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sábado, 22 de janeiro de 2022

Poeta Manuel Daniel - Faleceu há um ano vitima da covid 19 - Entrevista dois anos antes da sua morte do autor de “O Coração Acordado”, entre muitas outras obras literárias - Depois de alguns anos de tormentosa invisibilidade, sem todavia se deixar vergar a essa pesada fatalidade

Jorge Trabulo Marques Jornalista  

Entrevista em sua casa, no dia 24 de Agosto de 2019 - Um belo exemplo de resistência à invisibilidade que contraira nos últimos anos da sua vida   

Foi precisamente, há um ano, que faleceu o poeta Manuel Daniel, vitima  de COVID-19, no dia 22 de Janeiro de 2021 no Hospital Sousa Martins da Guarda.

Ao longo da sua vida, Manuel Daniel, escreveu e publicou inúmeros poemas, contos, crónicas, peças de teatro e textos sobre várias temáticas. Apesar de ter publicado uma grande parte da sua obra, com o decorrer dos anos alguns dos seus textos ficaram "esquecidos" no tempo.


 Natural de Meda, residente, desde há vários anos, em V.N. de Foz Côa - Advogado, escritor, jornalista, poeta, dramaturgo, autor de 40 peças de teatro, nomeadamente para crianças, 20 das quais ainda inéditas - Espírito solidário e associativo, de sensibilidade relevante, em associações de solidariedade social, nomeadamente no Lar da Santa Casa da Misericórdia e na Associação Humanitária dos bombeiros de Foz Côa na qual foi seu Presidente da Assembleia Geral, 20 anos, desde 1979 a 1999.

Profundo estudioso, um homem de cultura, tendo dedicado muitos anos da sua vida à função pública e à vida autárquica, cujos olhos, desde há alguns anos, tinham deixado de ver a luz do dia, despediu-se da vida,–aos 86 anos - Faleceu no Hospital da Guarda, onde havia sido internado, há cerca de 15 dias, donde partirá, esta amanhã, diretamente para o cemitério de Vila Nova de Foz Côa, cujo funeral está previsto para as 11 horas. O meu abraço solidário e amigo à sua esposa, filhos e netos -

Uma vida intensa e multifacetada, pautada pela dedicação mas também pela descrição. Desde, há alguns anos, vinha debatendo-se com extremas limitações da sua vista, por ter ficado completamente cego, no entanto, nem por isso, dentro do que lhe era possível e com apoio amigo da família, lá ia compondo os seus versos e editando livros. Em cujos poemas perpassa o que de melhor têm a poesia portuguesa - Dominando com mestria os mais diversos géneros poéticos e neles se expressando, a par de um profundo sentimento de religiosidade, o amor à terra, à natureza, aos espaços que lhe são queridos, suas inquietações e interrogações, sobre a efemeridade da vida e o destino do Homem

Na poesia de Manuel Pires Daniel, não há jogo de palavras mas palavras que vêm do coração, que brotam naturalmente, como água da melhor fonte, que corre das entranhas do xisto ou do granito da nossa terra.

Um coração de poeta, muito admirado e querido, cuja sua obra intelectual, se estende em todos os géneros literários, perfeitas maravilhas de naturalidade , de graça, finura e sensibilidade, que encanta, sorri e toca profundamente quem glosa a sua poesia ou a sua prosa.

Os seus belos versos faziam parte das tradicionais celebrações evocativas nos Templos do Sol , onde tivemos a alegria e o prazer de contar com a sua amável presença, por várias vezes, sendo a última no Equinócio do Outono, dia 22 de Setembro 2020, onde foram lidos poemas de sua autoria e o homenageámos. - Ele que também, até, já havia participado na homenagem, que prestámos, na Pedra dos Poetas, Fernando Assis Pacheco, cuja imagem aqui recordamos - Justamente no mesmo local, onde o então jornalista e poeta, erguera os braços, um mês antes da sua morte, aquando de uma reportagem no Vale do Côa.

Manuel Daniel, disse naquele  antiquíssimo e sagrado  altar: " Continuamos a ser perseguidores das preocupações que ocuparam os homens primitivos”: “E aqui estamos: a interrogarmo-nos a nós próprios, a saber quem somos, o que queremos! O que fazemos!...” Palavras do poeta invisual, jornalista, advogado e dramaturgo, Manuel Daniel, na sua expressiva alocução, em resposta ao poemas lidos e aos elogios preferidos na auspiciosa manhã do primeiro dia do Outono, no maciço granítico do planalto dos Tambores e Mancheia, onde termina a meseta ibérica, com os seus monumentais e majestosos penhascos e enigmáticos megalíticos, seus ancestrais postos de observação astronómica e locais de culto.




VIEMOS AQUI ESPREITAR A HISTÓRIA –


Este, meus amigos, é um ato de iminente cultura popular! Isto é um modo de sentir, aquilo que, de mais vivo e mais puro existe na Terra e pode ser compreendido por todos os homens! “ – Começou por sublinhar, Manuel Daniel - Poeta, dramaturgo, jornalista e advogado, homem culto e humanista, talento  multifacetado e de rara sensibilidade, autor de uma vasta obra literária, natural de Meda, concelho limítrofe  do termo desta aldeia, figura muito querida e prestigiada  na nossa região, atualmente invisual, residente em V.N. de Foz Côa, desde há vários anos, onde  casou, exerceu advocacia e continuou a dedicar-se à causa pública.

Viemos aqui espreitar a história! Viemos aqui procurar um contato com aqueles  que já viveram aqui a sua vida e gastaram  aqui as suas preocupações!... E, sobretudo, interrogaram-se, como ainda hoje nos interrogamos por quatro grandes pilares: o ESPAÇO, A  VIDA E O ALÉM!

O Espaço, continua a ser uma grande preocupação do homem de hoje!.... E logo nesta altura, nos alvores da inteligência, quando o homem começou a ter conhecimento de si próprio, nessa altura o espaço foi a sua grande preocupação: onde estava, nesse Universo, nesse bocado do Mundo!

O tempo!... Também o homem, dos primeiros tempos, dos primeiros alvores do mundo , teve a preocupação do tempo.

O que se está aqui a passar, como medidor do tempo e da história, é um aparelho da própria naturalidade de tudo o que existe!... É uma máquina de verificar o tempo!

O tempo, realmente, tem sido uma luta constante do homem através dos séculos!... Através dessa contagem, o homem consegue desvenda muitos dos seus mistérios, quer nas suas viagens interplanetárias!.... Nas suas relações com os astros, com tudo… com o tempo! 

O que é o tempo?!.... Nós somos uma fração do tempo ou somos uma partícula invisível  desse tempo?...~

A VIDA!... o Homem, teve sempre a preocupação do que é a vida!.. E o que é a vida?.....É aquilo que nós somos! Aquilo que nos foi dado e o além!

(...) 

Meus amigos:


Estamos aqui numa confraternização cultural, que é muito útil para   todos e que nem tem principio nem tem fim !

Por aqui passaram. Certamente, grandes homens através destes séculos!

Pergunta-me, às vezes, o amigo Jorge Trabulo Marques, se o Miguel Torga, terá passado por aqui?... Terá andado nestes fraguedos!....

Eu aposto que sim, porque, uma vez em conversa com ele, ele me dizia que conhecia Foz Côa, melhor do que eu!....

Como caçador de perdizes, ele percorria lugares aparentemente inóspitos, como este!... Mas este é um lugar muito especial!... Há aqui forças que  nós desconhecemos!

Esta orografia é de uma riqueza maravilhosa!... Exemplar!... E nos cá estamos para contemplar neste pequeno espaço! Aquilo que o homem tem de melhor! … E, certamente, muitos mistérios, que nós adivinhamos! Certamente sentimentos mas não sabemos explicar!

Há aqui um mistério da Divindade!... Um mistério do Homem! E um mistério da vida!...

Pois bem, que a continuemos!...A  interrogação faz parte da nossa maneira de ser!...

Os poetas, serão, talvez, as pessoas que conseguirão examinar!.. Explicar!... Refletir!....

Como diz um escritor italiano, Giovanni Papin , os poetas são os felinos do futuro! Porque são dos tais que dão uns passos à frente dos seus irmãos!... Mas, eles conseguem, de facto, ser uma espécie de profetas, e, através dos eus pensamentos, fazer com que o mundo fque um pouco mais iluminado! E seja mais feliz  e os homens mais irmãos!

Muito obrigado


O paisagista inspirado, por genuíno temperamento de artista, que soube conservar e realçar todo o encanto da graça virginal da alma campesina e do realismo forte destas terras; o panteísta nato que extasia e enche de ternura, de empolgante enlevo e emocionante saudade, o espírito de quem o lê, sulcado por emoções, lavradas por suave harmonia e o doce e inebriante perfume de terra virgem, plena de misticismo e de mistérios sedutores e fecundos

O autor dos maravilhosos espectáculos rurais e da natureza envolvente, que mais terão impressionado a retina dos seus olhos, enquanto a mesma não foi toldada pelas trevas do fatalismo cruel da cegueira, mas que, mesmo assim, tão minuciosamente continuava a desenvolver, entremeando-os de episódios encantadores e de uma saudável originalidades bem genuína

Em boa verdade, Manuel Daniel, conquanto não tenha almejado a notoriedade de Miguel Torga, com quem privou, sim, com o filho mais ilustre de São Martinho de Anta, inveterado calcorreador e peregrino por vales profundos, montes de vertigem, de perfis e recortes alcantilados e xistosos ou de natureza rochosa, trepando por penedias graníticas deslavadas e cinzentas, sim, levado por irresistível curiosidade de descoberta, imbuída por irrecusáveis amores e tentadoras paixões cinegéticas, sim, embora mais dado a uma outra contemplação mais serena e menos aventurosa, do que a do inconformista e viajante por brasis e distantes paragens, há, no entanto, entre ambos os poetas, grandes afinidades humanistas e de inquietude sociais nos mesmos palcos agrestes das terras beirãs e transmontanas, na cosmologia geográfica e transcendental de um mundo rural de injustiça e dureza, mas também de encanto, de misticismo e sublimidade

Manuel J. Pires Daniel, nasceu em Vila de Meda (hoje cidade) em 18 de Novembro de 1934. Sem dúvida, um admirável exemplo de labor e de tenacidade, de apaixonado pelas letras e de sentido e dedicação ao bem comum. Mal concluiu a instrução primária, ei-lo a fazer-se à vida - Tinha então onze anos. Era ainda uma criança mas já tinha que começar a pensar no futuro. Tem sido uma vida intensa e preenchida.

A partir dos 20 anos de idade , propôs-se e fez os exames do ensino secundário e frequentou, como voluntário, o curso de 1973-1978 da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, por onde veio a ser licenciado.

A par de vários livros de poesia, colaborações de artigos e poemas na imprensa regional e nacional, bem como em jornais brasileiros, prefácios e a coordenação em várias obras, é também autor de 40 peças de teatro, nomeadamente para crianças, 20 das quais ainda inéditas. Muitos dos seus poemas foram lidos por Carmem Dolores e Manuel Lereno, aos microfones da extinta Emissora Nacional, em “ Música e Sonho”, de autoria de Miguel Trigueiros – Considerado, na época, o programa radiofónico mais prestigiado - Mesmo assim objeto de exame censório, tal como atestam os arquivos.

Mas não menos relevantes são as letras que vêm a ser musicadas e gravadas em discos e cassetes, Interpretadas por Ramiro Marques, em EP nas canções “Amor de Mãe” e “Amor de Pai”, pela Imavox, em 1974 – E, também, anos mais tarde, as letras para um “Missa da Paz” e coletâneas temáticas sobre “Natal e Avós” E, com música de Carlos Pedro, as “Bolas de Sabão”, “Ciganos”, “Silêncio” e outros pomas.

Pormenores biográficos e outros registos em  https://manueldaniel.com/index.php/bibliografia

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