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segunda-feira, 23 de maio de 2016

Leça de Palmeira (do poeta António Nobre) o misticismo, a astronomia pré-histórica e o rio - Um dos temas do livro de Albano Chaves e António Mendes, com o titulo “Leça da Palmeira e o Rio Leça nas Artes, nas Letras e nas Ciências – A ser apresentado dia 27 às 18,30 no Museu da Quinta de Santiago

Jorge Trabulo Marques - Jornalista

Há lugares que, pela sua situação ou alinhamento geográfico, face aos astros, à estrelas, constelações e ao próprio movimento aparente solar,   são especialmente prendados, prenhes de mistérios e de misticismo, que inspiram poetas, ou mesmo dando-os à luz, tal como tantas outras figuras e de génio, assim, nos parece que seja o caso de Leça da Palmeira, ou quem ainda não associou o nome de Leça, a António Nobre? – Razão pela qual compete aos observadores, aos investigadores, ir ao encontro dessas míticas figuras, dos homens que emprestaram a fama à sua terra ou ir ao  fundo dos segredos pelos quais esta também lha deu, decifrá-los e, na medida do possível, presentear os leitores, com as suas obras, já que, o que é belo, deve ser oferecido e partilhado – E, conquanto ainda não tenha tido o prazer de ler o  livro de Albano Chaves e António Mendes, intitulado “Leça da Palmeira e o Rio Leça nas Artes, nas Letras e nas Ciências, é minha convicção, de que se trate, realmente, de uma abordagem nesse sentido;

Albano Chaves
Pois, conforme é dito na nota explicativa, que  surge relacionada com o anúncio da sua apresentação, dia 27 às 18,30 no Museu da Quinta de Santiago, trata-se, com efeito do “Indiciário onomástico" que  representa o resultado de um esforço tenaz, para dar voz, às personalidades que ao longo dos últimos séculos, têm encontrado no "espírito de Leça da Palmeira", um porto que une horizontes.

Os recantos de Leça da Palmeira têm a oportunidade de ser questionados pelos que passam, sem que o silêncio seja a resposta previsível. Estes lugares falam-nos de pessoas, artistas, cientistas, poetas e escritores que se sentiram atraídos pelo seu imaginário e que por cá deixaram a sua marca, ajudando a construir uma memória colectiva povoada de momentos de grande intensidade

Desse modo, é de admitir que o livro "Leça da Palmeira e o Rio Leça nas Artes, nas Letras e nas Ciências,  não deixará de fazer alusão a António Nobre,  nome incontornável no  passado cultural de Leça de Palmeira e do seu rio. Na impossibilidade de não ter comigo a referida obra, apraz-me aqui citar alguns trechos da comovente biografia do poeta, de autoria de Guilherme de Castilho,, em que a evocação a Leça, é uma constante: 

"A verdadeira existência de António Nobre, isto é, aquilo que na sua vida há-de ganhar significação profunda e duradoira começa e prolonga-se sempre à margem do ambiente escolar.

Leça, sobretudo, com o poético cortejo de evocações que ela lhe sugere é que será realmente um dos paraísos perdidos da sua mocidade. Lá é que ele começará verdadeiramente a viver, a abrir os olhos inquietos de menino precoce para os mistérios da vida e da natureza.

Que estranho e encantado ambiente! De tudo lá há; existe nela um pouco de cada um daqueles ingredientes com que o poeta há-de estruturar o seu poema sublime de solidão e de saudade. É esse cenário maravilhoso, cheio dê encanto poético, povoado duma multidão de estranhos comparsas, cheios de singularidade e pitoresco, que ficará para sempre na sua alma.

Lá teria tido António Nobre o primeiro sobressalto mais fundo diante da insólita figura da bruxa do padre.
Era pequenina e acolhedora aquela casa de Leça, no Largo de Santa Catarina, onde nos primeiros anos foi morar a família. Mas aquela Maria Cuca-sempre metida na casota do fundo do quintal! O senhorio, um padre que morava lá para os lados de Aguas Santas, s6 de quando em quando vinha a Leça, a cavalo numa burra esquelética que diziam alimentada de fitas de carpinteiro. Era a Maria Cuca, a velha, a bruxa do padre, quem tomava conta da casa. Tomava conta da casa e deitava cartas, como bruxa que era. E os meninos bem o sabiam! Por isso, com um misto de curiosidade e receio, lhe espiavam todos os movimentos suspeitos. Quando o padre morreu, a alma do velho avarento lá veio meter-se”

Noutra passagem, estas notas: “As lavadeiras do Rio Doce, que com meiguice o tratam por «nosso menino», sabem vagamente que é «escrivão de livros». Os velhos pescadores, tão do seu convívio e que lhe pedem nomes «para baptizar o barquito», designam-no entre eles, em toada de vaticínio, pelo chamadouro de «o criatura nova»,

A sua indumentária é sempre diferente da generalidade da moda;  bizarra e pessoal. Raul Brandão recorda-se de o ver de «camisola de pescador»; Alberto de Oliveira fala no seu vestuário «de fina excentricidade» , Eduardo de Sousa não deixa de apontar, como vimos, «aquela nota pessoal que no seu trajar ele punha»; e Júlio Brandão, que também com ele privou, afirma igualmente «que já então acentuava de quando em quando a sua originalidade». Ainda um outro companheiro do acrescenta : «No trajar era original, não por ostentação, bem avesso era ele ao juízo do vulgo, mas por requinte natural». ·

E, como não podia deixar de ser, tomamos a liberdade de aqui transcrever, uma das várias citações poéticas, do autor do “Só”

"Pouco sai à rua. Depois de jantar fica quase sempre em casa a escrever aos amigos de Leça ou deitado em cima da cama, horas seguidas, a relembrar o passado:  um passado tão próximo mas que lhe parece já  imensamente distante.

À noite, quando estou, aqui, na minha toca,
O grande evocador do Vento evoca, evoca
O meu doido verão, este ano passado,
(E a um canto bate, ali, cardíaco, apressado,
O tic-tac do relógio do fogão ... )
Bons tempos, Manuel, esses que já lá vão!
Isto, tu sabes? faz vontade de chorar.
E, pela noite em claro, eu fico-me a cismar,
Triste, ao clarão da lamparina que desmaia,
Na existência que tive este verão na praia,
 Quando, mal na amplidão, vinha arraiando a aurora
Lá por esse mar de Jesus Cristo fora,
No barco à vela do moreno Gabriel!
Vejo passar de negro, envoltas em burel,
Quantos sonhos, meu Deus! quantas recordações!
Fantasmas do Passado, ofélicas visões,
Que, embora estejam lá, no seu país distante,
Oiço-as falar na minha alcova de estudante.

Minhas visões! entrai, entrai, não tenhais medo!
O Rio Doce! túnel d'água e de arvoredo!
Por onde Ano vogava em o vagão dum bote ...
E, ao Sol do meio-dia, os banhos em pelote,
Quando íamos nado à Ponte de Tavares!


SEGREDOS DE LEÇA  - DECIFRADOS POR QUEM VÊ  AS COISAS COM OLHOS DE VER

O texto seguinte, de autoria de Albano Chaves,  foi publicado neste site, noutra página, em 10 de Julho de 2012, com o título templos do sol – de chãs a leça da palmeira, com escala no canadá, porém, achamos oportuno aqui trazê-lo de novo à luz nesta página, um excerto desse interessante trabalho - A juntar a outros trabalhos de investigações de sua autoria






"Como é provável que ao longo dos milénios e noutros locais do nosso território tenha havido mais pessoas preocupadas com o Sol, é lícito perguntar se na freguesia de Leça da Palmeira da cidade de Matosinhos, junto à foz do rio Leça, desde há muito local de chegadas e partidas e com tanta e variada arqueologia já estudada e provavelmente com ainda muita por descobrir, não terá também havido "Templos do Sol". Paisagens gastas por gerações de olhares fugazes e apressados que olham mas não vêem podem estar ávidas da nossa atenção para desvendarem os seus segredos a olhares lentos, atentos...

Assim, aconteceu que, ao fim de muitas dezenas de anos de assíduo contacto, a mensagem de determinado afloramento granítico foi, enfim, captada... para captação deste poente (Fig. 3 + Fig. 4) no dia do solstício de Inverno de 2011, precisamente no dia em que o nascer do Sol em Chãs foi fotografado e filmado

     


Fig.4 


Perante estas imagens, perante esta Porta do Sol, surge a mesma pergunta já suscitada pela Porta do Sol de Chãs, pela Porta do Sol do Canadá e de muitas outras Portas do Sol por esse mundo fora: origem natural ou mão humana?

Este afloramento granítico é de fácil localização, pois fica imediatamente a Norte do Farol da Boa Nova (Leça da Palmeira) e serve de pano de fundo ao grupo escultórico dedicado ao poeta António Nobre e às suas musas, da autoria do escultor Barata Feyo (pai), como se vê na Fig. 5.



                                                              Fig.5


Num mapa da zona vê-se que o alinhamento definido pelo observador (ponto A), pela Porta do Sol (ponto B) e pelo pôr-do-sol faz exactamente 58º com o Norte, que é o ângulo do poente no solstício de Inverno nesta latitude (Fig. 6). 

Em sentido inverso, no dia do solstício de Verão, a partir no ponto assinalado com X junto ao muro da marginal (41° 12' 7,2" N / 08° 42' 48,348" W) (Fig. 6), é possível assistir-se ao nascer do Sol na Porta do Sol da Boa Nova, tal como se vê na Fig. 7 (foto tirada pelas 6h30 do dia 21.6.2012).

Ainda nesse mesmo dia, pelas 21h10, um observador colocado junto a uma tampa de saneamento existente na marginal, perto do muro do Farol e por baixo da que foi a casa que alojou a "ronca" do farol, verá o Sol, ao desaparecer no mar, ficar alinhado com a rocha a que aqui se dá o nome de Carneiro e com o topo do rochedo onde se encontra a placa com versos de António Nobre, em frente à Casa de Chá, conforme se vê nas Figs. 8 + 8a.



                                                                          Fig.6



                                                                    Fig.7
Fig.8











                          Fig.8a




Este alinhamento do pôr-do-sol no solstício de Verão faz precisamente 122º com o Norte no sentido do movimento dos ponteiros do relógio, ou 58º no sentido contrário, que é exactamente a direcção do pôr-do-sol no solstício de Verão nesta latitude.

Chamo Carneiro a esta rocha, porque parece, de facto, um carneiro visto pelas traseiras a 3/4. Aliás, à sua volta parece haver mais "esculturas": uma zoomórfica que parece uma foca (Fig. 9), e uma antropomórfica que parece uma máscara mortuária (Fig. 10)
                        
                                                                                      

 
Fig.9





                                Fig.10




Para melhor esclarecimento, vejamos agora, sobreposto a um mapa (Fig. 11), tudo o que foi dito em relação a orientações, ângulos e alinhamentos solsticiais na zona da Boa Nova, em Leça da Palmeira.



                                                                            Fig.11


É justo perguntar que provas existem que permitam concluir que os "monumentos" que assinalam estes alinhamentos solsticiais aqui na Boa Nova tenham sido feitos pelo Homem, ou se não serão apenas coincidências, caprichos da Natureza. Não são aqui apresentadas quaisquer provas porque não as conheço ou não existem; contudo, é sabido que a não existência de provas não é prova de não existência, e também é sabido que as rochas já lá estavam muito antes do aparecimento de seres humanos, se bem que as fendas possam muito bem ter sido abertas por mão humana e o carneiro possa ter sido esculpido... O que a Natureza já de si oferecia pode ter sido objecto de manipulação, de afeiçoamento, no sentido de adaptação a um fim determinado, que seria, neste caso, como em muitos outros, a marcação do dia em que o Sol, no seu incessante movimento aparente de vaivém, inverte o sentido desse movimento. A partir desses dias, o tempo diário de Sol começa a aumentar ou a diminuir.

Disse o cientista e escritor Carl Sagan que há "(...) a necessidade de equilibrar o método científico com o maravilhoso puro e não adulterado (the need to balance the scientific method with pure, unadulterated wonder)". Nos casos aqui apresentados não se vai tão longe, pois não se entra no maravilhoso: a descoberta desses ancestrais marcadores solares – que nada têm do tal maravilhoso puro – é apenas resultado de mentes curiosas, que, como perdigueiros, levantam a caça. Daí para diante... é com o caçador. Daqui para diante... seria um estudo interessante para arqueólogos interessados nesta área de investigação, como aconteceu em Xancra, perto de Cuba, no Alentejo, onde investigações de âmbito arqueoastronómico realizadas por António Carlos Valera e Helmut Becker permitiram concluir que as entradas dos três recintos que estudaram possuem claramente orientação astronómica e cosmológica, como se pode ver na Fig. 12. À esquerda, Santa Vitória, em foto cedida por Miguel Lago, e planta do recinto interior segundo Dias, 1996 modificado; à direita, Outeiro Alto 2, em foto de Paulo Marques e planta segundo Valera e Filipe, 2010. As entradas encontram-se orientadas respectivamente pelo nascer do Sol no solstício de Verão (planta da esquerda) e pelo nascer do Sol no solstício de Inverno (planta da direita).

(Elementos retirados da revista "Apontamentos de Arqueologia e Património", no 7, pág. 23 – Jan. 2011, do Núcleo de Investigação Arqueológica.)



                                                                     Fig.12



Depois de assistirmos a auroras e a poentes, esta ronda pela zona da Boa Nova de Leça da Palmeira não ficaria completa se não voltássemos ao rochedo junto do monumento a António Nobre, porque há lá outras curiosidades. 



Fig. 13                                                                                                          Fig. 14


Da marginal, vemos a Musa Sentida, Musa Sentada, Musa do Silêncio ou ainda Musa Lendo, como é várias vezes referida por Gilberto Russa, um prolífico poeta, prosador e pintor matosinhense muito atento e profundo observador do que se passa em Leça da Palmeira, no seu livro intitulado "Princípio de um Vazio", apresentado em Maio de 2012 no Porto e em Leça da Palmeira.
Nota-se bem o perfil de uma mulher de farta cabeleira, sentada, a ler, que delimita a Porta do Sol do lado Norte (Fig. 13).

Subindo até essa rocha pela rampa, contornando-a, virando à direita e voltando as costas à refinaria da Petrogal, facilmente nos aperceberemos de um rosto de ancião esculpido na rocha, que pode muito bem ser o Monge Maldito, também referido no citado livro de Gilberto Russa, e que delimita a Porta do Sol do lado Sul (Fig. 14).

Então, "equilibrando o método científico com o maravilhoso puro e não adulterado"... estas duas figuras poderão ser vistas como guardiães da Porta do Sol de Leça da Palmeira, e lanço uma pergunta ao leitor: será este rosto de ancião a auto-escultura do astrónomo/escultor que abriu a Porta do Sol de Leça da Palmeira?


Albano Chaves   -
                                                                                      ***

 Mais um magnífico estudo de Albano Chaves -,  a quem agradecemos ter-nos dado a honra de tão valioso contributo científico e da sua participação nas celebrações do Solstício do Verão. - Jorge Trabulo Marques



 
Albano Chaves, já nosso amigo e conhecido, através da descoberta do alinhamento do Solstício do Inverno, a que deu o nome de Portas do Sol, no maciço dos Tambores, em Chãs, (1) solstício do inverno nos templos do sol – albano chaves .

 É natural de Leça de Palmeira – De seu nome completo Albano Manuel de Madureira e Sousa Chaves, nascido em 1942, filho de Albano Soares Chaves e de sua mulher Maria Emília de Madureira e Sousa Donas-Boto Chaves, professores do ensino primário oficial. 

  Frequentou o extinto Colégio Externato Académico de Leixões, o Liceu de D. Manuel II e o Colégio João de Deus, no Porto. De 1961 a 1964, cursou a Faculdade de Ciências da Universidade do Porto e a Technische Hochschule (Instituto Superior Técnico) de Munique, RFA, tendo feito cadeiras do curso de Engenharia Mecânica, que não acabou.


Em 1964, matriculou-se no Sprachen- und Dolmetscher-Institut (Instituto de Línguas e Intérpretes), em Munique, onde em 1969 obteve o diploma de tradutor de documentação técnica e científica de Inglês e Alemão.


Regressado a Portugal em 1969, iniciou de imediato a actividade de tradutor independente (Alemão, Inglês e Francês); paralelamente, foi professor de Alemão, Alemão Comercial e Inglês Comercial no ITFI (Instituto Técnico de Formação Intensiva) e no Instituto Riley de Línguas, no Porto.

Sem abandonar a actividade de tradutor, trabalhou num banco e em duas empresas industriais, sempre em sectores ligados a relações com o estrangeiro. Em 1980 tornou-se profissional independente.

Durante alguns anos, orientou o estágio de finalistas do curso de Alemão / Tradução da Faculdade de Letras da Universidade do Porto.

Trabalha regularmente para vários países europeus e em 1998, de uma grande empresa suíça de traduções com escritórios em Lausana e em Zurique, recebeu o prémio "Tradutor do Ano" pela sua «prestação em matéria de qualidade, de quantidade, de satisfação dos clientes, de respeito pelos prazos e de flexibilidade».

Inscrito na Associação Portuguesa de Tradutores. Inscrito como tradutor no Consulado da República Federal da Alemanha no Porto desde 1970.


  Com vários estudos publicados nas áreas da genealogia, antologia e romances, ficção histórica, monografias. Distinto conferencista e um investigador apaixonado pela astro-arqueologia

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