Foi a este prestigiado advogado de ideias que o general António de
Spínola, nomeado presidente da República, recorreu para chefiar o primeiro
governo provisório saído da revolução de
25 de Abril de 1974 - Tomou
posse a 16 de Maio de 1974, sucedendo nas funções governativas à Junta de
Salvação Nacional formada no dia da revolução, e teve como ministros
personalidades como Mário Soares e Francisco Sá Carneiro, com quem tinha uma
relação social de grande empatia e cordialidade
Adelino Palma Carlos – Primeiro-ministro do Iº Governo Provisório (de 16 de Maio a 18 de Julho de 1974, nomeado pelo General Spínola – Nesta parte da entrevista que me concedeu em sua casa, editada no vídeo deste post, Palma Carlos, fala da Revolução de 25 de Abril, que o fez chorar de alegria até às lágrimas e do Governo que formou com a participação de Álvaro Cunhal (um ministro consensual E também do seu ideal republicano. da sua oposição ao Salazarismo e dos revolucionários que defendeu, como advogado.
Professor, advogado e político. Destacou-se como primeiro-ministro do I Governo Provisório -(Faro, 3 de Março de 1905 — Lisboa, 25 de Outubro de 1992 (Faro,
Dou-me a honra e o prazer de me receber em sua casa e de ali me conceder uma interessante entrevista acerca de alguns dos mais importantes passos da sua vida profissional e politica, nomeadamente, como opositor ao regime ditatorial de Salazar, defensor dos presos políticos, da alegria que sentiu - até às lágrimas - quando tomou conhecimento do golpe vitorioso da Revolução do 25 de Abril, assim como de vários episódios relacionados com a sua participação como 1º Ministro do 1º Governo Provisório Adelino da Palma Carlos – Wikipédia,
Adelino Palma Carlos – Primeiro-ministro do Iº Governo Provisório (de 16 de Maio a 18 de Julho de 1974, nomeado pelo General Spínola – Nesta parte da entrevista que me concedeu em sua casa, editada no vídeo deste post, Palma Carlos, fala da Revolução de 25 de Abril, que o fez chorar de alegria até às lágrimas e do Governo que formou com a participação de Álvaro Cunhal (um ministro consensual E também do seu ideal republicano. da sua oposição ao Salazarismo e dos revolucionários que defendeu, como advogado.
Professor, advogado e político. Destacou-se como primeiro-ministro do I Governo Provisório -(Faro, 3 de Março de 1905 — Lisboa, 25 de Outubro de 1992 (Faro,
Dou-me a honra e o prazer de me receber em sua casa e de ali me conceder uma interessante entrevista acerca de alguns dos mais importantes passos da sua vida profissional e politica, nomeadamente, como opositor ao regime ditatorial de Salazar, defensor dos presos políticos, da alegria que sentiu - até às lágrimas - quando tomou conhecimento do golpe vitorioso da Revolução do 25 de Abril, assim como de vários episódios relacionados com a sua participação como 1º Ministro do 1º Governo Provisório Adelino da Palma Carlos – Wikipédia,
Considerado como "personalidade forte, inteligente, culto e de extraordinária capacidade de trabalho, foi primeiro-ministro do I Governo Provisório (de 16 de Maio a 18 de Julho de 1974). Como 11.º bastonário da Ordem dos Advogados Portugueses teve um importante papel na consolidação institucional e na internacionalização daquela corporação. Foi grão-mestre doGrande Oriente Lusitano, a principal organização da maçonaria portuguesa. E fundador do escritório de advogados actualmente designado de G&F Palma Carlos
COMO ELE VIU A REVOLUÇÃO DE ABRIL
«…fiquei contente!...Chorei, quando soube que era a Revolução!.. Que era para acabar com a ditadura!... Chorei! Chorei comi uma criança!... Não tenho vergonha nenhuma de dizer: chorei!!..
JTM - Entretanto, chegou o 25 de Abril: o Sr. Prof. foi nomeado Primeiro-Ministro!
APC – Olhe… Essa história é engraçadíssima!... Eu não fazia ideia nenhuma de que ia haver a Revolução… Aliás, eu era Presidente das companhias reunidas de gás e eletricidade: tinha sido convidado pelo General Gaspar dos Santos e era Presidente das Companhias… Quando eu vim para as Companhias, encontrei lá instalado, um coronel na Reserva, que era o coordenador de segurança das Companhias de Gás e Eletricidade, da Sacor, da Companhia das Águas, da Companhia Nacional de Eletricidade e da Petroquímica… Bom, esse homem, estava perfeitamente a par de tudo o que se desenrolava!... E até tinha uma coisa engraçada!... Sabendo que eu era uma pessoa, contra a situação, ele recebia todos os panfletos (não sei da onde) que saíam contra a situação e dava-mos para eu ler!... Ele é que fazia propaganda, junto de mim, contra a situação!... E estava sempre a par!... Quando foi da reunião dos capitães, em Évora, na Intentona de Março, ele disse-me: “Isto está mau!!..Agora o Movimento de Oficiais, em Évora!... Não se o que isto vai dar!...
Bem , continuámos, pacatamente!... No dia 25 de Abril de Madrugada!... Estava a dormir!...Aparece-me uma das empregadas, com o telefone, dizendo-me: “Sr. Douro! É o engenheiro da Companhia do Gás, que tem muita necessidade de falara consigo!..” -Então traga lá o telefone!
Era o homem a dizer: “Sr. Presidente! Rebentou a Revolução?!...”
- Rebentou a Revolução?!...
- “Rebentou a Revolução!!”
- E então o coronel, o que é que faz?!...
- “O Coronel, não está cá!... Não se sabe do coronel!...
Telefonei para o coronel, que eu tinha aí o número de telefone dele (que morreu, coitado, dois ou três meses, depois da revolução) … estava a dormir, como um anjo!...
- Então, Sr. Coronel!... Está uma revolução na rua!
- “Esta uma revolução na rua?!...”
- Está!... E então o Sr. não sabe de nada?!...
Está a ver!... Fui eu que informei o Coordenador de Segurança, que tinha rebentado a revolução!...
Bom, eu fui para a Companhia, juntámo-nos lá os Membros da Comissão Executiva, que cá estávamos, que éramos cinco só, e passamos o dia, ali… Veio uma Ordem do Ministério do Interior, por intermédio da Direção Geral dos Serviços Elétricos (a que nós estávamos subordinados) para que se interrompesse a corrente elétrica, lá para cima, par o Parque Eduardo VII… E o Engº da Companhia disse: se nós interrompemos a corrente elétrica, nós ganhamos nada com isso!... Eles têm geradores e continuam a emitir da mesma maneira!
- E então eu disse: há alguma ordem escrita?!..
- Não há nenhuma ordem escrita!
- E então diga-lhe que mandem a ordem por escrito!... Nós estávamos subordinados ao Governo!... Era uma companhia concessionária!... Mandaram a ordem escrita… E então interrompeu!... Até que, às tantas, à tarde, eu mandei ligar!... Porque, já não havia Governo!... Não havia nada!..
Bom, estivemos ali todo o dia, sem saber o que se passava, com a televisão aberta!... Com a telefonia aberta!... Almoçámos, mesmo lá, na cantina da Companhia!. E olhe, nos dias seguintes, fiquei contente!...Chorei, quando soube que era a Revolução!.. Que era para acabar com a ditadura!... Chorei! Chorei comi uma criança!... Não tenho vergonha nenhuma de dizer: chorei!!..
JTM – Depois, foi entretanto nomeado Primeiro-ministro!...
APC – E depois… aí é que a coisa, começa a ter um certo pitoresco, começaram a ouvir dizer-me que eu ia ser nomeado Primeiro-Ministro!... Não sejam tontos!... Porque é que eu havia de ser nomeado Primeiro-ministro?... Que ideia é essa?!...
- Mas eu acho que você é que vai ser o Primeiro-ministro!.. Você é que vai ser o Primeiro-ministro!..
Até, que, um domingo (tenho este telefone, que não está na lista) e ligara-me por este telefone (era confidencialíssimo) as era da Presidência da República, era ali de Belém); era o Capitão António Ramos, a dizer-me: - Ó Sr. Dr.! O Sr. General Spínola, tem muita necessidade de falar consigo!” - Então está bem
Eu conhecia o Spínola, já há bastante tempo: “então quando é que ele quer que eu vá falar com ele?”
- “Amanhã às quatro horas! – No dia seguinte, às quatro horas eu fui lá, e ele disparou:
- Tenho um Governo pronto! Falta-me o Primeiro-ministro!... Você tem de ser o Primeiro-ministro!
- Não me fale nisso!.. Não tenho a minha vida organizada para isso!... Vivo da minha profissão!.. Não pode ser!... Deixe-me pensar!...
- Então pense até amanhã!...
Eu resolvi pensar dois dias mas não pude!... No dia seguinte, telefonava-me ele outra vez!..
JTM – E teve que aceitar!
APC – E tive que aceitar!.. Pronto!...
JTM – Foi um tempo agitado, na altura?
APC – Olhe!... Foi o pior tempo da minha vida!.. Foi o pior tempo da minha vida!... Extremamente agitado!... O Governo era um Governo não homogéneo!... Porque tinham querido fazer um Governo de coligação - Quem fazia o Governo não era o Primeiro-Ministro: o que estava na Lei Constitucional nesse tempo: era o Presidente da República e o Primeiro-Ministro, só fazia trabalhos num Governo, que lhe tinham oferecido!...
E eu dizia: façam um Governo de Gestão, que é o que é preciso, nesta altura.
-“Ah mas é melhor fazer um Governo de coligação….”
- “Então façam um Governo de coligação” – Eu tive lá, desde o Álvaro Cunhal, até esse homem monárquico, que aí anda, o Ribeiro Teles!.. A Pintassilgo!... Estava no meu Governo!..
JTM - Havia então alguma confusão…
APC- Devo-lhe dizer que, nas reuniões do Conselho de Ministros, havia às vezes divergências… Pois cada um tinha a sua opinião sobre os problemas que se colocavam… Havia muitos problemas a resolver... Havia divergências!... Eu tentava soluciona-las mas elas … mas é uma justiça que eu nunca deixo de fazer ao Cunha, é esta: é que, quando a coisa estava numa situação quase de impasse, o Cunhal encontrava sempre uma solução de equilíbrio, que todos acabavam por aceitar!... É um político extraordinário!...
JTM – Acha que o Partido Comunista Português devia ser chamado também a contribuir, também no Governo?
APC – Quando eu era Primeiro-ministro, veio cá, o Mitterrand e o d’Ferry, vieram cá: fora-me visitar. Estava um bocado preocupados por haver comunistas no Governo; era o Álvaro Cunhal e mais o Adelino Gonçalves, Ministro do Trabalho, que era um sindicalista bancário, o Porto, que tinham metido lá… O Mitterrand, às tantas, disse-me: - “mas você não se preocupa pelo facto de ter comunistas no Governo?”
- Bom, não sei porque é que você me faz essa pergunta, quando, você, agora, constitui em França, a União de Esquerda, de Socialistas e de comunistas!... Se você lá, anda de braço dado com eles, não sei porque estranha que eu tenha aqui dois ministros comunista, num Governo!... Onde estão numa minoria flagrante!...
JTM – Olhe, na altura quais foram os problemas mais difíceis que teve de enfrentar nesse período?
APC - Tive logo de entrada uma greve dos correios… Passados, dois ou três dias, não havia correios, não havia telefones, não havia coisa nenhuma… E eu disse: isto não pode ser!... Não podemos estar sem comunicações… Chamei o Chefe do Estado Maior General das Forças Armadas, que era o Costa Gomes, e disse-lhe: ó Sr. General! Nós temos de ocupar militarmente os correios para acabar com isso!...
- Oh diabo! Isso é uma coisa complicadíssima!"
NOTAS BIOGRÁFICAS -Adelino Hermitério da Palma Carlos nasce a 3 de Março de 1905, em Faro, vindo a falecer a 25 de Outubro de 1992, em Lisboa. Licenciado em Direito pela Universidade de Lisboa, com a nota final de 18 valores, foi delegado da Faculdade de Direito à Federação Académica. Conclui o doutoramento em Ciências Histórico-Jurídicas, também na Universidade de Lisboa, em 1934. Advogado reconhecido, defendeu inúmeras figuras oposicionistas à ditadura, como Norton de Matos, Bento de Jesus Caraça e Vasco da Gama Fernandes. Foi também professor na Escola Rodrigues Sampaio, no Instituto de Criminologia de Lisboa e, como Catedrático, na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, da qual viria a ser director. Foi jubilado em 1975. Em 1949, foi mandatário da candidatura do general Norton de Matos à Presidência da República. Em 1951 exerceu funções como Bastonário da Ordem dos Advogados portugueses. A 16 de Maio de 1974 é nomeado primeiro-ministro do I Governo Provisório, pedindo a demissão a 18 de Julho desse ano. Em 1975 funda o Partido Social-Democrata Português. Foi mandatário e membro da comissão de honra da candidatura do general Ramalho Eanes à Presidência da República (1979). Pertenceu ao conselho consultivo do Partido Renovador Democrático. Em 1986 recebe a insígnia de Advogado Honorário.Adelino da Palma Carlos | 1905-1992 - Memórias da .
O Assalto à RTP pelo Capitão Teófilo Bento – Nas 72 LongasHoras, apoiado por um pequeno grupo de
soldados, apenas vocacionados para os serviços internos do quartel – Houve
muita ansiedade, alguma confusão e disparos, com a entrada de uma patrulha da
PSP por uma das portas laterais
"O
Bento foi um "puro", um homem bom, com grande humor e forte sentido
solidário. Um genuíno Capitão de Abril, de todos os
tempos, sempre fiel aos valores que nos lançaram na epopeia coletiva, de que o
Teófilo, os seu camaradas da EPAM e todos nós nos continuamos a orgulhar", - É nestes termo que foi recordado pela Associação
25 de Abril, no dia do seu falecimento em 29 de julho de 2020.
Promovido, mais tarde, a Coronel do Exército, Teófilo Bento, então Capitão, foi o herói da tomada das instalações da RTP, às 03.05 da manhã do dia 25 de Abril - Foram 72 longas horas, de ansiedade e até de alguma confusão e disparos, apoiado por um pequeno grupo das chamadas tropas logísticas, mais conhecidas por “padeiros”, vocacionadas para serviços internos no quartel de que a intervir em operações, portanto, sem a preparação da que têm tropas operacionais. Na breve entrevista que nos concedeu, confessa-nos o que ele considerou ter sido um autêntico “jogo de poker”, tendo a sua vida chegado a estar a linha de fogo por um dos seus próprios soldados, quando uma patrulha da policia de Segurança Pública, logrou entrar por uma das portas laterais da instalações – Horas desgastantes e de risco, que, no final, o levariam a ser conduzido para o hospital
UM TRANSMONTANO DE ORIGEM HUMILDE E UMA VIDA SUBIDA A PULSO
Natural de Picote, concelho de Miranda do Douro. – Eis alguns passos da sua vida, contados numa entrevista concedida ao Jornal Nordeste, em 2011
"Até aos seis anos vivi em Picote, depois transferi-me para Sendim, ou seja, os meus pais é que se transferiram. O meu pai era Guarda Fiscal. Podia começar já por dizer que pertencia a uma família em que havia dinheiro, porque a maior parte das famílias, como se sabe, nessa altura, não conhecia a cor do dinheiro.
Eram tempos difíceis nessa altura. O dinheiro era escasso, o que potenciava muitas famílias necessitadas…
Eram famílias necessitadas na generalidade. Em Sendim havia duas ou três famílias ricas, havia depois estas ditas remediadas, em que o chefe de família poderia ser Guarda Fiscal, tinha uma remuneração e, já tinham possibilidades de adquirir coisas com dinheiro que a maior parte das pessoas não tinha. Sem querer, isso faz-me lembrar que, li uma história da evolução económica da Europa, em que dei por mim a fazer uma comparação muito estreita entre a economia, a sociedade da idade média e a sociedade que eu conheci quando miúdo, em Picote e em Sendim. Eram os mesmos instrumentos de trabalho, os mesmos sistemas de troca de bens; trocavam-se sardinhas por ovos, por exemplo. Recordo-me de a minha mãe me contar que levava dois sacos de trigo a Carviçais, primeiro ao Pocinho e depois a Carviçais; isto é, onde chegava o comboio, para trazer sal. Isto, só para dizer, como era a situação nessa altura agora, se quiserem, comecem a fazer comparações com os dias de hoje.
Que outras recordações é que guarda da sua meninice, da sua juventude?
Além das dificuldades referidas que eram muito notórias, principalmente antes de as barragens aparecerem e começaram a dar algum trabalho, o que potenciou que algum dinheiro começasse a circular, fez com que as pessoas despertassem e descobrissem a existência de outros mundos e, também contribuiu para que nos apercebêssemos do mundo fechado em que vivíamos, o que levou, precisamente, a que milhares de transmontanos emigrassem para a França, clandestinamente, isto é, sem autorização. Quando eram apanhados, eram devolvidos, muitas vezes, em condições extremamente difíceis, porque até as pessoas da minha idade se lembram. Chamavam-se passadores as pessoas que auxiliavam esses indivíduos a dar “o salto”, assim se chamava o transferir-se para França, tentando, portanto, ganhar algum dinheiro.
Muitos transmontanos deram “o salto", realmente…
Sim, é verdade! Há pouco disse-me que esta entrevista tinha um nome que era “À procura da Liberdade”; deixe-me falar sobre isso. É evidente que a liberdade, como a fome, como outras situações extremas, como a guerra por exemplo, só quem a viveu… ou melhor, no caso da liberdade, só quem não a teve é que sabe o que é não ter liberdade. Por mais metáforas, por mais palavreado, por mais frases que se utilizem, é difícil caracterizar uma situação extrema e a falta de liberdade é realmente uma situação extrema. Já dei algumas entrevistas em que dizia que, só com o passar do tempo, me fui apercebendo do que era a falta de liberdade; a privação de liberdade para ganhar o seu pão, a sua vida, levou tanta gente a emigrar, clandestinamente, porque não lhes era permitido sair livremente. As pessoas não tinham liberdade para procurar melhores condições de vida.
Senti, por volta dos anos 60, ao acabar o curso na academia militar, onde era aspirante, uma necessidade premente de sair daqui, de conhecer outras culturas e resolvi fazer uma coisa que era habitual: viajar para o estrangeiro, normalmente França, Inglaterra… recorríamos a algumas associações que nos arranjavam trabalho. Trabalhava-se durante as férias o que nos dava o suficiente para viver, não diria que dava para pagar as despesas todas, mas auxiliava muito e era uma nova experiência. Eu fui para Inglaterra. Estamos no ano de 69, precisamente no ano que apareceu a minissaia, tínhamos tido notícia dela, é evidente que em Lisboa não havia, em Portugal não havia mas, tínhamos tido notícia dela. Foi nessa altura que fui para a Inglaterra onde trabalhei num hotel. Inicialmente pensei que era para trabalhar como porteiro para ganhar umas boas gorjetas, mas afinal era trabalho não especializado, internamente, lá no hotel. Foi uma experiência interessantíssima mas, o que mais me impressionou e, era esta a ideia que queria vincular, foi que eu tive a sensação de que tocava na liberdade. A liberdade via-se em tantas coisas… na minissaia, via-se na forma das pessoas trajarem, Londres já nessa altura era um cidade muito cosmopolita, havia indianos, havia tudo. Enfim, faziam o que queriam, cada um vestia-se como queria vivenciando os seus usos e costumes, havia “speakerscorners” onde se reunia muita gente e se falava contra tudo e contra todos. Pegavam no caixote, subiam para cima dele, expunham as suas ideias livremente, de tal maneira que, se tinham audiência estava bem, se não tinham, não havia problema; às vezes, via-se um indivíduo a falar para três ou quatro pessoas, outras vezes a falar para um conjunto de pessoas. Realmente, todas essas coisas e, mesmo a actuação da polícia, ensinavam liberdade.
Assisti, sem querer, a uma cena que me impressionou. Uma altura em que eu passava peloPiccadilly'sCircus, um sítio em que se juntavam os hippies que, também nessa altura, estavam na moda. Eu passava muitas vezes por ali e via esse pequeno largo cheio deles; tinha umas escadas internas e o pessoal sentava-se por ali, de qualquer maneira e, houve um dia em que passei e percebi que devia ter havido uma decisão da polícia para evacuar. Já tinham evacuado, praticamente, a praça toda, estavam apenas dois casais, que estavam instalados, rodeados por dois polícias, notoriamente, a tentar convencê-los a saírem de lá e eles, provavelmente, inventando explicações e mais explicações, estou a dizer inventando, porque eu estive, sem exagero, meia hora a assistir à cena e dizia para mim próprio: isto, em Portugal, seria impossível. Verifiquei, sei lá, qualquer má resposta que ofendeu a polícia, ou que a polícia achou mais incorrecta. Pegaram neles pelas costas e meteram-nos em duas carrinhas e foram embora, primeiro impressionou-me a eficácia da polícia. Isto só para dizer que tudo era diferente e tudo me dizia que era quase como se tocasse a liberdade, o que não existia em Portugal.
Realmente, essa sua experiência deve tê-lo marcado profundamente. Temos, no entanto, que voltar um pouco atrás no tempo para lhe perguntar de que forma o marcou o facto de ter nascido nesta região?
Penso que o ter participado no “25 de Abril” teve um pouco que ver, ou talvez muito, com o ter nascido nesta região. Como disse, sou filho de um guarda-fiscal, sou um filho já tardio, tinha dois irmãos muito mais velhos que, por acaso, estiveram em África mas, tinham regressado antes dos acontecimentos que se verificaram, os acontecimentos relacionados com a guerra ultramarina. O regresso, de pelo menos um deles, deveu-se ao falecimento do meu pai. A minha mãe viu-se com um miúdo de oito anos para criar. A única coisa que sabia fazer era a lida da casa. Como o meu pai era guarda-fiscal e, numa aldeia, isso significava mais que ser remediado, quase significava ser duma classe alta, porque havia dinheiro, a minha mãe fez das tripas coração, virou-se como se costuma dizer. Ela ainda está viva, tem 98 anos, está num lar em Miranda, mas foi sempre uma pessoa que me marcou muito porque fez realmente um esforço fabuloso para conseguir educar-me com aquilo que ficou. Quase diria que teve de inventar formas de fazer dinheiro para me educar. Tive o azar de ser de uma aldeia, de não ter feito o exame de admissão na devida altura, o que me obrigou a ir para um colégio em vez do liceu que ficava mais caro e, assim, estudei em Miranda e diga-se de passagem que ao fim do primeiro ano já estava a dizer que não queria estudar mais, porque via os miúdos que estavam a trabalhar na barragem e não tinham que ir preparar as lições para casa. Aí valeu o meu irmão, regressado de África por causa da morte do meu pai que disse: se tivesses tirado más notas, talvez, assim como tiraste boas notas tens de continuar a estudar. Também lhe devo muito a ele, como é evidente, por causa disso. Fui criado de maneira a perceber as dificuldades que existiam em casa. Fiz o 2.º e 5.º anos, vim fazer exames a Bragança e, depois do 5.º, tive de mudar para o Porto.
Eu não podia vir para o liceu, como disse e tudo isso ficava bastante caro. Fiz os estudos equivalentes ao terceiro ciclo e aí voltei a Bragança. Tive sempre uma ligação com Bragança e quando chegou a altura de ir para a universidade escolhi a academia militar fundamentalmente por questões económicas. Percebia, perfeitamente, que não podia ir para a universidade. Até gostaria de ter ido para engenharia, mas percebia perfeitamente que não tinha condições financeiras para tal. Ouvi dizer que na academia militar pagavam um salariozinho, enfim, davam subsídio, davam alimentação e não pagava pensão. Foi isso que condicionou a minha ida para a vida militar, não foi efectivamente a minha vocação especial. Foi mais uma condição económica que, diga-se de passagem, aconteceu a muita gente que depois veio a participar no “25 de Abril”, vieram a ser capitães de Abril. Temos que nos lembrar que nessa altura já tinha começado a guerra. A frequência na academia era alimentada, fundamentalmente, por classes ricas. Enfim toda a tradição da nobreza, mas quando começou a guerra deixaram isso para os pobres e os pobres preferencialmente, do interior, por isso é que nessa altura a frequência na academia militar era de Trás-os-Montes e das Beiras.as que me está a impressionar - Excerto de
As minhas sinceras e calorosas felicitações ao distinto filho do meu concelho e também ainda meu parente, descendente de um dos irmãos do meu avô materno. António Trabulo, autor de várias obras, foi o vencedor, em 2019, da primeira edição do Prémio Literário da Lusofonia Professor Doutor Adriano Moreira, destacando-se entre 45 trabalhos rececionados.
Em 2014, foi distinguido com o Prémio Literário Aldónio Gomes, com a coletânea de contos “Ofício de contar, distinção promovida pela Universidade de Aveiro (UA), anunciada durante o II Congresso Internacional “Pelos mares da língua portuguesa” no Departamento de Línguas e Culturas (DLC) da academia.
António Trabulo, que iniciou a sua atividade literária em 2003, tem-se dedicado essencialmente à ficção com base histórica. O escritor tem 11 livros publicados, entre os quais a obra “Retornados”, que lhe valeu em 2009 o Prémio de Ficção “Fialho de Almeida” atribuído pela Sociedade Portuguesa de Escritores e Artistas Médicos.
Da medicina à literatura
Nascido em Foz Coa, em 1943, António Trabulo viveu a juventude em Sá da Bandeira (atual Lubango, Angola). Com uma bolsa atribuída pelo então Governo-geral de Angola, regressou a Portugal para estudar Medicina na Universidade de Coimbra. Especializou-se em neurocirurgia e foi Chefe de Serviço de Neurocirurgia do Hospital dos Capuchos.
Durante a carreira médica, apresentou meia centena de trabalhos em reuniões científicas, publicou mais de uma dúzia de artigos de investigação clínica, metade deles em revistas estrangeiras
prestigiadas e colaborou ativamente com a Sociedade Portuguesa de Neurocirurgia, tendo integrado os seus órgãos diretivos durante vários anos. António Trabulo foi ainda membro da Comissão Diretiva do Colégio da Especialidade de Neurocirurgia da Ordem dos Médicos durante dois mandatos e presidiu ao Colégio da Especialidade. Foi ainda Presidente da Assembleia Distrital de Setúbal da Ordem dos Médicos. Atualmente faz parte da Direção da ordem dos Médicos
Jorge Trabulo Marques - Jornalista e investigador - Video neste post
A descoberta do Brasil, não foi obra do acaso: quando partiu do Tejo, com uma armada para se dirigir à Índia, já tinha conhecimento prévio da existência de terras a sul das descobertas por Colombo: "Ele não ia aventura a descobrir terras: era uma viagem definitiva. Com tudo planejado; a época de saída absolutamente planejada – Defende, Max Justo Guedes,(Rio de Janeiro, 6 de agosto de 1927 — Rio de Janeiro, 8 de novembro de 2011), um dos mais notáveis historiadores da cartografia luso-brasileira, autor de mais de meia centena de estudos e ensaios carto-bibliográficos dispersos em inúmeras publicações, numa breve entrevista que, em Outubro de 1989, honrosamente me concedeu para a Rádio Comercial, por ocasião da reedição da obra “O Descobrimento do Brasil” Um estudo baseado, não apenas nas pesquisas que efetuou, como se navegava na época, mas também na sua experiência marítimo
O depoimento de José Hermano Saraiva (1919-2012), foi por mim registado, por altura das comemorações do descobrimentos portugueses - Defende, igualmente, que não foi o navegador espanhol Vicente Pison, mas os portugueses, que descobriram o Brasil
Professor liceal e universitário, advogado, ministro, embaixador e um brilhante investigador nas áreas do direito e da história. Membro de várias instituições académicas, autor de uma obra muito extensa e internacionalmente reconhecida. Depois de 1974, dedicou-se à apresentação da história de Portugal, quer através de uma abundante produção de obra escrita, quer em sucessivos ciclos de programas televisivos, o que lhe valeu uma popularidade apenas tornada possível pela inabitual combinação de grande erudição e raro poder de comunicação. https://pt.wikipedia.org/wiki/Jos%C3%A9_Hermano_Saraiva
Comandante Max Justo Guedes – 1927- 2011 - Considerado o “Ícone da História Naval Brasileira e da História da Cartografia” - Ouça a entrevista
“Na Marinha, dirigiu o setor de Patrimônio Histórico e Cultural, reorganizou e equipou o Serviço de Documentação Geral da Marinha; promoveu a implantação de museus (Museu do Forte da Barra de Santo António – BA; criou os Navios-Museu; Museu da Caravela – Campinas; Espaço Cultural da Marinha – RJ); propôs e coordenou incontáveis colóquios internacionais, preparou edições críticas e publicou coletâneas que são fundamentais para o conhecimento da história brasileira, como por exemplo, os volumes da História Naval Brasileira. – Excerto Nosso Contra-Almirante Max Justo Guedes (1927-2011 .
Por Jorge Trabulo Marques - Jornalista (fotos recolhidas da Net) - Ouça as suas palavras (intervaladas com breves sons musicais)
Cidadão Honorário de Idanha-a-Nova, em 1987 - "Eu ontem, tive conhecimento, através dos jornais da manhã…realmente, não me passava pela cabeça que a Câmara de Idanha-a-Nova tivesse tido essa iniciativa!... Como digo, foi para mim uma surpresa muito agradável”
Dois anos antes da morte do Fernando Namora, que padecia de doença prolongada, a Câmara Municipal de Idanha a Nova, atribuiu por unanimidade ao escritor que residiu neste concelho e ali escreveu parte da sua vasta obra literária, o título de cidadão honorário – No dia seguinte, à noticia, avançada pelos jornais, que, segundo nos confessara, surpreenderia, agradavelmente, o próprio autor de Retalhos da Vida de Um Médico (de cerca de três dezenas obras publicados, algumas das quais elevadas ao cinema, das mais divulgadas e traduzidas nos anos 70 e 80), fomos recebidos em sua casa, para que nos falasse dessa sua experiência, como médico, como homem e como escritor naquela região.
Nessa altura, eu era jornalista na redação da Rádio Comercial RDP, colaborava na equipa da 24ª hora, e uma das minhas tarefas diárias, consistia, em todos os programas, apresentar declarações ou entrevistas com personalidades do nosso meio, nos vários domínios de atividade – Tendo tomado conhecimento, da referida distinção, telefonei a Fernando Namora, se não se importava de me dar a sua opinião, pedido a que acedeu amavelmente, tanto mais que já nos conhecíamos de anteriores entrevistas, e, até de algum convívio, quer na sala de sua casa, como em acontecimentos literários – Sim, pois cheguei a ser quase seu vizinho, da Avenida Infante Santo, quando ali tive um romance amoroso.
Fernando Gonçalves Namora nasceu em Condeixa-a-Nova em 15 de Abril de 1919 e faleceu em Lisboa, 31 de Janeiro de 1989 - .Dois anos depois destas suas declarações
Pertenceu à geração de 40, grupo que reuniu personalidades marcantes como Carlos de Oliveira, Mário Dionísio, Joaquim Namorado ou João José Cochofel.
O seu volume de estreia foi Relevos (1937), livro de poesia, “porventura sob a influência de Afonso Duarte e do grupo da Presença. Mas já publicara em conjunto com Carlos de Oliveira e Artur Varela, um pequeno livro de contos Cabeças de Barro. E, em 1938”, o seu primeiro romance, As Sete Partidas do Mundo. A partir daí foi realmente o catapultar de uma obra vasta e rica, que estende por 27 títulos, cujo temática, partindo do espaço português, que o levaria como um viajante em demanda do mais largo conhecimento do mundo e das mais diversas gentes que o habitam.
É justamente considerado, como um dos nomes cimeiros da nossa literatura, e mesmo até Universal!.. Os dois últimos livros foram Sentados na Relva, cadernos de um escritor – 1986 ; Jornal sem Data, cadernos de um escritor – 1988.
Sem dúvida, um homem simples mas de uma grandeza de alma fantástica, de uma grande generosidade, mas a quem o destino haveria de reservar um fim de vida de enorme sofrimento – Ele que tinha ainda tanto para nos oferecer! –Morreu aos 69 anos.
Um dia abriu-me uma das gavetas da sua secretária, e disse-me: Jorge! Está a ver o que aqui tenho ainda por publicar!... Mas já não vou ter tempo de o fazer!” – A que eu contrapus: Senhor Dr: não diga isso!... Como sabe, a medicina, está muito avançada e vai curar-se com certeza” – Sua resposta: Jorge!... Eu sou médico! Sei o que tenho! – E, de facto, pelo que me apercebi, tinha plena consciência da sua enfermidade, que, segundo ainda me recordo, o teria levado a implante esfíncter artificial.
Uns anos antes, recordo também o dia em que o encontrei num evento cultural, que decorria num dos salões do Hotel Sheraton (onde, afinal, iniciaria o dito romance )
creio que por altura do Natal: apareceu lá vestido com uma espécie de capote, parecendo mais um campesino de que um homem da cidade. Mas não se demorou por ali muito tempo, confessando-me: “já me vou embora! Estas coisas, cansam-me! E, de facto, tal como entrou, discretamente, assim saiu.
Eis como é recordado pelo jornalista e escritor Baptista Bastos: “A notícia da próxima saída de um livro de Namora causava grande alvoroço. Ocasiões houve em que, antes de sair a público, a primeira edição de alguns dos seus livros (cinco mil, sete mil e quinhentos exemplares) já estavam esgotadas. E há títulos de Namora que constituem importantes documentos literários da vida portuguesa. O seu impressionante êxito: edições de milhares e milhares de exemplares, traduções constantes, ensaios, estudos exegeses, teses sobre a sua obra, amiudadas vezes requisitado pela Imprensa a fim de depor acerca de este e de aquele assunto; entrevistas, comentários - enfim, essa glória que o envolveu não deixou de causar invejas e ressentimentos. A vida literária portuguesa não é diferente da vida literária em outros países [leia-se, a título de exemplo, "Écrits Intimes", de Roger Vailland, outro grande esquecido]. E Namora, cuja generosidade e camaradagem eram lendárias, sentia, profundamente, a circunstância. No entanto, jamais deixou de ser amável e cortês, até efusivo, com muitos daqueles que o atropelavam nas tertúlias dos cafés."
"Uma boa parte da minha obra, está ligada à Beira-Baixa!"
Eis como, Fernando Namora, nos descreveu a sua experiência como médico, como homem e como escritor naquela região, referindo que foi uma surpresa agradável ao tomar conhecimento desta distinção
Suponho que devo confessar mais uma vez – já o tenho dito – frequentemente, sempre que se justifica, bem entendido,
A minha ida para a Beira Baixa – e mais concretamente a minha estada, durante dois anos e tal e depois ao longo dos anos que se seguiram, o facto de, com uma certa frequência, eu ir passar férias, enfim, ou ir passar uns tantos dias, a Monsanto, do Concelho de Idanha-a-Nova, deu-me um conhecimento muito íntimo, muito autêntico dessa região!... E teria bastado para isso o facto de eu ter sido lá médico: fui médico, não apenas em Monsanto, como também tinha sido anteriormente numa aldeia dos arredores de Castelo Branco e também médico de umas minas efémeras no concelho de Pena Macor –De qualquer modo, sempre na mesma região.
De modo que, essa experiência, enfim, como cidadão, como homem, e a experiência como médico; ou seja, o quanto essa experiência humana repercutiu depois na minha obra literária?... Pois é um facto!... E é um facto, enfim, confessado da minha parte e sabido de umas tantas pessoas.
Não há dúvida nenhuma, que uma boa parte da minha obra, está ligada à Beira-Baixa! Está ligada a essa região!... Se eu não tivesse tido essa experiência humana, não a teria escrito!... Teria escrito outros livros, bem entendido, mas não aqueles.
Ora, o facto de ter havido da parte da Câmara de Idanha-a-Nova, o reconhecimento de que, efetivamente, assim aconteceu…. Isto é, que tanto a minha vida, como a minha obra literária foram bastante influenciadas pelo meu conhecimento, tão direto da vivência da Beira-Baixa, pois é um facto agradável e que eu não posso deixar de assinalar para mim próprio, tanto mais que constituiu uma surpresa!... Eu ontem, tive conhecimento, através dos jornais da manhã…realmente, não me passava pela cabeça que a Câmara de Idanha-a-Nova tivesse tido essa iniciativa!... Como digo, foi para mim uma surpresa muito agradável.
Na informação dada, há, no entanto, aqui um elemento que não será inteiramente exato: associa-se, essa tal minha vivência, essa minha experiência literária da Beira Baixa, com o livro “Retalhos da Vida de Um Médico”… Ora, efetivamente, eu escrevi, parte da primeira série da Vida de Um Médico, em Monsanto, ou seja, na Beira Baixa, ou seja no concelho de Idanha-a-Nova… mas o resto do livro, foi escrito, já no Alentejo, e, posteriormente, aqui em Lisboa.
O que eu escrevi, inteiramente em Monsanto, foi, por exemplo, A Noite e Madrugada, parcialmente, Minas de São Francisco…. E digo parcialmente, porque eu suponho ter começado esse livro, ainda nos arredores de Castelo Branco!... Depois, em Monsanto, é que eu escrevi, quase tudo, o restante do livro, na sua maioria. E ainda outras obras… Mesmo, quando Monsanto, não está, declaradamente, presente, Monsanto ou a região, a verdade é que me aconteceu, ou tem-me acontecido ao longo destas últimas décadas, eu, de um modo geral, até terminar os livros em Monsanto!... Ou pelo menos, acelerá-los! … Começo os livros, em Lisboa, e, quando os livros, já adquirem o seu ritmo próprio, e quase, que, enfim, se me impõem, então eu vou para Monsanto e então é lá que eles são elaborados!... Numa outra atmosfera íntima de serenidade, de conciliação, entre mim e o meio-ambiente!... Quer dizer, que ao longo destes anos , tem sido muito estimulante do ponto de vista literário, as minhas várias estadas em Monsanto!... Isto é apenas uma informação no que diz respeito à relacionação de alguns dos títulos do conjunto da minha obra essa região de que acabámos de falar.
Quanto aos “Retalhos da Vida de Um Médico”, poderemos dizer que talvez seja, ainda hoje, o meu livro mais popular, porque transmite uma autenticidade de vida de uma maneira muito mais direta de que outros livros!... Mas não sei se será o mais significativo!....
Quando me fazem a pergunta… e, aliás, ela é-me feita repetidamente: qual o livro que eu suponho ou mais importante ou mais bem acabado!... Ou mais equilibrado!...Em suma, mais significativo no conjunto do meu trabalho?!... Eu costumo dizer que a minha resposta varia de dia para dia!... E não é porque haja leviandade nesse tipo de resposta!... É porque, também os livros correspondem a uma atmosfera íntima!... E a nossa atmosfera íntima … - isso acontece com todas as pessoas, bem entendido – nem sempre é a mesma!... Mas é curioso que eu é raro citar os “Retalhos da Vida de um Médico”, quando essa pergunta me é feita!... Talvez porque há uma tendência valorizar mais os romances de que qualquer outro género literário, concretamente da ficção!... Se é esse um dos motivos, não sei!... Agora, que, há da parte dos leitores uma relativa fidelidade aos “Retalhos da Vida de Um Médico”, há!, isso sim, suponho que é um facto!...
Efetivamente, a Câmara da minha terra natal, ou seja, Condeixa, adquiriu, recentemente, a Casa donde eu nasci e pretende transformá-la numa Casa Museu!... Claro que foi para mim, também muito agradável, este gesto da Câmara da minha terra natal!.. E não posso deixar também de sublinhar essa iniciativa e esse interesse manifestado pelos meus conterrâneos!...
OUTROS DADOS BIOGRÁFICOS DE FERNANDO NAMORA
“Ainda estudante e com outros companheiros de geração funda a revista Altitude e envolve-se activamente no projecto do Novo Cancioneiro (1941), colecção poética de 10 volumes que se inicia com o seu livro-poema Terra, assinalando o advento do neo-realismo, tendo esta iniciativa colectiva, nascida nas tertúlias de Coimbra, de João José Cochofel, demarcado esse ponto de viragem na literatura portuguesa. Na mesma linha estética.
A sua obra, em termos de correntes literárias, evoluiu no sentido dum amadurecimento estético do "neo-realismo", o que o levou a enveredar por caminho mais pessoal. Não desprezando a análise social, a sua prosa ficou marcada, sobretudo, pelos aspectos do burlesco, observações naturalistas e algum existencialismo
Colaborou com várias publicações periódicas, como Sol Nascente, O Diabo, Seara Nova, Mundo Literário, Presença, Altitude, Revista de Portugal, Vértice, entre outras.
É Autor de várias colectâneas de poesia e de uma pouco conhecida obra como artista plástico, é sobretudo como ficcionista que o nome de Fernando Namora marca a literatura portuguesa contemporânea, tendo granjeado um sucesso a nível nacional e internacional e que, durante os anos 70 e 80, foi das mais divulgadas e traduzidas.
Por uma questão de sistematização da sua obra, poderemos identificar as seguintes fases distintas de criação literária:
O ciclo de juventude, principalmente enquanto estudante em Coimbra, coincidente com o livro-poema Terra e o romance Fogo na Noite Escura;
O ciclo rural, entre 1943 e 1950, representado pelas novelas Casa da Malta (escrita em 8 dias) e Minas de San Francisco, ou pelos romances A Noite e a Madrugada, O Trigo e o Joio sem esquecer os Retalhos da Vida de um Médico, cuja edição espanhola (1ª tradução) apresenta o prefácio de (Gregório Marañón);
O ciclo urbano, coincidente com a sua vinda para Lisboa, marcado pela solidão e vivências do quotidiano, e que se terá reflectido no romance O Homem Disfarçado, em Cidade Solitária ou no Domingo à Tarde;
O ciclo cosmopolita, ou seja, dos cadernos de um escritor, balizado no final dos anos 60 e década de 70, explicado pelas muitas viagens que fez, nomeadamente à Escandinávia, e pela sua participação nos encontros de Genebra;
O ciclo final, entre a ficção contemporânea, onde se insere o romance O Rio Triste ou Resposta a Matilde, intitulado pelo próprio divertimento, e as reflexões íntimas de Jornal sem Data (1988)
Em 1981, foi proposto para o Prémio Nobel da Literatura, pela Academia das Ciências de Lisboa e pelo PEN Clube.
O seu espólio constituído por correspondência recebida, rascunhos de cartas enviadas, manuscritos de textos da sua vasta produção e colaboração dispersa por publicações periódicas, textos de conferências, entre outros, encontra-se incorporado no Arquivo de Cultura Portuguesa Contemporânea (ACPC) da Biblioteca Nacional de Portugal,
na casa que foi residência dos seus pais e sua, em Condeixa, foi inaugurado, em 30 de Junho de 1990, um museu onde se encontram objectos e documentos pessoais, bem como quadros da sua autoria e livros
Entre os muitos títulos que publicou em prosa contam-se:
1943 - Fogo na Noite Escura;
1945 - Casa da Malta;
1946 - As Minas de S. Francisco;
1949 e 1963 - Retalhos da Vida de um Médico;
1950 - A Noite e a Madrugada;
1952 - biografias romanceadas de Deuses e Demónios da Medicina;
1954 - O Trigo e o Joio;
1957 - O Homem Disfarçado;
1959 - Cidade Solitária;
1961- Domingo à Tarde (Prémio José Lins do Rego);
1972 - Os Clandestinos;
1980 - Resposta a Matilde;
1982 - O Rio Triste (Prémio Fernando Chinaglia, Prémio Fialho de Almeida e Prémio D. Dinis);
Em Poesia publicou:
1940 - Mar de Sargaços;
1959 - As Frias Madrugadas (Toda a sua produção poética seminal foi reunida numa antologia)
1969 - Marketing;
1984 - Nome para uma Casa;
Fontes:
Fernando Namora. In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2011. [Consult. 2011-07-21]. Disponível na www: http://www.infopedia.pt/$fernando-namora>