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segunda-feira, 25 de dezembro de 2023

Chãs-Foz Côa – A saudade do Natal na igreja de São Caetano, com mais de 3 séculos, em granito, onde fui batizado, demolida em 1972 para dar lugar a um edifício incaracterístico, em cimento armado e ao estilo de armazém, com uma torre ainda mais inclinada, que a de Piza mas sem a beleza desta.

                                                                 Jorge Trabulo Marques  



A antiga igreja matriz das Chãs, que antes de 1758, se chamava capela de S. Caetano, era o único edifício histórico desta freguesia, que, no “Tombo da Comenda  de Santa Maria de Longrouva, de 1773, aparece com a denominação  de Chanes e, posteriormente, com a designação  de  Chans de Longroiva  

O Padre António Pereira  Amante,  por sinal um sacerdote muito dedicado às suas paróquias, com residência em Longroiva, embora possuído de boa fé, errou na sua avaliação, pensando que a população da aldeia iria crescer, mas passou-se precisamente o contrário: a emigração, sobretudo para França, redundou num descrente despovoamento e enorme desertificação.

Quis fazer o mesmo a outra histórica igreja, à de Muxagata, de que também era pároco,  mas ali contou com maior resistência do povo e não levou por diante  a moda do cimento armado, que então se substituía às antigas construções de xisto e de granito.

Nessa altura, encontrava-me em S. Tomé – Se ali estivesse teria também sido solidário com a posição tomada por as pessoas que discordaram dessa nova obra, entre as quais, o meu tio Antoninho Anjo,  com a sua residência ao lado da antiga igreja, que, por tão desconsolado,  vim mais tarde a saber, por sua esposa, a minha Tia Ana, que jurou não entrar na nova igreja enquanto fosse vivo, e era um fervoroso católico.

Em 1972, a estrutura granítica da velha igreja apresentava uma solidez razoável aquando do seu derrube. Pena que não se ter evitado a sua destruição e levantado um novo templo noutro local – Refere Joaquim Manuel Trabulo, no seu livro  CHÃS DE FOZ CÔA – A SUA HISTÓRIA E A SUA GENTE



O campanário, de dois sinos,  era tipo único no concelho de Foz Côa. A talha  barroca do altar-mor era muito semelhante à igreja de Numão. O sacrário, considerado uma relíquia,  foi reparado a aproveitado na nova igreja mas já sem a beleza e o enquadramento que tinha dantes.

Atrofiou-se o adro e derrubou-se o mítico negrilho , tão necessários  nas tardes  calmosas  da Primavera e do Verão, à sombra do qual  a gente das Chãs se acolhia e convivia. A povoação teria ficado, por certo,  bem mais enriquecida  e mais airosa

A talha barroca  do altar-mor era muito semelhante à igreja de Numão.

O sacrário, considerado uma relíquia, foi reparado e aproveitado na nova igreja mas sem a beleza e o enquadramento que tinha dantes

Com que ansiedade, na minha adolescência, esperávamos a noite e o dia de Natal. De véspera, faziam-se as filhoses de centeio, a que chamavam bolas de azeite. E depois da ceia, lá se ia a saltitar e dançar à roda da fogueira no adro da antiga igreja

A festa de Natal era calorosamente vivida com outro encanto: havia três escolas de crianças e hoje não há nenhuma: sem eletricidade, saneamento e água canalizada, que tinha de se ir buscar de cântaro à fonte ou em aguadeiras nos machos ou burros mas a aldeia estava com todas as casas habitadas.

Hoje há mais casas de que habitantes, pelo que não tarda a ficar uma quinta, como sucede noutras aldeias do Portugal do interior profundo: o que ainda vai valendo é o regresso dos emigrantes no mês de Agosto para matarem saudades do seu torrão natal e se associarem à celebração da Festa de Nª Srª de Assunção, já que a do Padroeiro, São Caetano,  que era celebrado uma semana antes, caiu praticamente no esquecimento.

Naqueles dias, a vida do campo, era realmente mais difícil de que hoje, visto não existir qualquer trator senão os chamados carros de bois: eram os animais das cortes que puxavam os arados e se cava a terra.  A lavoura dependia totalmente da mão direta humana

No entanto, quer as festas da Páscoa, como as de Agosto, a do Padroeiro e de Nª Srª de Assunção, como as festas do Natal, eram calorosamente vividas – Não direi que não continuem a ser assinaladas com grande entusiasmo e participaçao, mas, só o facto de, naquela altura,  haver mais população, dava outro colorido e outra alegria ao povo.


O que vale ainda são os emigrantes, já que,  quem vive do campo, senão fosse o vinho generoso era quase 
trabalhar para aquecer. Mas quem é que quer deixar morrer a tradição?!... Com muito esforço e a carolice de uns poucos, os chamados mordomos, lá se vai fazendo todos os anos.   Porém, o momento alto o dia, foi a procissão solene, que percorreu as ruas da aldeia, desde a igreja à capela e desta de volta à igreja -E, naturalmente, o sermão atentamente escutado, proferido pelo Cónego Manuel, filho desta freguesia.  Obviamente que a festa continua na noite de 15 e ainda nos dias 16 e 17 - E, pelos vistos, promete, já que motivos de diversão não faltam no programa -  Aqui ficam, por agora, alguns vídeos e imagens.

Neste sagrado dia da Natividade, aproveito para transcrever um dos belos poemas, inseridos no Espírito Natalício, de Manuel Daniel com os votos amigos amigos de um Feliz Natal, junto dos que lhe são queridos e desejando que  a deficiência visual, que tão profundamente o afecta, recupere e não se agrave 

Noite de Natal
O Céu não estava estrelado
mas uma estrela luzia,
Num barraco desprezado
estavam José e Maria.
Num monte distanciado
A branca neve caía.
Mas no negrume fechado
De repente se fez dia.

Uma criança chorava
quando a luz se refectia
num espaço onde ecoava
um cântico de alegria,
cântico que reboava
numa perfeita harmonia
enquanto José Louvava
e aos céus agradecia.

Era um mistério sagrado
o que ali acontecia.
Um pastor admirado,
cantava, dançava e ria.
O próprio  tempo, abismado
em dois tempos se repartia.
E sobre palhas deitado
O Deus menino dormia.
.

Manuel Daniel – do Livro  Chão de Areia

CANTIGAS DO PERÍODO NATALÍCIO DA MINHA ALDEIA

Só na antiga memória de quem a cantou e viveu

Inda agora aqui cheguei,
E mal pus o pé na escada,
Logo o meu coração disse,
Aqui mora gente honrada 
Coro
Lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá!
Lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá! 
Esta casa é caiada,
Forrada de papelão,
Os senhores que moram nela,
Têm belo coração!

Levanta-se daí senhora,
Desse banco de cortiça,
Ai, venha dar-nos as janeiras,
Ai, ou morcelas ou chouriças!

Já se acabaram as festas
Agora vêm os Reis,
Vede lã por vossas casas,
Se lá tendes que nos “deis!”

Coro
Nasceu  a alegria,
Não pode haver mais,
Que nasceu Jesus!
Bendito sejas!

Versos extraídos do livro  - CHÃS DE FOZ CÔA – A SUA HISTÓRIA E A SUA GENTE – De Joaquim Trabulo

 

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