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domingo, 14 de abril de 2024

NÁUFRAGOS DO TITANIC . Ocorreu há 112 anos – Singela Homenagem de quem viveu como eu, há 49 anos, o sufoco aflitivo das ondas – Foi na noite de 14 de abril de 1912, às 23 horas 40', durante sua viagem inaugural



Tal como vós, também um dia parti de um porto,
de um indistinto porto tracei meu rumo,
perdi-me, voguei errabundo, fui náufrago!...
Vivi todas as sensações e emoções do mundo,
como só talvez as viva intensamente
quem se abra de corpo aberto
e coração fundido à pulsação
desse plangente limite,
viscoso, movediço, sorvente!
- Na tumultuosa e erma vastidão!

Naufraguei!...
Vi-me ignorado de toda a palavra,
irradiado do próprio sonho,
felizmente resisti e sobrevivi!
Náufragos, irmãos meus!
Afinal, irmãos de todos os homens,
de todos os seres e de todas as coisas!
Ricos ou pobres - O sufoco do mar não os distingue,
engole-os e traga-os a todos por igual.
Tal como vós, ó náufragos do Titanic,
fiz do meu pequeno barco
não a mansão luxuosa
mas o mesmo lar no grande mar!...
e, através das suas ondas,
rugidoras de presságios,
se não tive a vossa sorte,
quantas vezes naveguei e aspirei,
em cada espuma,
em cada noite cerrada,
em erma bruma,
um perfume salgado de morte!...

Eu, que sozinho voguei
sob noites equatoriais povoadas de assombro e trevas
e habituei meus olhos e meu instinto
a ver o que as sombras, as névoas,
os nevoeiros noturnos ocultam ou encobrem,
sim, ainda mesmo agora
- à distância do espaço e do tempo -
,claramente ainda diviso o pronúncio sinistro
das mais trágicas horas de luto!... Distingo o perfil inconfundível
de esbelto e moderno navio - O seu vulto ainda navegando
e sulcando a superfície denegrida das águas!
Sim, como que a antevendo o sinistro momento,
que vai anteceder o brutal choque com o Icebergue,
ao pavoroso afundamento que vai seguir-se por escassas horas.
Entretanto, vendo o desespero dos que saltam para o mar,
que em vão procuram agarrar-se às boias ou dos que são descidos
precipitadamente para as escassas baleeiras que foram arreadas.
Mesmo assim, choram, gritam, gesticulam e imploram proteção divina!

Vendo tão claramente o drama, que até me parece
que esta minha emocionada visão, é de quem lá esteve,
não fruto da minha imaginação! - Que eu sou também
um dos seus náufragos que mergulha no mar e se salva!

Sim, neste momento em que as palavras
se soltam livre e espontaneamente da minha mente,
eu nem sei se não serei mesmo, mais do que o poeta
ou a figura encarnada de um feliz sobrevivente,
alguém que, tendo lá estado, sobrevivido ou morrido afogado,
porém, passados tantos anos, em vez de ter ficado até uma velhice senil, tenha cedo partido para a eternidade e ressuscitado - Se calhar é isso mesmo.



 

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