Jorge Trabulo Marques - Jornalista e investigador
Romance “Para Sempre”, de Vergílio Ferreira, lido pelo autor, que nasceu há 106 anos – Excerto de um capítulo que me leu em sua casa em 28-01-89, no dia em que completava, 73 anos, que ironizava: "faço 37 aos 70" -
Depois de o ter entrevistado, pedi-lhe para que me lesse algumas passagens, tendo , escolhido um excerto do antepenúltimo capítulo, referente ao nascimento da filha da Sandra e do narrador, que é a Alexandra, apelidada de Xana, que foi morrendo no abismo da droga.
Leitura acompanhada de oferta de livro e autógrafo - Além de outras entrevistas que já me havia concedido, para o meu
pequeno gravador de reportagem da Rádio Comercial-RDP
Vergílio Ferreira não era apenas o grande escritor, mas o existencialista, o pensador. Deu-me o prazer de me receber várias vezes em sua casa – Algumas das quais no próprio dia do seu aniversário. Data que dificilmente me poderá passar despercebida
Romance Para Sempre – Excerto do capítulo XXXIII, do seu romance livro “Para Sempre” em 28-01-89
…Trata-se de uma das mais notáveis obras da autoria de Vergílio Ferreira, que publicou ao longo de mais de 50 anos de vida literária — A sua vasta obra, geralmente dividida em ficção (romance, conto), ensaio e diário, costuma ser agrupada em dois períodos literários: o Neo-Realismo e o Existencialismo. Considera-se que Mudança é a obra que marca a transição entre os dois períodos.
“Para Sempre é um livro de mágoas; um livro pessimista, negro, macabro; um livro sobre a vida, sobre a necessidade de a pensar mesmo que no fim dos tempos, no momento em que nada mais o pensamento poderá mudar.
Mas é também um livro sobre a morte como redenção; como o remédio único e fatal para o sofrimento; para a culpa e a podridão; para a vida. A morte como o fim desse sofrimento prolongado a que Paulo chama vida.
(---) Vergílio Ferreira é
talvez o escritor contemporâneo que melhor utilizava a língua portuguesa de
forma a transmitir todo o sentimento ao leitor (---) Um livro duro de ler, mas
sem dúvida um grande livro, de um dos melhores escritores do século XX em
Portugal – Excerto do Blogue dos Meus Livros
Vergílio Ferreira, o académico e precursor do existencialismo na literatura português, teria completado, nesta sexta-feira, dia 28, 106 anos, se fosse vivo – Quis o destino que a sua partida para a eternidade, aos 80 anos, no dia 1 de Março de 1896- Deu-me o prazer de me conceder várias entrevistas, recebendo-me em sua casa e até me citar num dos seus diários – Algumas das vezes no próprio dia do seu aniversário
Vergílio Ferreira, natural de Melo, do concelho de Gouveia, onde há uma biblioteca com o seu nome, bem como uma escola em Lisboa, a Escola Secundária de Vergílio Ferreira (Quinta dos Inglesinhos, rua do Seminário Professor liceal na Beira Alta, nasceu a meio da tarde do dia 28 de janeiro de 1916, tendo como fundo a Serra da Estrela, ambiente e paisagem que iria moldar a sua personalidade e influenciar a sua vasta obra - Faleceu na sua casa de campo, em Fontanelas, no dia 1 de Março de 1996, pouco depois da hora do lanche. Quando a sua esposa (Regina Kasprzykowski) entrou na sala para ir buscar a chávena e bule, encontrou-o estendido de costas sobre o tapete no chão e com rosto voltado para a janela. Ele, que tanto interrogara a morte, pelos vistos, respondeu ao seu apelo da forma mais pacífica e tranquila.
“Há uma voz obscura no homem, mas essa voz é a
sua. Há um apelo ao máximo, mas vem do máximo que ele é. Há o limite
impossível, mas é do excesso que é o próprio homem.” Vergílio Ferreira (Espaço do
Invisível 1)
Ao autor " Espaço do Invisível - Entre o espaço visível o mistério do além “ |
“Depois da morte não há nada... Já estive à beira da morte duas vezes (…)o facto de me eu preocupar com a morte, não significa que a morte me assuste!... Uma coisa é o medo da morte, outra coisa é a intriga que a morte nos causa!.- Autor do “Espaço do Invisível”, “Cântico Final", “Manhã Submersa” “Para Sempre” – Entre mais de meia centenas de obras: ficção, ensaio e diários – Recebeu-me várias vezes em sua casa.
O facto de me eu preocupar com a morte, não significa que a morte me assuste!... As pessoas tendem a confundir essas duas coisas: uma coisa é o medo da morte, outra coisa é a intriga que a norte nos causa!.. - - Ouça a entrevista no vídeo, mais à frente
Recordando um dos maiores vultos da literatura portuguesa, que me deu a honra e o prazer de me receber várias vezes em sua casa e de me conceder várias entrevistas - A que a hoje aqui recordo, teve como tema principal a questão da morte
JTM - Acredita que há vida para além da morte?
V.F. - "Eu já pensei, evidentemente, que a morte era a passagem para o além, para uma vida que se seguiria a esta…Aliás, quando pensei, tinha toda a aparelhagem para isso, nesse mesmo além… Haveria um céu, haveria um inferno, haveria um purgatório, etc... Hoje estou convencido que a morte é um fim de tudo... Se não estivesse convencido,naturalmente, que a vida, no seu absurdo, não se me imporia tanto...
Evidentemente que estas certezas não se baseiam em nada... Baseiam-se num equilíbrio interior que diz que é assim ou não é assim... Aliás, é em função desse equilibro interior que nós aderimos ou não aderimos a muita coisa na vida: desde a mulher que se ama, a política que se segue, o clube de futebol a que se adere, etc.
Portanto, eu não tenho razão absolutamente nenhuma para afirmar que depois desta vida não há mais nada.... A única razão é esse tal equilíbrio interior... Portanto, não vou discutir com ninguém que acredito no além...Não vou discutir com ele para lhe demonstrar que ele não tem razão e quem tem razão sou eu.. Essas coisas vivem-se no íntimo de nós sem que, no fim de contas para aí metamos entrego ou estopa, como se consuma dizer...
“Homem de diversas facetas, a de filósofo e a de escritor, a de ensaísta, a de romancista e a de professor. Contudo, foi na escrita que mais se destacou, sendo dos intelectuais contemporâneos mais representativos. Toda a sua obra está impregnada de uma profunda preocupação ensaística. Vergílio Ferreira
Literariamente, começou por ser neo-realista (anos 40), com "Vagão Jota" (1946), "Mudança" (1949), etc. Mas, a partir da publicação de "Manhã Submersa" (1954) e, sobretudo, de "Aparição" (1959), Vergílio Ferreira adere a preocupações de natureza metafísica e existencialista. A sua prosa, que entronca na tradição queirosiana, é uma das mais inovadoras dos ficcionistas deste século.