiza, com muitas pessoas, mais propensas a darem nas vistas, a mostrar os seus fatos e gravatas, a exibir as suas toaletes, enfim, mais a idolatrá-la de que a querer ouvir falar – Foi, então, que, para minha surpresa, me apercebi daquele insólito protesto de Mário Cesariny e me solidarizei com o seu desencanto, procurando apaziguar-lhe a sua indignação.
O espaço estava a abarrotar de convidados, todos de pé, e, ao aproximar-me de Sophia, pedi-lhe umas breves palavras sobre o seu novo livro para editar numa noticia. E, naquela altura, não era como agora, com a panóplia de dezenas de rádios e vários canais de televisão, apesar de já ser famosa. Não me ocorre ter visto ali mais alguém com gravador. Mas escusou-se a responder. Pelos vistos, todo o tempo estava a ser tomado para corresponder aos muitos sorrisos e salamaleques, com que a olhavam, pelo que, ao meu muito pedido, correspondeu-me olhando-me, com um certo ar altivo e ríspido: em vez de me responder, atira-me com esta observação: “O que me quer perguntar?!...Não estou aqui para dar entrevistas!!! “ – Não ponho em causa o valor da sua obra, mas foi dos momentos que mais me dececionou, das muitas entrevistas que fiz na minha vida de repórter, às mais diversas personalidades, desde Azeredo Perdigão, a Costa Gomes, Adelino Palma Carlos, Vergilio Ferreira, Fernando Namora, Fernanda de Castro, Carlos Botelho, Jorge de Mello, Amália Rodrigues, a tantas e varridíssimas personalidades, nas mais diferentes áreas
UMA CENA, QUASE IDÊNTIFCA Na última Feira do Livro de Lisboa
Curiosamente, onde fui fotografar e entrevistar vários autores, pois, embora já há muito tenha deixado as lides profissionais, nem por isso deixo de fazer o gosto da fotografia e do jornalismo, sim, quando me aproximei de Miguel Sousa Tavares, pedindo-lhe autorização para o fotografar, ele vira-se para mim, quase com a mesma reação: pese ter-lhe mostrado a carteira profissional de jornalista, pergunta-me, com ar de incómodo: para que é que você me quer fotografar?
Não faço a fotografia, como gostaria de fazer, senão logo a seguir ao escritor e poeta, José Luís Peixoto, que estava ali numa banca ao lado da mesma editora, igualmente numa sessão de autógrafos, e que, com sorriso amável e amigo, correspondeu ao meu pedido – Mas, enfim, se todos os feitios fossem iguais, talvez nem houvesse poetas e nem o colorido da poesia.
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