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sexta-feira, 9 de fevereiro de 2018

Frio traz saudades antigas com poesia secular - Na minha aldeia, sentados à volta da braseira, porque o Inverno é de sincelo – A loja mais popular do adro da igreja, já encerrou as portas e a Tia Teresa, já nos deixou . A taberna do Pedro e o taberneiro, já não existem mas perduram na memória coletiva, tal como a centenária igreja e o seu vetusto campanário, agora com um descaracterizado edifício estilo armazém mas com uma torre tão inclinada que não ficará atrás da famosaTorre de Pisa.


Jorge Trabulo Marques - Jornalista e filho desta terra  

Algumas das imagens, que aqui lhe ofereço, já são como que de um outro tempo: eram habituais, nesta altura do ano,  quando eu era  garoto e a criançada, tinha de levar a escalfeta  para a escola, que era uma braseira de lata, mais pequena e coberta com um estrado de madeira. Agora, com o desfazer das antigas tradições, exigem-se outras condições de aquecimento:   as brasas têm que ter a cor viva do fogo; já não se aceitam, como antigamente, que esmoreçam, se apaguem e se desfaçam em cinza junto das pernas e dos pés friorentos das braseiras: prefere-se a lenha arder  no fogareiro  ou no centro da  lareira.





 Pelas terras altas do interior de Portugal, há nevoeiros e aragem de arrepiar; o  Inverno vai branquinho e friorento, com espessos mantos de geadas, quedas de neve a desprender-se das névoas em voláteis  flocos ou, então, o sempre admirável sincelo já pendurado nos ramos dos arbustos e das  árvores a lembrar lírios rutilantes de cristal de um outro mundo fantástico e espetral.  A meteorologia dá boas-novas para o fim-de-semana, com o termómetro a inverter  a descida.

Para quem faz a vida nos campos e tem de levantar-se cedinho, é certo que até pode sentir  a alma a purificar-se de todas as máculas e de todos os seus pecados, mas a dureza física é de rachar, constituindo, indubitavelmente,  mais um duplo e duríssimo sacrifício.  No entanto, para quem viaje de carro,  protegido de ar condicionado,  o que pode descobrir  à frente do limpa para-brisas, ou pelos lados das janelas, é  verdadeiramente surpreendente e surrealista

Embora sempre de atalaia, em não se alargar demasiado nas velocidades, pois, nestas condições atmosféricas, todo  o cuidado é pouco, sobretudo se molinhar, porque, o  gelo que derrete na estrada ou escorre das bermas, é certo que torna o tape menos escuro mas bem mais perigoso e  escorregadio: não  se pode comparar  à  beleza caprichosa que reveste de branco o verde das ervas, mas alto lá, com o  traiçoeiro piso, que  pode mesmo  fazer despistar e provocar partidas indesejáveis ou mesmo ser fatal!

Sim,  a cor da paisagem poderá  revestir-se de cinza ou mesmo  da brancura imaculada das nuvens, sobretudo pela manhã, mas dificilmente torna a viagem monótona, quer de carro ou de comboio: há sempre um cenário  diferente à  espera de surpreender o viandante;  a graciosa imagem para contemplar por ação das baixas temperaturas, que, nestes dias se fazem sentir, mais ao Centro e a Norte de que ao Sul

Pela cidade, em  Lisboa,  que eu descubro do meu terraço, pela manhã, com 9º de temperatura,  era de nevoeiro e de molinha fria, tornando o casario mais atrativo e surrealista –   De tarde, o tempo levantou um pouco e promete melhorar


Pois, referem noticias de que “Por estes dias, Portalegre, Coimbra, Guarda, Bragança e Braga vão estar algumas horas sob temperaturas abaixo de zero; Porto, Castelo Branco, Évora e Beja vão descer (desceram)  aos zero graus. A máxima será de 14 graus, em Faro, com Guarda a não passar dos 3º e Bragança dos 6º. Mas nenhuma capital de distrito se vai aproximar dos seus registos mais negativos.

Ao descer aos 3º, na temperatura mínima, Lisboa será das que vai ficar mais perto e, mesmo assim, com mais de quatro graus de diferença para os 1,2º abaixo de zero verificados em 1956, o inverno mais frio em Portugal (e na Europa) dos últimos 90 anos (ou seja, desde que existem dados).

Em Bragança, a temperatura mínima tocou  nos 7,7º abaixo de zero, longe dos -12º em janeiro de 1945 ou dos -11,6º em fevereiro de 1983. Há três anos, Mirandela, outra cidade de Trás-os-Montes, havia chegado aos -7,4º.
Refere  ainda o público, que, Já nas Penhas Douradas, em plena Serra da Estrela, registaram-se -5,8º nesta madrugada, a quinta consecutiva abaixo de zero, mas nada de admirar para um inverno em Portugal. “Estamos dentro dos padrões de temperatura para esta época do ano”, remata Vanda Pires. http://visao.sapo.pt/actualidade/portugal/2018-02-06-Esta-um-frio-de-rachar--Normal-e-inverno


Medos de Inverno e esperanças de outro céu!...

Que a vida foge  é toda a ciência que eu
pude aprender, e tudo o mais mentira.
A flor que foi é flor que já morreu.

Do poeta Omar Khayyam –  -  século XII – Excerto da antologia  “Poesia de 26 séculos, por Jorge de Sena


"Ah, encha a Taça: - de que vale repetir
Que o Tempo passa rápido sob nossos Pés:
Não nascido no amanhã, e falecido Ontem,
Por que angustiar-se frente a eles se o Hoje pode ser doce?
"

Se uma rosa guardaste, no teu coração,
Se a um Deus supremo e justo endereçastes
Tua humilde oração, se com a taça erguida
Contaste um dia o teu louvor à vida:
Tu não viveste em vão!”

Biografia:Omar Khayyam  “Conhecido no ocidente como poeta e autor do Rubaiyat, (em português, “quadras" ou "quartetos”), que ficariam famosos a partir da tradução de Edward Fitzgerald, em 1839. Muitas coisas se contam sobre Omar Khayyam, porém de poucas podemos ter certeza. Sabemos que nasceu em meados do século XI em Nixapur, capital da província Persa do Coração, onde passou a maior parte de sua vida. Omar Khayyam faleceu em 1131.
No ano de 1074 foi chamado por Malique Xá I para reformar o antigo calendário persa, que deu um erro de um dia em 5000 anos. A reforma do calendário foi substituída mais tarde pelo calendário lunar islâmico.
Nixapur suportou guerras e terremotos, e em 1221 foi saqueada pelos mongóis. O túmulo de Omar Khayyam superou todas as calamidades e está conservado até hoje. a. Excerto de https://pt.wikipedia.org/wiki/Omar_Khayyam

Pensamentos do mesmo poeta:

O tédio de Khayyam não é o tédio de quem não sabe o que faça, porque na verdade nada pode ou sabe fazer. Esse é o tédio dos que nasceram mortos, e dos que legitimamente se orientam para a morfina ou a cocaína. É mais profundo e mais nobre o tédio do sábio persa. E o tédio de quem pensou claramente e viu que tudo era obscuro; de quem mediu todas as religiões e todas as filosofias e depois disse, como Salomão: «Vi que tudo era vaidade e aflições de ânimo», ou como, ao despedir-se do poder e do mundo, outro rei, que era imperador, nele, Septímio Severo: «Omnia fui, nihil...» «Fui tudo; nada vale a pena.»


A vida, disse Tarde, é a busca do impossível através do inútil; assim diria, se o houvesse dito, Omar Khayyam.
Daí a insistência do persa no uso do vinho. Bebe! Bebe! É toda a sua filosofia prática. Não é o beber da alegria, que bebe por que mais se alegre, por que mais seja ela mesma. Não é o beber do desespero, que bebe para esquecer, para ser menos ele mesmo. Ao vinho junta a alegria a acção e o amor; e há que reparar que não há em Khayyam nota alguma de energia, nenhuma frase de amor. Aquela Sàki, cuja figura grácil entrevista surge (mas surge pouco) nos rubbayat, não é senão a «rapariga que serve o vinho». O poeta é grato à sua esbelteza como o fora à esbelteza da ânfora, onde o vinho se contivesse.

A casa onde nasci

A alegria fala, do vinho, como o Deão Aldrich:...
A filosofia prática de Khayyam reduz-se pois a um epicurismo suave, esbatido até ao mínimo do desejo de prazer. Basta-lhe ver rosas e beber vinho. Uma brisa leve, uma conversa sem intuito nem propósito, um púcaro de vinho, flores, em isso, e em não mais do que isso, põe o sábio persa o seu desejo máximo. O amor agita e cansa, a acção dispersa e falha, ninguém sabe saber e pensar embacia tudo. Mais vale pois cessar em nós de desejar ou de esperar, de ter a pretensão fútil de explicar o mundo, ou o propósito estulto de o emendar ou governar. Tudo é nada, ou, como se diz na Antologia Grega, «tudo vem da sem-razão», e é um grego, e portanto um racional, que o diz. http://arquivopessoa.net/textos/1772    .https://pt.wikipedia.org/wiki/Omar_Khayyam



TAVERNA
De Carmina Burana – séc. XII e XII

Nu taberna quando estamos.
De mais nada nós curamos,
 Que do jogo que jogamos,
Mais cio vinho que bebemos.
Quando juntos na taberna,
Numa confusão superna ,
Que fazemos nós por lá?
Não sabeis? Pois ouvi cá.

Nós jogamos, nós bebemos,
A tudo nos atrevemos.
O que ao jogo mais se esbalda
Perde as bragas , perde a fralda,
E num saco esconde o couro,
Pois que um outro conta o ouro.
E a morte não vai' um caco
Pra quem só joga por Baco.

Nossa primeira jogada
É por quem paga a rodada.
Depois se bebe aos cativos,
E a seguir aos que estão vivos.
Quarta roda, aos cristãos juntos.

Quinta roda, aos fiéis defuntos.
Sexta, às puras nossas manas,
 E sete às bruxas silvanas.

Oito, aos manos invertidos.
Nove, aos frades foragidos,
Dez, se bebe aos navegantes,
Onde é para  os litigantes.
E doze, dos suplicantes,
E treze, pelos viandantes.
Pelo Papa e pelo Rei
Bebemos então sem lei.

Bebem patroa e patrão.
 Bebem padre e capitão.
Bebe o amado e bebe a amada,
 Bebem criado e criada.
Bebe o quente e o piça fria,
Bebe o da noite e o do dia,
Bebe o firme, bebe o vago,
Bebe o burro e bebe o mago.

Bebe o pobre e  bebe o rico,
Bebe  o pico-serenico
Bebe o Infante, bebe o cão.
Bebem cónego e deão.
Bebe a freira e bebe o frade ,
Bebe a besta, bebe a madre,
 Bebem todos do barril,
 Bebem cento e bebem mil.

Nenhuma pipa se aguenta
Com esta gente sedenta,
 Quando bebe sem medida
 Quem de beber faz a vida.
E quem de nós s´ fiou,
Sem cheta s´ arrebentou.
E quem de nós prejulgava,
Se quiser que vá à fava.


Carmina Burana (em português: "Canções da Beuern", sendo "Beuern" uma redução de Benediktbeuern, município situado na Baviera) é o título, em latim de um manuscrito de 254 poemas e textos dramáticos, datados, em sua maioria, dos séculos XI e XII, sendo alguns do século XIII.[1] As peças são, em geral, picantes, irreverentes e satíricas e escritas em latim medieval, embora algumas tenham sido escritas em médio-alto-alemão, com alguns traços de francês antigo ou provençal. Há também partes macarrônicas, numa mistura de latim vernáculo com alemão ou francês.

Os manuscritos refletem um movimento europeu "internacional", com canções originária de Occitânia, França, Inglaterra, Escócia, Aragão, Castela e do Sacro Império   https://pt.wikipedia.org/wiki/Carmina_Burana



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