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terça-feira, 10 de julho de 2012

TEMPLOS DO SOL – DE CHÃS A LEÇA DA PALMEIRA, COM ESCALA NO CANADÁ






Foi este o título de uma apresentação no dia 27.5.2012 por ocasião da III Feira do Livro de Leça da Palmeira, organizada pela respectiva Junta de Freguesia.

A apresentação começou com um trabalho anteriormente feito sobre Chãs, que terminou com uma imagem do nascer do Sol nos equinócios na província de Alberta, no Canadá. Esse trabalho pode ser consultado no blog do ilustre jornalista Jorge Trabulo Marques:



Sobre Chãs, apenas é de acrescentar o que o Sociólogo e Etnólogo Prof. Dr. Moisés Espírito Santo, Catedrático da Universidade Nova de Lisboa, diz sobre os topónimos Chãs, Tambores, e Mancheia.

Chãs: procede do acádico "shamsh" [lê-se xâmexe] que significa exactamente "sol", "o astro" e a "divindade sol". Também significa simplesmente "relógio de sol".

Tambores: é o nome do monte onde se encontra o calendário rupestre de Chãs. Tambores é uma corrupção fonética do vocábulo cananita e hebraico "tabor" que, literalmente, significa "umbigo" e, metaforicamente, "centro da terra", "parte mais elevada da terra", "umbigo da terra", ou seja, um monte sagrado. O monte dos Tambores, em Chãs, foi um templo lusitano/fenício ao Sol.

Mancheia: É o nome da encosta onde se situa a Pedra do Solstício de Chãs. Este topónimo, que nada tem a ver com a expressão "mão cheia", é surpreendente, porque significa "contagem do tempo" ou "medição do tempo", isto é, sítio onde se conta ou mede o tempo: "man" (cananita e hebraico) significa "contar", "enumerar"; "shôh" (aramaico) significa "tempo", "espaço de tempo". Portanto, "man shôh" [lê-se manxauê] significa "contagem do tempo", que é o que faz a Pedra do Solstício no solstício de Verão.

Recordemos as duas últimas imagens do referido trabalho sobre Chãs (Fig. 1– Chãs; Fig. 2– Canadá) e passemos a Leça da Palmeira

Fig.1                                                                                                            Fig.2
                              





























Fig.3


Como é provável que ao longo dos milénios e noutros locais do nosso território tenha havido mais pessoas preocupadas com o Sol, é lícito perguntar se na freguesia de Leça da Palmeira da cidade de Matosinhos, junto à foz do rio Leça, desde há muito local de chegadas e partidas e com tanta e variada arqueologia já estudada e provavelmente com ainda muita por descobrir, não terá também havido "Templos do Sol". Paisagens gastas por gerações de olhares fugazes e apressados que olham mas não vêem podem estar ávidas da nossa atenção para desvendarem os seus segredos a olhares lentos, atentos...

Assim, aconteceu que, ao fim de muitas dezenas de anos de assíduo contacto, a mensagem de determinado afloramento granítico foi, enfim, captada... para captação deste poente (Fig. 3 + Fig. 4) no dia do solstício de Inverno de 2011, precisamente no dia em que o nascer do Sol em Chãs foi fotografado e filmado

     


Fig.4 


Perante estas imagens, perante esta Porta do Sol, surge a mesma pergunta já suscitada pela Porta do Sol de Chãs, pela Porta do Sol do Canadá e de muitas outras Portas do Sol por esse mundo fora: origem natural ou mão humana?

Este afloramento granítico é de fácil localização, pois fica imediatamente a Norte do Farol da Boa Nova (Leça da Palmeira) e serve de pano de fundo ao grupo escultórico dedicado ao poeta António Nobre e às suas musas, da autoria do escultor Barata Feyo (pai), como se vê na Fig. 5.



                                                              Fig.5


Num mapa da zona vê-se que o alinhamento definido pelo observador (ponto A), pela Porta do Sol (ponto B) e pelo pôr-do-sol faz exactamente 58º com o Norte, que é o ângulo do poente no solstício de Inverno nesta latitude (Fig. 6). 

Em sentido inverso, no dia do solstício de Verão, a partir no ponto assinalado com X junto ao muro da marginal (41° 12' 7,2" N / 08° 42' 48,348" W) (Fig. 6), é possível assistir-se ao nascer do Sol na Porta do Sol da Boa Nova, tal como se vê na Fig. 7 (foto tirada pelas 6h30 do dia 21.6.2012).

Ainda nesse mesmo dia, pelas 21h10, um observador colocado junto a uma tampa de saneamento existente na marginal, perto do muro do Farol e por baixo da que foi a casa que alojou a "ronca" do farol, verá o Sol, ao desaparecer no mar, ficar alinhado com a rocha a que aqui se dá o nome de Carneiro e com o topo do rochedo onde se encontra a placa com versos de António Nobre, em frente à Casa de Chá, conforme se vê nas Figs. 8 + 8a.



                                                                          Fig.6



                                                                    Fig.7
Fig.8











                          Fig.8a




Este alinhamento do pôr-do-sol no solstício de Verão faz precisamente 122º com o Norte no sentido do movimento dos ponteiros do relógio, ou 58º no sentido contrário, que é exactamente a direcção do pôr-do-sol no solstício de Verão nesta latitude.

Chamo Carneiro a esta rocha, porque parece, de facto, um carneiro visto pelas traseiras a 3/4. Aliás, à sua volta parece haver mais "esculturas": uma zoomórfica que parece uma foca (Fig. 9), e uma antropomórfica que parece uma máscara mortuária (Fig. 10)
                        
                                                                                      

 
Fig.9





                                Fig.10




Para melhor esclarecimento, vejamos agora, sobreposto a um mapa (Fig. 11), tudo o que foi dito em relação a orientações, ângulos e alinhamentos solsticiais na zona da Boa Nova, em Leça da Palmeira.



                                                                            Fig.11


É justo perguntar que provas existem que permitam concluir que os "monumentos" que assinalam estes alinhamentos solsticiais aqui na Boa Nova tenham sido feitos pelo Homem, ou se não serão apenas coincidências, caprichos da Natureza. Não são aqui apresentadas quaisquer provas porque não as conheço ou não existem; contudo, é sabido que a não existência de provas não é prova de não existência, e também é sabido que as rochas já lá estavam muito antes do aparecimento de seres humanos, se bem que as fendas possam muito bem ter sido abertas por mão humana e o carneiro possa ter sido esculpido... O que a Natureza já de si oferecia pode ter sido objecto de manipulação, de afeiçoamento, no sentido de adaptação a um fim determinado, que seria, neste caso, como em muitos outros, a marcação do dia em que o Sol, no seu incessante movimento aparente de vaivém, inverte o sentido desse movimento. A partir desses dias, o tempo diário de Sol começa a aumentar ou a diminuir.

Disse o cientista e escritor Carl Sagan que há "(...) a necessidade de equilibrar o método científico com o maravilhoso puro e não adulterado (the need to balance the scientific method with pure, unadulterated wonder)". Nos casos aqui apresentados não se vai tão longe, pois não se entra no maravilhoso: a descoberta desses ancestrais marcadores solares – que nada têm do tal maravilhoso puro – é apenas resultado de mentes curiosas, que, como perdigueiros, levantam a caça. Daí para diante... é com o caçador. Daqui para diante... seria um estudo interessante para arqueólogos interessados nesta área de investigação, como aconteceu em Xancra, perto de Cuba, no Alentejo, onde investigações de âmbito arqueoastronómico realizadas por António Carlos Valera e Helmut Becker permitiram concluir que as entradas dos três recintos que estudaram possuem claramente orientação astronómica e cosmológica, como se pode ver na Fig. 12. À esquerda, Santa Vitória, em foto cedida por Miguel Lago, e planta do recinto interior segundo Dias, 1996 modificado; à direita, Outeiro Alto 2, em foto de Paulo Marques e planta segundo Valera e Filipe, 2010. As entradas encontram-se orientadas respectivamente pelo nascer do Sol no solstício de Verão (planta da esquerda) e pelo nascer do Sol no solstício de Inverno (planta da direita).

(Elementos retirados da revista "Apontamentos de Arqueologia e Património", no 7, pág. 23 – Jan. 2011, do Núcleo de Investigação Arqueológica.)



                                                                     Fig.12



Depois de assistirmos a auroras e a poentes, esta ronda pela zona da Boa Nova de Leça da Palmeira não ficaria completa se não voltássemos ao rochedo junto do monumento a António Nobre, porque há lá outras curiosidades. 



Fig. 13                                                                                                          Fig. 14


Da marginal, vemos a Musa Sentida, Musa Sentada, Musa do Silêncio ou ainda Musa Lendo, como é várias vezes referida por Gilberto Russa, um prolífico poeta, prosador e pintor matosinhense muito atento e profundo observador do que se passa em Leça da Palmeira, no seu livro intitulado "Princípio de um Vazio", apresentado em Maio de 2012 no Porto e em Leça da Palmeira.
Nota-se bem o perfil de uma mulher de farta cabeleira, sentada, a ler, que delimita a Porta do Sol do lado Norte (Fig. 13).

Subindo até essa rocha pela rampa, contornando-a, virando à direita e voltando as costas à refinaria da Petrogal, facilmente nos aperceberemos de um rosto de ancião esculpido na rocha, que pode muito bem ser o Monge Maldito, também referido no citado livro de Gilberto Russa, e que delimita a Porta do Sol do lado Sul (Fig. 14).

Então, "equilibrando o método científico com o maravilhoso puro e não adulterado"... estas duas figuras poderão ser vistas como guardiães da Porta do Sol de Leça da Palmeira, e lanço uma pergunta ao leitor: será este rosto de ancião a auto-escultura do astrónomo/escultor que abriu a Porta do Sol de Leça da Palmeira?

Albano Chaves   -
                                                                                      ***

 Mais um magnífico estudo de Albano Chaves -,  a quem agradecemos ter-nos dado a honra de tão valioso contributo científico e da sua participação nas celebrações do Solstício do Verão. - Jorge Trabulo Marques





2 comentários:

Joaquim Queirós disse...

Um magnífico trabalho de um grande escritor, historiador e investigador. E de um grande amigo.
Joaquim Queirós

rodrigo ancede disse...

Parabens!